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De rachadinha a inquéritos no STF, relembre acusações e investigações contra Bolsonaro e filhos

Acusações de rachadinha se estendem a Flavio e Carlos Bolsonaro, dois dos filhos do presidente. Outras investigações envolvendo o presidente e seus filhos dizem respeito à disseminação de fake news e realização de atos antidemocráticos, influência sobre a Polícia Federal e, mais recentemente, sobre os supostos pedidos de propina no Ministério da Saúde na compra das vacinas indianas Covaxin

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BBC Geral
postado em 05/07/2021 23:39 / atualizado em 05/07/2021 23:39
Bolsonaro com os filhos Flavio, Eduardo e Carlos; todos eles, além de Jair Renan, são investigados
Roberto Jayme/TSE/Ascom

Gravações de áudio de uma ex-cunhada de Jair Bolsonaro (sem partido) obtidas pelo portal UOL voltam a trazer à tona acusações de uma suposta rachadinha (quando assessores parlamentares são forçados a devolver ilegalmente parte do seu salário) envolvendo a família do presidente — nesse caso, pela primeira vez, ele é diretamente mencionado no episódio.

Reportagem publicada nesta segunda-feira (5/7) aponta que Andrea Siqueira Valle teria afirmado que Bolsonaro, que era deputado federal na época dos fatos, teria demitido o irmão dela, André, por ele ter se recusado a devolver a maior parte do seu salário de assessor.

"Foi um tempão assim (sem que André devolvesse o percentual do salário) até que o Jair pegou e falou: 'chega. Pode tirar ele (do cargo) porque ele nunca devolve o dinheiro certo'", diz Andrea na gravação. Ela e André são irmãos da ex-mulher de Bolsonaro, Ana Cristina Siqueira Valle.

Consultado pelo UOL, o advogado do presidente, Frederick Wassef, afirmou se tratar de uma "gravação clandestina" que tenta criar uma "narrativa de fatos inverídicos, inexistentes". "Jamais existiu qualquer esquema de rachadinha no gabinete do deputado Jair Bolsonaro ou de qualquer de seus filhos".

Acusações de rachadinha se estendem a Flavio e Carlos Bolsonaro, dois dos filhos do presidente. Outras investigações envolvendo o presidente e seus filhos dizem respeito à disseminação de fake news e realização de atos antidemocráticos, influência sobre a Polícia Federal e, mais recentemente, sobre os supostos pedidos de propina no Ministério da Saúde na compra das vacinas indianas Covaxin.

A seguir, um resumo de cada caso:

Inquérito da Covaxin

Na semana passada, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, determinou a abertura de inquérito para apurar se Jair Bolsonaro cometeu crime de prevaricação no episódio das vacinas indianas Covaxin.

O caso foi levantado na CPI da Covid, pelo depoimento conjunto do deputado Luís Cláudio Miranda (DEM-DF) e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda.

Eles disseram ter avisado, em um encontro em 20 de março, Bolsonaro sobre indícios de ilegalidade na compra de 20 milhões de doses da Covaxin ao valor de R$ 1,6 bilhão e o presidente disse, segundo relato da dupla, que acionaria a Polícia Federal. No entanto, isso não ocorreu.

Bolsonaro teria dito, de acordo com os Miranda, ainda, que "isso (o esquema) é coisa do Ricardo Barros", deputado pelo Progressistas do Paraná que é líder do governo na Câmara.

Luis Ricardo e Luis Claudio Miranda na CPI
Ag Senado
Luis Ricardo e Luis Claudio Miranda na CPI; irmãos denunciaram supostas irregularidades na contratação da vacina indiana Covaxin

Mais tarde, a apoiadores, Bolsonaro disse que não teria como saber tudo o que acontece dentro dos ministérios. Ele também defende que nada foi feito de errado porque nenhum pagamento chegou a ser feito de fato, já que o escândalo eclodiu antes — até o momento, as vacinas não foram entregues, e o contrato foisuspenso pelo Ministério da Saúde.

Segundo o Código Penal brasileiro, o crime de prevaricação ocorre quando um funcionário público "retarda ou deixa de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal".

No caso da Covaxin, a hipótese defendida pelos senadores oposicionistas da CPI é que o presidente prevaricou ao não comunicar uma eventual irregularidade no contrato para outras autoridades investigarem. O Código Penal prevê em casos assim três meses a um ano de prisão e multa.

Os três senadores, além de solicitarem a apresentação de denúncia, sugerem a necessidade de investigar outros possíveis crimes, como corrupção passiva, organização criminosa, evasão de divisas e lavagem de dinheiro, relacionados a um possível superfaturamento no contrato para aquisição da Covaxin.

'Superpedido' de impeachment

Também na semana passada, foi protocolado o documento conhecido como "superpedido" de impeachment de Bolsonaro, que aglutina as acusações de mais de cem denúncias contra o presidente, acusando-o de 23 crimes de responsabilidade.

As acusações listam desde as suspeitas em torno da Covaxin até violação de direitos individuais ao "levar parcela da população a não aderir a cuidados sanitários elementares" durante a pandemia de covid-19, além de suposta tentativa de impedir o funcionamento do Congresso, incitar militares à desobediência e agir contra os poderes estaduais (leia todas as acusações aqui).

Por enquanto, porém, a avaliação de observadores é de que ainda faltam tanto provas cabais quanto apoio político para o pedido de fato avançar na Câmara.

O "megapedido" de impeachment contra Bolsonaro, chamado também de "superimpeachment", traz a assinatura de 46 pessoas. Na maioria, elas representam entidades diversas, como partidos políticos, sindicatos, associações e coletivos.

Em sua live mais recente, em 1° de julho, ele ironizou o "superpedido"."Quem não tem o que fazer fica tentando atrapalhar a vida de quem produz", declarou.

Rachadinhas, Flavio Bolsonaro e Fabricio Queiroz

O caso que implica o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) gira em torno de Fabrício Queiroz, seu ex-assessor quando era deputado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e amigo de Jair Bolsonaro desde a década de 1980.

Queiroz passou a ser investigado em 2018 depois que o antigo Coaf (atual Unidade de Inteligência Financeira) identificou diversas transações suspeitas ligadas ao ex-assessor.

Segundo o órgão, Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, valor que seria incompatível com seu patrimônio e ocupação, e recebeu transferências em sua conta de sete servidores que passaram pelo gabinete de Flávio.

Essas movimentações atípicas, que vieram à tona num braço da Operação Lava Jato, levaram a uma investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro.

Flávio Bolsonaro
Reuters
Flávio Bolsonaro é acusado de enriquecer desviando recursos do seu antigo gabinete de deputado estadual

Há a suspeita de que as transferências se devessem a um esquema de "rachadinha", no qual parte dos salários dos assessores seria devolvida a Flávio ou destinada a outro fins.

Queiroz foi detido pela polícia em junho de 2020, em Atibaia, em um imóvel pertencente ao advogado Frederick Wassef — que até então negava saber do paradeiro do ex-assessor. Queiroz ficou em prisão domiciliar até março deste ano, por decisão do Superior Tribunal de Justiça.

Em outro desdobramento das rachadinhas, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta segunda-feira (5/7) para arquivar — por solicitação da Procuradoria-Geral da República — os pedidos de investigação sobre os cheques de R$ 89 mil depositados por Queiroz na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Quanto a Flávio Bolsonaro, o senador foi denunciado pelo Ministério Público fluminense pelo suposto esquema de rachadinhas em novembro de 2020, junto a Fabricio Queiroz e outros 15 investigados. A denúncia é de organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita.

O caso, porém, completou um ano emperrado no Supremo Tribunal Federal (STF), onde aguarda uma decisão sobre a instância judicial em que o parlamentar deve ser julgado.

Para os investigadores, Flávio Bolsonaro é chefe de uma organização criminosa que atuou em seu gabinete na Assembleia Legislativa entre 2007 e 2018, e parte dos recursos movimentados no esquema foi lavada em uma franquia de chocolate da qual ele é sócio.

Promotores investigam ainda se a "rachadinha" teria sido usada para financiar uma milícia que era comandada pelo ex-policial Adriano Nóbrega, morto em fevereiro do ano passado.

Danielle Mendonça, ex-mulher de Nóbrega, trabalhou como assessora de Flávio. Em conversas de WhatsApp acessadas pelos investigadores, ela disse que o ex-marido ficava com parte do salário que ela recebia do gabinete.

Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz negam que tenham desviado recursos do gabinete da Alerj por meio de funcionários fantasmas. A versão de Queiroz é que recolhia parte dos salários para conseguir contratar mais pessoas para atuar pelo mandato de Flávio no Estado do Rio de Janeiro. Ele nunca apresentou provas disso.

O senador afirma que não tinha conhecimento do que seu ex-assessor fazia e nega ter sido beneficiado pelo esquema. Ele também se diz perseguido politicamente pelo Ministério Público.

Bolsonaro discursa em ato em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília.
EVARISTO SA/AFP e Getty Images
Bolsonaro em um dos atos que pediam intervenção militar, em abril de 2020; caso foi arquivado no STF, mas outro semelhante foi aberto

Carlos, Eduardo e Jair Renan Bolsonaro

Os outros três filhos homens de Bolsonaro também são alvo de investigações.

Sobre o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) recaem acusações semelhantes às de Flavio. Em março de 2021, uma reportagem do UOL com base em quebras de sigilo revelou que quatro funcionários de seu gabinete sacaram a maior parte de seus salários — em um total de R$ 570 mil — em dinheiro vivo, o que é um indício de rachadinha. O caso é investigado pelo Ministério Público.

Jair Renan começou a ser investigado em março deste ano pela Polícia Federal sob suspeitas de tráfico de influência: ele é acusado de ajudar empresas privadas a conseguirem espaço em agendas ministeriais em troca de vantagens pessoais. O advogado Wassef também negou que isso tenha acontecido.

Quanto a Eduardo Bolsonaro, corre na Procuradoria-Geral da República uma investigação sobre a compra de dois imóveis no Rio de Janeiro, pagos em dinheiro vivo.

Disseminação de fake news e atos antidemocráticos

No último dia 3 de julho, o ministro do STF Alexandre de Moraes acolheu um pedido feito pela Procuradoria-Geral da República para arquivar um inquérito, aberto no ano passado, que investigava a organização de atos antidemocráticos, alguns dos quais tiveram a presença de Bolsonaro e pediam desde o fechamento do Congresso e a intervenção militar até a volta do AI-5 (ato institucional que endureceu a ditadura militar).

O inquérito citava nominalmente Jair, Carlos, Eduardo e Flavio Bolsonaro, além de assessores e apoiadores suspeitos de envolvimento com o chamado "gabinete do ódio", esquema de disseminação de notícias falsas que favoreceriam o governo. O Planalto sempre negou a existência dessa estrutura.

No entanto, na mesma decisão da semana passada, Moraes determinou a abertura de um novo inquérito, sobre uma possível "organização criminosa digital que atenta contra a democracia".

Sergio Moro
Adriano Machado/Reuters
Ao anunciar sua saída do governo, Moro afirmou que Bolsonaro tentou interferir na PF, o que também é alvo de inquérito no Supremo

Segundo o STF, está sendo analisado um material sobre uma "possível organização de atuação digital com núcleos de produção, publicação, financiamento e político, semelhante aos identificados no inquérito das fake news", que também é relatado por Moraes e que foi prorrogado em abril.

Na prática, acredita-se que a mesma estrutura do inquérito anterior continuará a ser investigada no que foi aberto pelo ministro.

Em sua decisão, o ministro aponta que o inquérito dos atos antidemocráticos havia identificado, por exemplo, que a análise do endereço de IP usado para acessar páginas que apoiavam o presidente Jair Bolsonaro identificou que este era de um assessor parlamentar de Flavio Bolsonaro.

Acusações de interferência na Polícia Federal

Quando o ex-ministro da Justiça Sergio Moro deixou o governo Bolsonaro, em abril de 2020, acusou o presidente de interferir na diretoria-geral da Polícia Federal e na superintendência fluminense do órgão, em uma suposta tentativa de proteger familiares e amigos investigados.

A acusação virou um inquérito no STF, autorizado pelo então ministro Celso de Mello. Mas o caso travou em torno de se Bolsonaro prestaria ou não depoimento presencial a respeito das acusações de Moro.

O STF negou, em setembro, pedido para que o depoimento fosse feito por escrito. O calendário do Supremo prevê que o caso seja retomado em setembro deste ano.


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