Michelle reforça "guerra santa"

Primeira-dama assume papel de destaque na Marcha para Jesus, em Vitória, e faz discurso na linha da "luta do bem contra o mal". Em convenção nacional, hoje, PL oficializa Bolsonaro como candidato à reeleição

VINICIUS DORIA INGRID SOARES
postado em 24/07/2022 00:01
 (crédito: Vinicius Doria/ CB/ DA Press)
(crédito: Vinicius Doria/ CB/ DA Press)

Vitória e Brasília - Na véspera da convenção nacional que formalizará a candidatura à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) cumpriu, ontem, no Espírito Santo, uma agenda totalmente dedicada à campanha eleitoral. Em Vitória, participou de encontro com políticos e pastores, comandou uma motociata e discursou na Marcha para Jesus, um dos maiores eventos evangélicos do estado capixaba.

A primeira-dama Michelle Bolsonaro assumiu papel de destaque. Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Vitória com o marido, ela tirou selfies com apoiadores e, no fim da programação, discursou em clima de comício no encerramento da marcha evangélica. Chegou a receber mais aplausos que Bolsonaro, mostrando que está pronta para participar de forma mais intensa na campanha, como querem os coordenadores políticos do presidente.

Com discursos recheados de citações bíblicas, o casal palaciano tenta criar um clima de guerra santa contra o principal adversário, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), carimbando a eleição de outubro como uma "luta do bem contra o mal".

Após uma breve oração conduzida por um dos pastores que organizaram a marcha, Michelle "quebrou o protocolo" para se dirigir diretamente ao público — que não chegou a lotar a Praça do Papa, local tradicional de grandes concentrações populares de Vitória.

"Não estamos lutando contra homens e mulheres, estamos lutando contra discípulos do mal", afirmou Michelle ao microfone. "Declaramos que as portas do inferno não prevalecerão", disse em outro trecho do discurso de dois minutos e meio, reforçando o tom religioso que deve manter na campanha do marido.

Jair Bolsonaro, na sequência, sustentou o clima de comoção religiosa, mas incluiu mensagens sobre a pauta de costumes e a luta contra "o comunismo". Sem citar o nome de Lula — a quem se refere como "o outro lado" —, o presidente ressaltou que esta eleição "é uma luta do bem contra o mal" e que, "do outro lado, o que o mal quer é banalizar o aborto, aprovar a ideologia de gênero, liberar as drogas em nosso país".

Antes de se juntar à Marcha para Jesus, Bolsonaro liderou mais uma motociata, uma das maiores de toda a pré-campanha até agora. Os apoiadores saíram do aeroporto em direção a Vila Velha, na Região Metropolitana de Vitória, de onde partiu a marcha evangélica. Fez uma breve parada na Praia da Costa para cumprimentar apoiadores e seguiu para o encerramento da marcha.

Com presença expressiva de pessoas tanto na marcha quanto na motociata — com a tradicional travessia da Terceira Ponte sobre a Baía de Vitória —, o presidente espera reeditar as imagens da onda que fez do Espírito Santo um dos estados mais bolsonaristas do país em 2018. No segundo turno das eleições ao Planalto, ele recebeu 63% dos votos dos capixabas, contra 37% de Fernando Haddad, do PT.

Convenção

A convenção do PL, hoje, deve lotar o Ginásio do Maracanãzinho. O evento vai martelar o 22, número do partido. A abertura dos portões será às 8h22 e o discurso de Bolsonaro está previsto para as 11h22.

O presidente foi aconselhado a manter uma postura mais comedida, sem ataques ao Judiciário e ao sistema eleitoral, mas aliados apontam a personalidade instável do chefe do Executivo, que, no calor do momento, pode retomar seu lado radical, a exemplo do último dia 18, quando, em uma reunião com embaixadores, procurou desacreditar as urnas eletrônicas, sem apresentar provas.

Para especialistas, Bolsonaro deverá seguir um discurso misto, com acenos à base em pautas ideológicas intercalando com realizações positivas do seu governo, como o reajuste do Auxílio Brasil, de R$ 400 para R$ 600, e a redução do preço dos combustíveis.

Paulo Baía, cientista político e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), enfatiza que o principal trunfo de Bolsonaro é a fidelidade do seu eleitor e que, no discurso, ele aproveitará para insuflar os apoiadores. "O lançamento da campanha vai reunir os ativistas mais aguerridos. A convenção será um sucesso, um evento festivo para insuflar a militância e apoiadores, um evento de exercício de canto de guerra, de apologia para uma guerra de rua em busca de voto", avalia. "Com certeza teremos um Bolsonaro estimulando o máximo possível de radicalização na campanha. Bolsonaro será Bolsonaro. Não dá para esperar tom moderado."

A advogada constitucionalista Vera Chemin destaca, porém, que, "a cada vez que Bolsonaro abre a boca para se expressar, é como se estivesse em uma roda de amigos". "O presidente precisa se conscientizar de que exerce a mais alta função pública e adotar uma conduta de autocontenção", afirma. "Uma parcela de juristas e operadores do direito têm reconhecido em suas falas e ações uma lista interminável de crimes comuns, de responsabilidade e de atos de improbidade administrativa que, certamente, renderão "dores de cabeça" a Bolsonaro."

Já o cientista político Cristiano Noronha, da Arko Advice, diz ser preciso observar o posicionamento dos apoiadores. "É necessário ver se, eventualmente, vão colocar faixas com críticas ao STF (Supremo Tribunal Federal) ou não. Se colocarem, pode novamente acarretar em reações desses poderes e manter a temperatura elevada. Em caso contrário, alivia um pouco a pressão", frisa.

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