O jogo é jogado
A frase “treino é treino, jogo é jogo” é de autoria de Valdir Pereira da Silva, mais conhecido como Didi, bicampeão mundial de futebol (1958-1962). O craque não gostava de exercícios físicos e enrolava nos treinos, se prevalecendo de sua reconhecida habilidade com a bola, algo impensável hoje em dia, mesmo para Messi, Cristiano Ronaldo e Neymar. Didi foi um dos melhores e mais elegantes meio-campistas da história. Inventou a “folha seca”, um chute de bico de pé, com a bola parada, que surpreendia os goleiros pela sua trajetória enviesada e a repentina descaída da bola ao se aproximar do gol.
A “folha seca” entrou para a história do futebol aos 27 minutos do segundo tempo do jogo da nossa seleção contra o Peru, classificando o Brasil nas eliminatórias sul-americanas para a Copa do Mundo da Suécia, em 1958. Resulta de dois efeitos aerodinâmicos: a “força ascensorial”, a mesma provocada pela curvatura da asa do avião, ao fazer o vento se deslocar mais rapidamente pela superfície superior do que pela inferior, o que faz com que se sustente no ar enquanto há impulsão; e o “efeito Magnus”, no qual a velocidade de giro da bola sobre o próprio eixo, por sua superfície áspera, provoca uma trajetória elíptica, como nos gols de escanteio. Essa combinação torna impossível prever e interceptar o percurso da bola.
O jogo eleitoral de 2022 começou com uma “folha seca”, a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro à formação de frentes partidárias nas eleições, mitigando o fim das coligações proporcionais. Com isso, duas ou mais siglas com afinidade ideológica e programática poderão se unir para atuar de maneira uniforme em todo o país, sem que seja necessário fundir os diretórios. Entretanto, a união precisa durar quatro anos. A decisão pode facilitar a sobrevivência dos pequenos partidos, mas foi uma jogada das grandes legendas, como o PT e o PSD, interessados em formar amplas alianças nas eleições do próximo ano.
A minirreforma eleitoral foi promulgada ontem, pelo presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG). “No final das contas, o entendimento do Senado Federal foi de que o sistema eleitoral deveria e deve ser aquele que estabelecemos em 2017: o sistema proporcional, sem coligações partidárias, com cláusula de desempenho que façam que os partidos possam funcionar e ter acesso ao fundo partidário, tempo de TV e rádio, desde que cumpram determinadas metas ao longo do tempo. Primeira eleição federal com essa regra é esta de 2022”, disse Pacheco, grande beneficiado pela proposta.
Frentes partidárias
Pacheco é assediado pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab, para ser candidato a presidente da República. Para isso, teria de deixar o DEM, o que dividiria muito a política mineira, cuja unidade é pré-condição para que sua candidatura possa existir. Com a formação da federação, Pacheco não precisa sair da legenda para ser candidato do PSD, o que abriria caminho para o ex-ministro Henrique Mandetta. Além disso, o PSL já aprovou sua fusão com o DEM. Teria o apoio de Geraldo Alckmin, em São Paulo, e Eduardo Paes, no Rio de Janeiro, ambos no PSL, e de ACM Neto (DEM) na Bahia, ou seja, poderia armar um forte bloco de candidatos aos governos dos quatro maiores colégios eleitorais do país.
Outro que fatura a derrubada do veto é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT, que pode restabelecer a velha frente de esquerda formada com o PSB e o PCdoB e ainda ampliá-la. Lula é o franco favorito da eleição, tendo recebido ontem o apoio explícito do ex-ministro Delfim Neto, para quem o petista será vitorioso no primeiro turno. Mas aí vale a máxima do Didi, até agora tudo foi treino.
Embora tenha vetado a formação de frentes, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) também fica numa posição confortável. É assediado pelos dois principais líderes do PP, o ministro da Casa Civil, senador Ciro Nogueira (PI), e o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (AL), mas agora pode garantir o apoio da legenda mesmo que venha a optar por um pequeno partido que possa controlar.
O texto também cria regras para incentivar candidaturas de mulheres e negros, sobre troca de partidos e para a realização de plebiscitos municipais. Além de regulamentar a distribuição dos fundos partidário e eleitoral, a nova lei facilita a troca de partido, em caso de concordância da sigla, e a incorporação de legendas, sem que os esqueletos nos armários sejam transferidos dos dirigentes das siglas extintas para as novas.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.