O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, adiou, ontem, o julgamento da ação que trata sobre a demarcação de terras indígenas. A decisão levou à quarta postergação da análise do tema — a discussão estava marcada para o próximo dia 23. A Articulação dos Povo Indígenas do Brasil (Apib) havia convocado uma marcha até Brasília para acompanhar o julgamento.
A questão versa sobre a tese do marco temporal, que prevê que os indígenas só poderiam reivindicar terras onde estavam fisicamente presentes a partir da data da promulgação da Constituição — em 5 de outubro de 1988. Os povos nativos justificam que esse dispositivo significa a retirada do pouco que lhes resta das terras ancestrais, pois o único registro que têm é o da história oral da comunidade.
Caso o Supremo dê ganho de causa aos povos indígenas, a tendência é de mais uma estresse entre os Poderes. A pauta é de interesse do governo de Jair Bolsonaro (PL), que já afirmou não cumpriria a derrubada da tese, caso o STF a rejeitasse. Por trás das afirmações, está o compromisso do presidente da República com setores do agronegócio, interessados em avançar sobre as reservas existentes.
No fim do ano passado, Bolsonaro chegou a chamar o relator da ação no STF, ministro Edson Fachin, de "leninista" por votar contra a tese do marco temporal. Segundo o presidente, a rejeição ao novo dispositivo poderia "inviabilizar o agronegócio brasileiro" e afetar a "segurança alimentar no País".
O STF começou a julgar o marco temporal em 26 de agosto do ano passado. Em 15 de setembro, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista da ação. O placar estava em 1 x 1: Kássio Nunes Marques a favor e Fachin, contra.
"Autorizar, à revelia da Constituição, a perda da posse das terras tradicionais por comunidade indígena, significa o progressivo etnocídio de sua cultura, pela dispersão dos índios integrantes daquele grupo, além de lançar essas pessoas em situação de miserabilidade e aculturação", salientou Fachin em seu voto.
Nunes Marques divergiu e disse que a tese do marco temporal "é a que melhor concilia os interesses em jogo" no tema e que as terras indígenas não podem ser demarcadas com base em "esbulhos ancestrais".
Manifestações
Desde que o julgamento começou, grupos indígenas e a oposição protestam contra o projeto e pela garantia dos direitos das terras em que vivem. Atualmente, há mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas abertos. Mais de 170 povos nativos enviaram cerca de 6 mil representantes a Brasília para acompanhar o julgamento, segundo Articulação dos Povos Indígenas do Brasil a (Apib).
O coordenador jurídico da Apib, Eloy Terena, disse que a decisão de adiar mais uma vez a análise da matéria não desmobiliza o movimento organizado contra o marco. "O julgamento era bastante esperado, porque muitos processos demarcatórios estão pendentes esperando decisão do STF", afirmou.
O artigo 231 da Constituição de 1988 diz que "são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens".
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