Bateu-levou com Dallagnol

O presidente Jair Bolsonaro usou as redes sociais, ontem, para contar que, em 2019, se recusou a receber o então procurador e coordenador da Operação Lava-Jato, Deltan Dallagnol, para uma audiência. Na ocasião, segundo o chefe do Executivo, o então integrante do Ministério Público estava sendo cotado "nas mídias sociais" para a Procuradoria-Geral da República (PGR), assim como Sergio Moro, no cargo de ministro da Justiça, era ventilado para o Supremo Tribunal Federal (STF). Bolsonaro disse que Dallagnol o acusaria de parcialidade por não indicá-lo à PGR. O vídeo foi postado num momento em que Moro (Podemos) ganha terreno nas pesquisas eleitorais para o ano que vem.

A gravação foi postada por Bolsonaro no Twitter e no Facebook. Nela, o presidente pede aos seguidores que assistam a outro vídeo, do youtuber conservador Kim Paim, que, segundo ele, mostra o "jogo do poder de forma documentada". "Uma das passagens que não está ali: estava em 2019, faltava (sic) poucas semanas para eu indicar o PGR para o Senado. Um ajudante de ordens trouxe o telefone e falou: Deltan Dallagnol quer falar contigo. Eu falei: 'Não vou falar com ele'", diz Bolsonaro na gravação.

O chefe do Executivo disse que não o indicaria para a PGR e que o então procurador o acusaria de parcialidade. "Se eu tivesse uma audiência com ele, com toda a certeza, eu não iria indicá-lo para PGR, mas ele ia sair com uma história pronta — como eles faziam por ocasião de alguns depoimentos na Lava Jato, escreviam o depoimento e chamavam o cara para assinar", criticou. "E ia falar o quê? Que eu teria feito uma proposta indecorosa pra ele, para salvar algum parente."

Tanto Moro quanto Dallagnol se filiaram ao Podemos com vista às eleições de 2022. Moro é pré-candidato à presidência, mas o ex-procurador da Lava-Jato ainda não lançou candidatura prévia a nenhum cargo. Cogita-se que ele disputará uma vaga à Câmara dos Deputados.

Moro, por sua vez, tem despontado na terceira colocação em pesquisas eleitorais para o ano que vem. Pesquisa Genial/Quaest, divulgada na quarta-feira, mostrou que ele teria 11% das intenções de voto em um cenário sem candidaturas do PSDB, do PSD e do Novo. Ficaria à frente de Ciro Gomes (PDT), que atingiu 7% das intenções de voto, mas atrás de Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 24% e 47%, respectivamente.

Pesquisa da Quaest feita para o Estadão mostra que 55% dos eleitores que não aceitam Bolsonaro ou Lula veem como acertada a decisão de Moro de se candidatar em 2022. Na amostra geral, 37% são favoráveis à decisão, e 50%, contrários.

Em 2019, Dallagnol chegou a ser cotado para a Procuradoria-Geral da República, na primeira indicação de Bolsonaro à chefia do Ministério Público. Entretanto, perdeu a vaga para o então subprocurador-geral, Augusto Aras, reconduzido neste ano à chefia do órgão.

Resposta

Também por vídeo, Dallagnol rebateu Bolsonaro. "Ao contrário do que o presidente afirmou, eu jamais pedi reunião ou liguei para ele, nem antes nem depois da indicação do procurador-geral da República que acabou com a Lava-Jato", disparou. "Interlocutores do Planalto me procuraram, em 2019, para perguntar se eu aceitaria me reunir com ele, mas eu recusei, do mesmo modo que recusei o convite para ir ao Palácio do Jaburu encontrar o então presidente Temer em 2016."

Dallagnol disse respeitar a função de presidente da República, "mas nessas duas ocasiões, a nossa equipe de procuradores entendeu que os encontros não seriam apropriados porque alimentariam questionamentos infundados sobre o nosso trabalho, que sempre foi técnico, imparcial e apartidário".

"O presidente Bolsonaro também errou ao dizer que os procuradores escreveriam as delações dos colaboradores, talvez, porque ele não teve a oportunidade de conhecer melhor o nosso trabalho na Lava-Jato", alfinetou. "Todos os acordos de colaboração foram negociados com as defesas, e os fatos e as provas foram trazidos espontaneamente pelos colaboradores. Os bilhões que foram devolvidos por réus confessos não deram em árvores."

O ex-procurador aproveitou para dar uma estocada no PT. "Nós não devemos dar voz ao discurso alucinado de apoiadores do ex-presidente Lula, de que o petrolão teria sido uma invenção, o que é uma alucinação daqueles que querem preservar o sistema de corrupção contra o qual nós lutamos", enfatizou.