Em 2020, ano marcado pelo enfrentamento da pandemia de covid-19, o mercado ilegal de cigarros apresentou uma queda expressiva de 8 pontos percentuais – após 6 anos de crescimento contínuo do cigarro do crime. É o que revela a nova pesquisa do Ibope Inteligência/Ipec, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO). A pesquisa ainda registra a migração do consumidor de cigarros ilícitos para marcas legalizadas em decorrência do aumento do preço do produto ilegal. Os mesmos 8 pontos percentuais perdidos no ilícito aumentaram na fatia ocupada pela indústria legal, que respondia por 43% do mercado em 2019 e chegou a 51% em 2020.
Segundo Edson Vismona, presidente do ETCO, entre os fatores que contribuíram para essa alteração atípica no mercado de cigarros estão, especialmente, a alta do dólar e as medidas de contenção adotadas para o combate da pandemia do novo coronavírus, como o fechamento parcial das fronteiras do país e dos comércios formais e informais. “O abalo causado pela pandemia impactou a economia de modo geral. Este conjunto de fatores, somado às apreensões recordes nas fronteiras e estradas, inibiu a ilegalidade, levando a esse cenário interessante de redução, que, infelizmente, é pontual”, afirma Vismona.
Pery Shikida, economista e professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), concorda. Segundo ele, a oscilação nos dados apresentados pela pesquisa é pontual e decorrente do cenário de pandemia. “Qualquer outra interpretação seria equivocada”, diz.
Com a cotação da moeda norte-americana ultrapassando a marca de R$ 5, o custo médio do cigarro do crime passou de
R$ 3,44, em 2019, para R$ 4,44, em 2020, aproximando, assim, o produto do crime do cigarro legal — produzido nacionalmente, sob as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
MENOS DINHEIRO PARA
O CRIME E MAIS PARA
OS COFRES PÚBLICOS
A diminuição da participação do cigarro ilícito e consequente migração do consumidor para o mercado legal levou o país a aumentar a arrecadação tributária sobre o setor do tabaco em R$ 1,2 bilhão, de um ano para o outro, fechando o ano de 2020 com R$ 13,5 bilhões arrecadados. “Isso mostra que se mexermos nas variáveis econômicas, de modo a atacar de frente o produto ilegal, o mercado legal nacional tem toda a capacidade de assumir essa parcela, gerando emprego e arrecadação, sem resultar em aumento de consumo”, aponta Vismona.
A fala é confirmada por outro estudo, da Oxford Economics, que analisou os dados do mercado ilegal em 2019, quando 63,4 bilhões de cigarros ilícitos foram consumidos. De acordo com o estudo, caso os cigarros ilegais em circulação no país fossem substituídos por produtos legítimos, produzidos nacionalmente, o Brasil poderia gerar cerca de 173 mil novos empregos, além de uma contribuição adicional de R$ 6 bilhões ao PIB. A atividade extra também geraria R$ 1,3 bilhões em receitas fiscais adicionais (receitas fiscais associadas ao emprego e à atividade sustentada).
Mas o que se vê, a despeito da redução pontual, é que o índice da ilegalidade continua alto – em 2020, o crime organizado movimentou apenas com o cigarro ilegal cerca de R$ 8 bilhões e causou a sonegação de R$ 10,4 bilhões que, se arrecadados, poderiam construir, por exemplo, 94 mil unidades de casas populares, ou 18 mil Unidades Básicas de Saúde (UBS), ou ainda 58 mil leitos de UTIs para o tratamento de covid-19.
A participação do mercado ilegal no último ano respondeu por quase metade dos produtos consumidos no país: 49% de todos os cigarros. Destes, segundo o Ibope/Ipec, 38% foram contrabandeados, principalmente do Paraguai, e 11% produzidos em território brasileiro por fabricantes classificados como devedores contumazes — que estruturam seus negócios para não pagarem tributos e, com isso, conseguem praticar preços abaixo do mínimo definido por lei, de R$ 5. Com essa estratégia, nos últimos cinco anos, estas empresas irregulares cresceram no mercado nacional, saltando de 3% em 2015 para 11% no último ano.
Ao todo, o volume de cigarros ilegais em circulação no Brasil ultrapassa 53,9 bilhões. Mesmo com as restrições impostas pela pandemia, ainda é no comércio formal que o consumidor tem o seu principal canal de compra: 89% dos cigarros ilícitos são comprados em bares, mini mercados e padarias.
A pesquisa Ibope/Ipec é realizada desde 2014, tem abrangência nacional e, nesta edição, foi a campo entre outubro de 2020 e janeiro de 2021. Foram realizadas entrevistas presenciais com 9 mil fumantes com idades de 18 a 64 anos, residentes em municípios com 20 mil habitantes ou mais.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.