Às vésperas da data marcada para a definição do futuro do autodenominado centro democrático, na próxima quarta-feira, a crise interna do PSDB ganhou dimensão pública, no sábado (14/5), com a decisão do presidente da legenda, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), de convocar uma reunião de emergência da Comissão Executiva Ampliada para terça-feira, em Brasília.
Um dos motivos da convocação, segundo nota divulgada por Araújo, foi uma carta que recebeu no sábado, assinada pelo pré-candidato à Presidência João Doria e pelo advogado dele, Arthur Luís Mendonça Rollo, apontando que haveria uma "tentativa de golpe" dentro do partido; que critérios como má colocação nas pesquisas e altos índices de rejeição são "desculpas estapafúrdias"; e reclamando de "movimentações do presidente nacional que criam insegurança jurídica".
Na carta, à qual o Correio teve acesso, Doria queixa-se de que, "apesar de termos vencido legitimamente as prévias, as tentativas de golpe (contra a candidatura) continuaram acontecendo. As desculpas para isso são as mais estapafúrdias, como, por exemplo, a de que estaríamos mal colocados nas pesquisas de opinião pública e com altos índices de rejeição, cinco meses antes do pleito".
Nas sete páginas do documento, há longas transcrições de leis e jurisprudência para atestar a legitimidade da pré-candidatura de Doria, avalizada pelas prévias, indicando que o ex-governador tem armas para judicializar qualquer medida da Executiva que tente retirá-lo da disputa.
Candidatura própria
A carta de Doria e a reação de Araújo refletiram o rápido aumento da temperatura no ninho tucano, entre a noite de sexta-feira e ontem, decorrente de uma mudança significativa de postura de duas lideranças fortes da legenda. O senador Tasso Jereissati (CE) e o deputado federal Aécio Neves (MG), vozes mais influentes da oposição ao pré-candidato João Doria, declararam que o PSDB pode seguir com candidatura própria, sem se aliar ao MDB da senadora Simone Tebet (MS), na corrida eleitoral.
Na noite de sexta-feira, Jereissati, em entrevista ao jornalista Mario Sérgio Conti, da Globonews, reconheceu que a divisão interna põe em risco a própria sobrevivência do partido e que a pré-candidatura de Doria tem a legitimidade das prévias às quais ele se submeteu, em uma disputa com o ex-governador gaúcho Eduardo Leite. Para ele, Doria pode não ser o candidato ideal, mas não pode ficar isolado na legenda.
Na mesma linha, Aécio Neves declarou que seria "ruim para o partido" retirar a candidatura de Doria apenas para apoiar Simone Tebet, em entrevista à Folha de S.Paulo. E foi além, ao prestar solidariedade ao pré-candidato tucano, que estaria sendo vítima de "traição". "Eu quero deixar clara a minha solidariedade ao Doria", que está, segundo ele, "conhecendo a face triste da política, que é a traição dos seus próprios companheiros".
A crise reforça a expectativa de que a reunião de quarta-feira entre PSDB, MDB e Cidadania não chegue a um resultado prático. Segundo um deputado tucano da ala histórica, o que está movendo o partido, agora, "é o instinto de sobrevivência".
Os presidentes das legendas que tentam construir uma candidatura de centro como alternativa à polarização Lula x Bolsonaro acordaram avaliar o desempenho de Tebet e Doria em pesquisas quantitativas e qualitativas, cujos dados estão sendo colhidos neste fim de semana pelo Instituto Guimarães de Pesquisa e Planejamento.
O coordenador da campanha de Doria, Marco Vinholi, está otimista. "Seguimos animados. Os resultados da pesquisa Ipespe (divulgada na sexta-feira) colocam João Doria numa situação dentre os candidatos da 3ª via como favorito. E o resultado das prévias partidárias garantem a ele presença na disputa pela Presidência da República. Seguimos trabalhando e conscientes que grande parcela da população brasileira não quer votar nem em Bolsonaro nem em Lula. E enxergará Doria como a opção viável para retomar o desenvolvimento do nosso país", disse.
O fator FHC
A expectativa, agora, no ninho tucano, é com relação à postura do tucano mais influente, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A legenda foi abalada pela decisão de outro tucano histórico, o ex-chanceler Aloysio Nunes. Na última sexta-feira, ele anunciou apoio ao pré-candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, ainda no primeiro turno.
FHC, Aloysio Nunes e Tasso Jereissati fazem parte da ala histórica do partido. O ex-presidente ainda mantém uma relação de cordialidade e respeito com Lula e com o pré-candidato a vice, o ex-tucano Geraldo Alckmin, que também integrava a ala mais raiz do tucanato, antes de mudar para o PSB. Nos bastidores, já há quem aposte no apoio à chapa "Lula com Chuchu" no segundo turno, caso se confirme a derrota de Doria nas urnas, projetada pelas pesquisas até agora.
Seria uma reversão de expectativa, depois que o partido fez a virada da centro-esquerda para a centro-direita capitaneada pela ascensão de Doria na política paulista e expressa no apoio informal dele à candidatura de Bolsonaro, em 2018, na onda do "BolsoDoria".
No MDB, a postura da senadora Simone Tebet permanece a mesma, de não aceitar ser candidata a vice em uma chapa com João Doria. O candidato a parceiro preferido dela ainda é Eduardo Leite. Mas a chance de Leite voltar à disputa interna no PSDB fica cada vez menor, com a mudança de discurso dos principais opositores internos da candidatura oficial no sentido de respeitar a decisão das prévias.
Mas ela também enfrenta dificuldades para unir o partido, por causa da ala ligada aos senadores Renan Calheiros (AL) e Eunício de Oliveira (CE), que pregam abertamente o apoio a Lula já no primeiro turno. O trunfo de Tebet são os apoios que construiu na maioria dos diretórios estaduais do partido, que defendem uma candidatura própria para evitar a debandada emedebista para os palanques de Lula e Bolsonaro.
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