As Forças Armadas aparecem novamente no centro de outra crise no país, desta vez, por suposta ameaça à democracia. Os Três Poderes reagiram fortemente à eventual manobra para impedir a realização das eleições de 2022 se o governo não conseguir a aprovação do chamado “voto auditável”. A proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso, em tramitação na Câmara, também é defendida pelas FAs, numa demonstração de alinhamento com o Executivo. Comandantes militares respaldam os questionamentos do presidente Jair Bolsonaro sobre a segurança da urna eletrônica, embora nenhuma fraude tenha sido comprovada desde a implantação do sistema.
As manifestações de integrantes dos Poderes ocorreram após o jornal O Estado de S. Paulo noticiar que o ministro da Defesa, general Braga Netto, deu um “duro recado” ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), condicionando a realização do pleito do ano que vem à aprovação do voto impresso pelo Congresso. O ultimato teria ocorrido em 8 de julho. De acordo com a publicação, o militar estava acompanhado dos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica e pediu a um interlocutor político “para comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022, se não houvesse voto impresso e auditável”.
O vice-presidente Hamilton Mourão foi enfático ao repudiar a suposta ameaça. Questionado por jornalistas se haveria risco às eleições, o general refutou. “Isso é um absurdo. Nós não estamos no século vinte, nós estamos no século vinte e um, gente”, frisou. “Mesmo que não faça o voto impresso para esta eleição, é lógico que vai ter eleição, quem é que vai proibir eleição no Brasil? Não somos república de banana.”
Ao chegar, ontem pela manhã, ao Ministério da Defesa, Braga Netto foi indagado por jornalistas sobre a reportagem e ele a classificou como “mentira, invenção”. Momentos depois, ainda na pasta, para a solenidade de lançamento da Antena Multi Satelital, que teve a presença de Bolsonaro, o general leu o texto de uma nota oficial que viria a ser publicada na sequência.
No comunicado, defende a discussão sobre o voto impresso no Congresso, afirmando que “todo cidadão deseja a maior transparência e legitimidade” nas eleições. Ele também classifica a reportagem como “mais uma desinformação” e nega que utilize interlocutores para se comunicar com os presidentes dos Poderes.
A notícia, porém, teve repercussão, também, no meio político. Lira, em postagens nas redes sociais, não negou nem confirmou ter recebido a mensagem de Braga Netto, mas defendeu a realização das eleições. “A despeito do que sai ou não na imprensa, o fato é: o brasileiro quer vacina, quer trabalho e vai julgar seus representantes em outubro do ano que vem através do voto popular, secreto e soberano”, escreveu o presidente da Câmara nas redes sociais. O deputado acrescentou que as “últimas decisões do governo foram pelo reconhecimento da política e da articulação como único meio de fazer o país avançar”, numa referência à minirreforma ministerial anunciada por Bolsonaro para abrir mais espaço no governo ao Centrão, bloco partidário do qual Lira é um dos expoentes e que dá sustentação ao Palácio do Planalto.
O suposto “recado” de Braga Netto vai ao encontro de ameaça feita por Bolsonaro no início deste mês. No último dia 8, ele enfatizou, em conversas com apoiadores: “As eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”. O chefe do Executivo insiste que o pleito do ano que vem pode ser fraudado se não houver voto impresso. Ele tem reforçado essa pauta à medida que sua popularidade vai caindo e pesquisas apontam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como favorito para 2022.
Um dia antes da declaração de Bolsonaro, o comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Junior, curtiu uma postagem no Twitter de um seguidor que dizia: “Comandante, obrigado pelo canal de comunicação. Precisamos do voto impresso auditável. Vocês precisam impor o voto auditável”.
CPI da Covid
Recentemente, Braga Netto e comandantes das Forças Armadas fizeram uma ameaça velada à CPI da Covid, que investiga suspeitas de corrupção no Ministério da Saúde, loteado por militares. Em resposta ao presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), que disse que bons militares estavam envergonhados com o “lado podre” das Forças, enfatizaram: “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”.
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