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Ação fora da Carta será barrada

Barroso reconhece o momento difícil, mas assegura: sociedade e Congresso estão prontos para garantir direitos constitucionais

Vicente Nunes Correspondente
postado em 28/06/2022 00:01

O presidente Jair Bolsonaro (PL) escalou o advogado-geral da União, Bruno Bianco, para dar a última palavra quando o governo criar benefícios sociais neste ano de eleições gerais. No texto do decreto publicado, ontem, no Diário Oficial da União (DOU), caberá ao jurista a palavra final sobre a legalidade dos atos do Poder Executivo nas áreas eleitoral e financeira, criando um respaldo jurídico a mais contra eventuais medidas que o levem a responder na Justiça por condutas vedadas aos agentes públicos durante ano de eleição.

O comunicado da Secretaria-Geral da Presidência tenta descaracterizar a clara tentativa do presidente de se proteger de eventuais processos que levem à impugnação, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da chapa à reeleição por propaganda antecipada. "No último ano do mandato presidencial, todos os governantes se deparam com as limitações da legislação eleitoral e da legislação financeira. Entre as restrições normativas, encontram-se dispositivos cujos contornos são ambíguos e geram muitas dúvidas na aplicação prática", justifica a secretaria.

O decreto define que passou a valer, desde ontem, que as atribuições do advogado-geral da União envolvem emitir parecer sobre: "I — a constitucionalidade e a legalidade de propostas de atos normativos a ele submetidas; e II — os tópicos em propostas de atos normativos que gerem dúvidas quanto à conformação com as normas de Direito Eleitoral e de Direito Financeiro, no último ano do mandato presidencial".

A ideia é gerar segurança jurídica para que o presidente possa ampliar ou conceder novos benefícios sociais em ano eleitoral, a exemplo do aumento no Auxílio Brasil — que, segundo anúncio de Bolsonaro na semana passada, saltará de R$ 400 para R$ 600 —, do vale-gás e do "voucher caminhoneiro". Este último é, sobretudo, a grande aposta do Palácio do Planalto, que pretende fazer repasses de R$ 1 mil para manter o apoio da categoria, tida como estratégica pela campanha à reeleição. O benefício alcançaria em torno de 700 mil motoristas.

Controvérsia

Antes de incumbir a AGU da elaboração de pareceres nos quais pacotes de benesses poderiam ser baixados sem que fossem enquadrados como irregulares à luz da Lei de Eleições, especialistas vinham apontando os riscos a que Bolsonaro estava sujeito. Doutor em direito pela Universidade de São Paulo (USP), Renato Ribeiro explica que a manobra do governo tem pouca margem de aceitação no meio jurídico, caso seja alvo de contestação na Justiça Eleitoral.

"O Brasil está muito longe de uma situação que poderia se enquadrar na calamidade pública (na qual a criação do pacote de bondades poderia ser enquadrada). A gente não está em uma situação emergencial. Nós temos um custo elevado decorrente de duas situações especiais: política de preços da Petrobras e guerra na Ucrânia. É forçoso o argumento de que isso justificaria uma atividade emergencial por parte do governo federal. É um argumento que não se sustenta", afirmou.

Segundo o advogado Luiz Gustavo, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, "com a alteração, a Advocacia-Geral da União passa a analisar a proposta de edição de atos normativos que versem ou envolvam direito eleitoral e que, antes do secreto, cabia às assessorias jurídicas dos ministérios". Ele observa, ainda, que "tal modificação implica em centralização de tais temas, incluindo análise de constitucionalidade dos referidos normativos, junto à AGU, o que possivelmente guarda relação com as discussões que envolvem a concessão de benefícios ao eleitor em ano eleitoral".

Gustavo argumenta que a criação de benefícios como o "voucher caminhoneiro" são proibidos no ano das eleições, com exceção quando há períodos de emergência no país. Segundo o advogado, para que a proposta do governo não sofresse contestação na Justiça, seria necessário que o benefício guardasse relação com as causas da situação emergencial.

"O que não parece ser o caso, já que o aumento de preços dos combustíveis decorrente de um processo inflacionário não se enquadra no conceito de emergência ou calamidade", completou.

Para o professor de direito constitucional da USP Rubens Beçak, a decisão de Bolsonaro visa centralizar na AGU a função de chancelar as propostas do governo para que não passem desapercebidos eventuais crimes eleitorais. "O temor do presidente é de fazer qualquer coisa que possa ser imputada pela Justiça Eleitoral como criminosa ou indevida, sobretudo quem disputa a reeleição. Como ele domina a máquina pública, a possibilidade de cometer um deslize é muito grande, como a questão do 'voucher caminhoneiro', que teria um fim eleitoreiro ou não", afirmou. (Com Agência Estado)

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