Entrevista | SERGIO MORO | Pré-candidato à Presidência da República pelo Podemos

"Não vou entrar nesse baixo jogo"

Correio Braziliense
postado em 05/12/2021 00:01

"Como eu vou negar à população brasileira a oportunidade de ir para Brasília e construir um país melhor? Eu aceitei. E continuei no governo. E foram feitas coisas boas". O ex-ministro da Justiça Sergio Moro não se arrepende de ter dito "sim" ao presidente Jair Bolsonaro em 2018, mas critica os repetidos ataques que tem recebido do chefe do Executivo. Segundo Moro, "o presidente quer desviar a atenção das pessoas" porque não tem projeto de país. "Seu único projeto é a reeleição", afirma, em entrevista exclusiva ao Correio Braziliense.

Segundo ele, que hoje no Recife para lançar seu livro de 288 páginas, Sergio Moro contra o Sistema da Corrupção, seu plano principal na Justiça era a consolidação dos avanços contra a corrupção feitos por ele durante a Operação Lava-Jato como juiz. Ele lamenta, contudo, não ter tido apoio de Bolsonaro durante o tempo à frente da pasta. "Se o ministro não tem apoio do presidente da República, como é que ele consegue convencer o Congresso, o Supremo Tribunal Federal?"

Segundo o pré-candidato do Podemos, Bolsonaro "não está nem aí para o combate à corrupção". Perguntado se abriria mão da candidatura à Presidência para ser vice em alguma composição partidária, Moro avisa que seu "navio já zarpou", e espera que, se tiver melhor performance mais à frente, os outros tenham essa disposição. No embalo para 2022, o presidenciável lança ainda a candidatura do senador José Antônio Reguffe (Podemos) ao Governo do Distrito Federal.

Arrepende-se de ter participado do governo Bolsonaro?

De forma alguma. Eu era juiz da Operação Lava-Jato. Junto com vários outros magistrados, procuradores, advogados, de várias instâncias, com grande apoio popular, milhões de brasileiros saíram às ruas. Nós quebramos a impunidade da grande corrupção. Esse é um trabalho que me traz muito orgulho. Agora, em 2018, eu recebi um convite do presidente eleito. E vamos voltar os nossos relógios a 2018: a visão que se tinha era diferente da presente. Eu recebo um convite do presidente eleito para consolidar os avanços contra a corrupção. Eu pensei, assim, olha, o presidente é um personagem controvertido, mas, como milhões de brasileiros, todos acreditaram que tinha uma chance de dar certo. Mesmo aqueles que não acreditavam, esperavam que estivessem errados. Como eu vou negar à população brasileira a oportunidade de ir para Brasília e construir um país melhor? Eu aceitei. E continuei no governo. E foram feitas coisas boas.

O quê, por exemplo?

Nenhum Ministério da Justiça como o nosso, durante a minha gestão, combateu mais rigorosamente o crime organizado. Mesmo quem não gosta de mim reconhece isso. Enfrentamos lideranças das maiores organizações criminosas do país. Tivemos uma queda no número de crimes durante o primeiro ano da minha gestão. Caíram 19% os assassinatos no país. Tivemos programas muito exitosos, como a execução da rede nacional de perfis genéticos, abandonada em governos anteriores e outros. É claro que, quando a gente olha a segurança pública, ainda ficamos insatisfeitos. Não se consegue resolver tudo em um ano e quatro meses. Conseguimos fazer muito.

E em relação ao
combate à corrupção?

No meu plano principal, que era a consolidação dos avanços contra a corrupção, sinceramente, eu não tive apoio do presidente da República. E se o ministro não tem apoio do presidente da República, como é que ele consegue convencer o Congresso, o Supremo Tribunal Federal? Resistência no Congresso e no Supremo é normal, é da separação dos Poderes. Então, você tem que construir. Mas, se eu tinha o presidente sabotando, dia após dia, o combate à corrupção, não tinha condições de avançar.

Na última live, Bolsonaro xingou o senhor. Na filiação ao PL, o senador Flávio Bolsonaro disse, 'Moro nos traiu e humilhou uma mulher (deputada Carla Zambelli)', numa alusão ao eleitorado feminino...

Eu e o presidente somos pessoas muito diferentes. A minha proposta é construir um projeto de país e apresentar aos brasileiros e brasileiras. Inclusive, resguardar o direito das mulheres, promover esses direitos é parte fundamental desse projeto. Temos que perseguir melhor igualdade entre os homens e as mulheres no Brasil em diversos setores. Tenho uma filha e quero que ela possa, na vida, competir em condições de igualdade com os homens. Não vou entrar nesse baixo jogo, de ficar ofendendo, de ficar mentindo em relação ao que aconteceu. As pessoas sabem a verdade. O que acontece aqui é que o presidente quer desviar a atenção das pessoas. O presidente não tem projeto de país. O único projeto é a reeleição. O presidente não é uma liderança que inspira as pessoas. Se você não tem um líder, não tem um projeto, o país não vai a lugar nenhum.

Como o senhor pretende se contrapor ao presidente?

Vamos demonstrar que somos sérios, não somos agressivos, mas que o nosso projeto é vigoroso. Consistente do ponto de vista técnico e fundado em princípios e valores e no diálogo. E diálogo com todo mundo. Não vamos entrar nessa baixa política, que o presidente quer nos arrastar porque não tem o que apresentar. O que o presidente tem a apresentar para os brasileiros? Gasolina a quase R$ 7, preços no mercado subindo. Juros? Banco Central aumentou porque tem que controlar a inflação já que o país perdeu a credibilidade fiscal. Isso vai aumentar a dívida pública e vai aumentar a dívida das pessoas.

O senhor vai conversar com todos que postulam a condição de nome da terceira via?

Primeiro, vamos esquecer essa expressão terceira via. Terceira via parte do pressuposto que temos dois candidatos inevitáveis e que seriam favoritos, que é o atual presidente e um presidente anterior. Eu, sinceramente, não acredito nisso. Não acho que o Brasil vai ser forçado a ter escolhas tão trágicas assim. É um governo que não funciona e um governo que não funcionou no passado. Ninguém quer isso de volta. Vamos ver o que vai acontecer nas eleições do próximo ano. Eu apresentei o meu nome. Quero construir um projeto e estou colocando de maneira muito clara. Meu objetivo é liderar esse projeto. Mas estamos conversando com todo mundo. E não só agora. Conversamos também no passado, porque o diálogo é importante, é relevante para a gente construir um país melhor e não tratar todo mundo nessa lógica, que são dos dois extremos, de amigo-inimigo. Todas as portas estão abertas para todas as pessoas.

Aceitaria o papel de coadjuvante, ou seja, de ser
vice nesse processo de construção para 2022?

Nós colocamos nosso projeto em andamento. Dá para usar aquela expressão, este navio já zarpou. Acredito que o nosso projeto, trazendo os partidos, a sociedade, convencendo a população de que nosso projeto é consistente, e a credibilidade das pessoas que estão nele envolvidas, é o que tem a melhor chance de êxito. Nunca tive a ambição pessoal de ser presidente. Para evitar os extremos, se outro projeto tiver melhores chances, não teria problemas em abrir mão. Agora, acredito na liderança do nosso projeto. Assim como acredito que poderia abrir mão, espero que outros tenham o mesmo entendimento, porque nós precisamos somar.

Que outros partidos podem
se aliar ao Podemos?

Haverá chance de aliança com todo partido que tiver comunhão com nossos princípios e nossos valores; uma visão liberal de economia, sem prejuízo de políticas sociais consistentes.

O União Brasil é quem está
mais perto de pegar a vice?

Temos conversado com União Brasil, Novo, Cidadania, PSDB, eu sou um homem do diálogo. E sou também um homem de princípios e valores, e as duas coisas não são incompatíveis. A política é a arte do diálogo fundada em princípios, valores e projetos, evidentemente. Agora, temos que estabelecer limites e basear essas conversas em um projeto. Não adianta a gente conversar apenas pensando em preferências pessoais e proximidade. A gente tem que ter um projeto de país, e isso não existe há muito tempo.

E o Distrito Federal?

O senador José Antônio Reguffe é um grande quadro político brasileiro. Tem um histórico de vida pública. Tem demonstrado tanto integridade quanto compromisso com boas causas perante o Congresso. É conhecido da população do Distrito Federal pela sua simplicidade, pela forma como aborda as pessoas, utiliza os meios digitais para divulgar o que faz, mas tem essa característica da pessoa na rua conversando e convencendo. É pré-candidato, sim, ao governo do Distrito Federal. Tenho convicção de que ele tem grandes chances de ser o próximo governador do DF. Se ele escolher ser candidato, terá meu apoio.

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