Conhecido pela fama de durão e por “passar o trator” quando o assunto são pautas sensíveis e de interesse do centrão e do governo, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) nunca esteve tão fortalecido politicamente. Diante da crise política enfrentada pelo governo, o presidencialismo de coalizão tem dado resultados para o Centrão, que vê, na figura de Lira, um líder capaz de atender seus interesses e aprovar projetos que lhes garantam a reeleição.
Lira foi eleito presidente da Casa no início do ano com o discurso de que a Câmara é a casa de todos e de que não há tema proibido de ser discutido por lá. Ele prometia ouvir a todos os parlamentares, aliados ou não. Nos bastidores, a sensação de grande parte dos deputados é que Lira, de fato, tem recebido parlamentares de diversas ideologias e dado atenção às suas demandas, mesmo que nem sempre as atenda — o que é visto de forma natural por alguns e de forma autoritária por outros.
O fato é de que apesar de as coisas irem mal com o governo, o presidente da Câmara vai bem. Márcio Coimbra, cientista político e ex-diretor da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), acredita que Lira tem mantido o controle da Câmara, da pauta e das votações, apesar de o governo ter iniciado uma cruzada contra o Judiciário, o que tem fragilizado as relações institucionais na Esplanada. Segundo ele, os parlamentares agora não pensam mais na crise entre os poderes, pois estão concentrados em temas que podem lhes render votos no ano que vem.
Entretanto, para o governo, a situação não é favorável. “O Centrão consegue pautar o que é do seu interesse, mas falta ao governo uma melhor articulação. No Senado, a minirreforma trabalhista foi derrotada. Já na Câmara, o Lira conhece a casa, sabe os objetivos, sabe colocar para votar o que interessa a seu grupo. E ele representa um grupo, diferentemente do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco”, avalia Coimbra.
O analista não vê, portanto, um risco de rompimento a curto prazo entre Lira e Bolsonaro. “Acho que não tem rompimento, não. Quanto mais Bolsonaro estiver fraco, mais o Centrão estará forte. E a gente tem essa lógica, que mostra que se o Bolsonaro se enfraquece, o Centrão se fortalece. O Lira cresce conforme o Bolsonaro se enfraquece”, observa Coimbra.
Pauta econômica
Já Adriano Oliveira, cientista político da UFPE, acredita que o governo não enfrenta problemas graves para passar textos de seu interesse no Congresso. Isso porque Lira tem se mostrado o grande articulador de temas que partem do Executivo, mas seu esforço está condicionado aos benefícios que determinados projetos terão para ele e seus aliados.
No caso da reforma do Imposto de Renda, por exemplo, ele aponta que a demora para a votação não se deu por falha de Lira, e sim pela complexidade do tema. “No caso do IR, temos o empresariado que tem reagido, temos parcela da oposição que tem reagido. O IR é uma proposta que desagrada governadores, causa perda de arrecadação. Então o problema é a proposta. O governo não tem problemas no Congresso”, disse.
Ele considera, também, que o Sete de Setembro será um “divisor de águas” na política do governo e em suas relações. “Se tiver um tumulto forte, as instituições poderão reagir com mais força. Depois disso, o foco será na economia, e o Centrão pode optar por sair do governo no próximo ano, principalmente o Centrão no Nordeste. Não seria uma surpresa se saíssem em abril, a menos que a economia reaja até lá”, pontua.
Nesse intervalo de sete meses, Oliveira acredita que o presidente da Câmara deve manter o trabalho que fez até aqui. “Na minha ótica, ele tem conduzido com muito equilíbrio. Ele tem compromisso com o que prometeu aos deputados de ouvir todos e pautar pautas importantes, como as reformas tributária e eleitoral e também está sabendo conduzir a relação com o presidente Bolsonaro”, completa.
Força autônoma
Entre os deputados, é comum ouvir que o presidente Lira é um grande articulador, mesmo entre membros da oposição. “O deputado Lira é um grande articulador; o problema é que as condições estão mudando rapidamente. Ser leal às pautas do governo num momento como esse é difícil. O presidente tem encarecido o apoio a ele mesmo. Quando ele ataca o STF, os deputados estão sendo colocados em situações mais complexas”, ressalta o deputado federal Israel Batista (PV-DF).
Ele aponta que Lira chegou ao protagonismo porque o governo enfrenta uma crise de articulação e liderança. “O governo tem uma equipe trapalhona, coloca o Congresso em más situações constantemente; aposta em conflito, e isso faz com que ele perca liderança. Nesse momento, busca-se preencher as lacunas. Esse governo permitiu que o Congresso se tornasse uma força autônoma. Os grupos de interesse viram que não compensa buscar o governo para defender seus interesses, basta ir ao Congresso diretamente”, afirma Batista.
Apesar de reconhecer o trabalho do presidente da Câmara na articulação, o deputado critica a forma como as pautas têm sido tocadas. Para ele, é preciso haver mais diálogo, especialmente no caso de temas complexos. “Ele está passando coisas rápido demais, precisava de um freio de arrumação. Tinha que ter um debate maior. A sociedade não está atenta, todos estão desesperados, a pandemia não se sabe se vai controlar ou não. É momento de mobilizar a sociedade. O risco de tomarmos decisões que não os representam é grande”, conclui Professor Israel Batista.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.