O cenário de 2022 para a economia brasileira será bastante desafiador, de acordo com os economistas que participaram, ontem, do seminário Desafios 2022: para onde vai o Brasil, organizado pelo Correio. O país caminha para uma nova recessão e as perspectivas dos especialistas para o próximo ano não são muito animadoras. Um dos motivos apontados foi a mudança no arcabouço fiscal, que colocou em dúvida o compromisso do governo em respeitar as regras existentes. As incertezas sobre a capacidade de o país crescer em um ano eleitoral ajudam a piorar as perspectivas.
O quadro de estagflação — quando não há crescimento econômico e a inflação e o desemprego são elevados — também não foi descartado, após a recessão técnica caracterizada pelas duas quedas consecutivas do Produto Interno Bruto (PIB), no segundo e no terceiro trimestres deste ano, de 0,4% e de 0,1%, respectivamente.
Especialistas reconhecem que a inflação, atualmente em dois dígitos, pode ceder, mas não será fácil. Pelas estimativas do Credit Suisse, a taxa básica de juros (Selic) deve subir ainda mais, podendo chegar a 12,25% no fim do ano que vem. O banco prevê queda de 0,5% no Produto Interno Bruto (PIB) e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acima de 6%, superando o teto da meta do próximo ano, de 5%.
Ao apresentar esses números, Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse, demonstrou preocupação com as mudanças no teto de gastos feitas na PEC dos Precatórios e não descartou recessão no próximo ano, em meio ao cenário de deterioração fiscal. "A incerteza em 2022 vai ser vivenciada sem a âncora fiscal. O teto de gastos mudou e não é mais o mesmo do passado", alertou. Para ela, "2022 será um ano de grandes desafios, com grandes incertezas e fundamentos deteriorados".
A economista destacou que, devido à inércia inflacionária, será difícil para o Banco Central entregar o custo de vida abaixo do teto da meta de 2022, de 5%, devido aos reajustes, inclusive salariais, que devem ser repassados no preço. com isso, será o segundo ano seguido de descumprimento da meta inflacionária. "Vamos passar por um período complicado, porque a inflação deste ano está fechando o ano entre 10% e 11% e, mesmo com a desaceleração da economia, eu não vejo a inércia retrocedendo", disse.
De acordo com Solange Srour, para reverter o quadro de baixo crescimento e de desigualdade, será preciso voltar com a agenda das reformas e de consolidação fiscal, "com uma reforma tributária buscando eficiência, para ficar menos pessimista com o PIB potencial baixo". Contudo, ela reforçou que será um desafio enorme tentar fazer reformas e recuperar a âncora fiscal em um ano eleitoral.
Estagflação
A economista e consultora Zeina Latif e o estrategista da Wealth High Governance (WHG), Tony Volpon, concordaram que o país está em um cenário de estagflação.
A consultora reconheceu que haverá algum alívio na inflação ao longo de 2022, devido ao ciclo de aperto monetário iniciado em março passado pelo Banco Central. "A política monetária, ainda que eu acredite que tenha perdido eficácia, funciona. Mas acho que o custo vai ser maior para trazer a inflação para baixo", disse Zeina Latif.
Segundo ela, houve descuido na gestão fiscal durante a pandemia. "No Brasil, a questão da inflação é sempre complicada. O país tem um passado inflacionário, então, eu acho que faltou zelo na calibragem das políticas públicas. Na minha visão, muitas prioridades foram corretas, há mérito do governo na definição das prioridades, o efeito do auxílio emergencial foi muito importante. Mas acho que, de forma geral, a gente errou na calibragem, na quantidade e na forma de como foi feita", destacou Zeina Latif. Ela acrescentou que a política econômica está sendo conduzida mais pelo Congresso do que pelo governo.
De acordo com Tony Volpon, não há lugar no mundo que não terá queda no crescimento em 2022 na comparação com este ano. Contudo, ele destacou que o impulso fiscal será negativo e isso vai contribuir para o cenário de baixo crescimento. "Em 2022, o ano será meio amargo", afirmou.
Volpon, porém, evitou atribuir o PIB fraco à política fiscal. "Eu acho que a falta de crescimento nesses últimos anos é um pouco mais misteriosa do que várias pessoas falam, jogando toda a culpa na falta de disciplina fiscal. Até porque a gente teve boa disciplina fiscal, o teto funcionou por vários anos, aquela alta que a gente estava tendo de quase 6% do gasto público por ano, em termos reais, caiu para zero", afirmou Volpon. Para ele, o Banco Central errou no diagnóstico de que a inflação era temporária e, por conta disso, demorou a dar início ao ciclo de alta de juros, que, agora, precisa ser mais forte e vai frear a atividade. Volpon acredita que a inflação vai cair. "Isso é muito claro, independentemente do que o Boletim Focus ou a percepção de agentes de mercados dizem", apostou.
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