Relator da CPI vai propor indiciamento de Bolsonaro

Renan lista os crimes pelos quais responderão os citados no documento que resume os trabalhos da comissão. "Nós não vamos falar grosso na investigação e ‘miar’ no relatório", diz

» Raphael Felice » Jorge Vasconcellos
postado em 06/10/2021 00:00
 (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)
(crédito: Roque de Sá/Agência Senado)

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) assegurou, ontem, que o relatório final da CPI da Covid indiciará Jair Bolsonaro “com certeza”. Para ele, o presidente da República tem participação direta no descontrole da pandemia e nas ações que influíram na rapidez em combater a doença — tal como a campanha em favor de medicamentos sem eficácia contra o novo coronavírus, as ironias e dúvidas lançadas sobre os mortos e infectados, além das dificuldades impostas pelo governo na negociação de vacinas que estavam sendo produzidas por grandes laboratórios.

“Com certeza será (indiciado). Nós não vamos falar grosso na investigação e ‘miar’ no relatório. Ele, com certeza, será sim indiciado pelo que praticou”, salientou Renan.

O senador explicou que, além de Bolsonaro, ministros, conselheiros palacianos e de fora do governo — como os integrantes dos chamados “gabinete paralelo” e “gabinete do ódio” —, além de integrantes de empresas privadas que fizeram parte do “desvio de dinheiro público e da roubalheira” serão responsabilizados. O relator listou os crimes pelos quais pretende responsabilizar os citados no documento.

“Usaremos os tipos penais do crime comum, do crime de responsabilidade, do crime contra a vida, do crime contra humanidade. E estamos avaliando, com relação a indígenas, a utilização do genocídio”, explicou.

O documento que resumirá os trabalhos da CPI também deve propor alterações na Lei do Impeachment, que seriam encaminhadas diretamente ao Plenário do Senado. A ideia é fazer com que o poder de abrir um processo de cassação do mandato do presidente da República não dependa de decisão exclusiva do presidente da Câmara dos Deputados.

No rastro de Dias
Em relação à sessão de ontem, a CPI vai apurar detalhes das viagens feitas por Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, com passagens emitidas pela Voetur Turismo, pertencente ao mesmo grupo da VTCLog — cujo sócio-administrador da VTCLog, Raimundo Nonato Brasil, foi ouvido pelo colegiado. A comissão de inquérito deu prazo de 24 horas para as duas companhias enviarem informações sobre os voos do ex-gestor do ministério.

Isso porque os senadores que integram a CPI suspeitam que a VTCLog tenha custeado as passagens de Roberto Dias em troca de favorecimento em negociações com a pasta. A empresa de logística tem um contrato de aproximadamente R$ 500 milhões com o ministério para armazenamento e distribuição de insumos, incluindo vacinas contra a covid-19. O contrato foi assinado em dezembro de 2018.

Em 2021, a VTCLog conseguiu, ainda, com autorização de Roberto Dias, um aditivo ao mesmo contrato. O ex-diretor propôs um acordo de pagamento de R$ 18 milhões, 60% a menos do que a empresa pretendia, mas, ainda assim, 18 vezes maior do que recomendava a área técnica do ministério.

Raimundo afirmou que o aditivo foi necessário ante o aumento da demanda do ministério durante a pandemia. Ele negou que a VTCLog tenha pedido ajuda de funcionários públicos para intermediar as negociações com a pasta.

O termo aditivo foi suspenso por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU). Em junho, Dias foi exonerado do cargo por envolvimento em um outro caso investigado pela CPI: a suspeita de que pediu propina em uma negociação para compras de vacinas contra a covid-19.

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Movimentação de R$ 117 milhões em 2 anos

A CPI da Covid já tem mapeado que a VTCLog movimentou, em transações consideradas atípicas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), R$ 117 milhões nos últimos dois anos. Desse valor, quase R$ 5 milhões foram movimentados por Ivanildo Gonçalves da Silva, motoboy que trabalha a serviço da empresa e que foi ouvido pela comissão em 1º de setembro.

A CPI tem evidências de que ele realizou, em maio e junho deste ano, pagamento de boletos em nome do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, na agência da Caixa Econômica Federal do Aeroporto Internacional de Brasília. Somados, os valores totalizariam R$ 47 mil.

Questionado sobre o assunto, o sócio-adminstrador da VTCLog, Raimundo Nonato Brasil, negou que a empresa tenha pago as passagens para o ex-diretor. “Fui informado pela diretoria que o senhor Dias é cliente da Voetur Turismo e comprou algumas passagens aéreas e realizou pagamentos via depósito bancário e em dinheiro. Os boletos pagos em dinheiro, o financeiro encaminhou para que os boletos fossem liquidados”, disse.

Durante o depoimento, Raimundo Nonato salientou que não tinha várias informações solicitadas pelos senadores e que não participava diretamente das tratativas com órgãos públicos. Por causa disso, depois do recesso, foi auxiliado nas respostas por Andréia Lima, diretora da VTCLog — que quase todo o tempo reforçou as versões dadas pelo empresário.

Entre as decisões de ontem, a CPI deu 48 horas para que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, explique as razões pelas quais a pasta comprará, em 2022, apenas vacinas contra a covid-19 que tenham obtido o registro definitivo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Isso excluiria a CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan, e a da Janssen — restariam apenas a da Pfizer e a da Fiocruz-AstraZeneca.

Para hoje, está agendado o depoimento do presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Roberto Rebello, que deverá prestar esclarecimentos sobre as denúncias relacionadas à Prevent Senior trazidas à comissão na oitiva da advogada Bruna Morato, semana passada. (JV e RF)

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