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Um século de sigilo sobre reuniões com pastores

GSI alega segurança de Bolsonaro e nega acesso a dados a respeito de encontros do presidente com evangélicos lobistas do MEC

Ingrid Soares
postado em 14/04/2022 00:01
 (crédito: Marcos Corrêa/PR )
(crédito: Marcos Corrêa/PR )

Em meio aos reiterados discursos do presidente Jair Bolsonaro (PL) de que não há corrupção na sua gestão, o governo impôs sigilo de 100 anos sobre os encontros entre o chefe do Executivo e pastores lobistas que atuavam no Ministério da Educação (MEC). O jornal O Globo teve negado o pedido — feito por meio da Lei de Acesso à Informação — da lista de entradas e saídas dos líderes evangélicos Gilmar Santos e Arilton Moura no Planalto. Os dois religiosos são suspeitos de envolvimento em um esquema de propinas no MEC.

Instado, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), do ministro Augusto Heleno, informou que a solicitação "não poderá ser atendida" porque a divulgação das informações poderia colocar em risco a vida do presidente da República e familiares. "Observa-se, assim, que o tratamento de dados pessoais coletados no caso, o nome e a data de entrada de visitantes na Presidência da República, cumpre a finalidade específica de segurança", disse, amparando a resposta na Lei 13.844, de 2019.

"Ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República compete: zelar, assegurado o exercício do poder de polícia, pela segurança pessoal do Presidente da República e do Vice-Presidente da República", acrescentou o gabinete ao jornal.

À tarde, Bolsonaro ironizou um internauta no Twitter após ter sido questionado sobre a adoção do sigilo. "Presidente, o senhor pode me responder por que todos os assuntos espinhosos/polêmicos do seu mandato, você põe sigilo de 100 anos? Existe algo para esconder?", perguntou o homem. O chefe do Executivo respondeu: "Em 100 anos saberá", seguido de um emoji de joinha. Na tréplica, o internauta insistiu: "Presidente, me parece um tanto quanto cômodo para o senhor e péssimo para toda a população, porque se a 'verdade é o que nos libertará', 100 anos não é muito tempo não?". Dessa vez, porém, não houve resposta.

O presidente da Comissão de Educação, senador Marcelo Castro (MDB-PI), questionou as motivações do governo com a medida. "Por que decretar sigilo das reuniões com os pastores? A agenda do presidente é pública. Por que esconder? Sinceramente, nos causa espécie. É algo absolutamente inusitado, surpreendente e inesperado. Mais um fato gravíssimo acerca das denúncias de irregularidades no MEC/FNDE", publicou nas redes sociais.

Em áudios divulgados pela imprensa, o até então ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou priorizar pastores aliados na liberação de recursos do Fundo Nacional da Educação (FNDE). Na gravação, Ribeiro ainda cita que o favorecimento é um pedido expresso de Bolsonaro. "Minha prioridade é atender, primeiro, os municípios que mais precisam e, segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar."

Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura se reuniram com Bolsonaro ao menos três vezes, no Palácio do Planalto, e uma no Ministério da Educação, com a presença de Milton Ribeiro. Essas visitas constam da agenda oficial do presidente. Porém, o GSI se recusa a informar os encontros com os religiosos que possam ter ficado fora da agenda.

No início deste mês, o GSI agiu da mesma forma ante um pedido do Estadão sobre a relação de visitas do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, ao Planalto — solicitação também feita por meio da Lei de Acesso à Informação. O dirigente partidário — condenado no mensalão — teria apadrinhado a nomeação do diretor de Ações Educacionais do FNDE, Garigham Amarante Pinto, responsável pela licitação de ônibus escolar com sobrepreço de R$ 732 milhões. Novamente, a pasta alegou risco à segurança de Bolsonaro para não repassar os dados.

Em nota divulgada à noite, o GSI frisou que "o controle de acesso ao Palácio do Planalto é aplicado aos visitantes, de forma isenta, indistinta e criteriosa, estejam ou não 'ocupando' espaço na mídia. "Trata-se, portanto, de ferramenta que garante o cumprimento de atribuição legal deste Gabinete, no sentido de proporcionar a segurança das instalações do Palácio do Planalto e de todos os seus servidores", acrescentou.

A pasta destacou, também, que "em atenção à legislação vigente, ratifica o seu posicionamento de não difundir dados pessoais — de qualquer visitante — registrados em sua plataforma exclusiva e restrita à segurança para o controle de acesso".

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