Entrevista | Felipe d'Ávila | candidato do Novo à Presidência

'O melhor programa social se chama emprego', diz Felipe D’Avila

Cientista político classifica como populista a promessa dos adversários de manter o Auxílio Brasil em R$ 600, sem apontar fontes de recursos. Ele defende a aprovação da reforma tributária para criar vagas de trabalho e diz ser fundamental retomar as privatizações

Candidato à Presidência pelo Novo, Felipe d'Ávila criticou adversários que prometem manter o Auxílio Brasil em R$ 600. "Todos aumentam mais os gastos públicos, e ninguém diz onde vai cortar. Isso se chama demagogia, isso se chama populismo. Se aumentar R$ 600, onde vai cortar?", questionou, em entrevista ao programa CB.Poder, parceria entre o Correio e a TV Brasília. De acordo com o presidenciável, "o melhor programa social se chama emprego".

E para abrir vagas de trabalho, D'Ávila defendeu a aprovação da reforma tributária, que, segundo ele, "vai se traduzir em mais emprego e renda". O candidato afirmou que seu plano, se eleito, é retomar projeto já existente no Congresso que junta cinco tributos em um só: o imposto de valor agregado. "Não foi culpa do Congresso que a reforma tributária não andou, foi culpa do governo. O governo não quis fazer a proposta andar. Apresentou um novo projeto, mal escrito pela Receita Federal, que o ministro da Economia (Paulo Guedes) não leu e criou tumulto na Câmara. Acabou que não aprovamos um projeto que tinha consenso", frisou.

D'Ávila também enfatizou a necessidade de retomar a venda de estatais. "A privatização é fundamental para melhorar a qualidade do serviço público para as pessoas, melhorar a eficiência do Estado", frisou. A seguir, os principais trechos da entrevista.

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Uma das propostas que tramita na Câmara, há séculos, e que, volta e meia, todo governo vem com um projeto novo, é a reforma tributária. O que o senhor pretende fazer nessa área?

Temos duas reformas muito importantes: a tributária e a administrativa. Mas vamos começar pela tributária. Pela primeira vez, nós tínhamos um projeto, que foi a PEC 45 e a 110, na comissão mista, que conseguiu uma coisa inédita no Brasil: o apoio dos 27 estados. Toda reforma tributária morria porque algum estado vetava, porque achava que ia perder a arrecadação. Na política, sempre temos de começar pelas reformas que tenham apoio político, porque ajuda na tramitação do voto. E era uma reforma muito boa, porque buscava a simplificação do sistema tributário. Os cinco impostos em um só, que era o imposto de valor agregado. Meu objetivo é retomar esse projeto. Na verdade, não foi culpa do Congresso que a reforma tributária não andou, foi culpa do governo. O governo não quis fazer a proposta andar, apresentou um novo projeto, mal escrito pela Receita Federal, que o ministro da Economia (Paulo Guedes) não leu e criou tumulto na Câmara. Acabou que não aprovamos um projeto que tinha consenso. Então, nós precisamos, sim, aprovar a reforma tributária. Vamos aprovar o projeto existente no Congresso.

Para aprovar propostas, é preciso ter maioria no Congresso. O Novo tem menos de 2% da Câmara, ou seja, oito parlamentares. Como pretende, se eleito, fazer essa maioria no Congresso capaz de aprovar reformas?

Um projeto, para andar, precisa de três ingredientes: o mínimo de consenso político, o Poder Executivo disposto a comprar a briga para o projeto andar, e, o fundamental, que é o apoio da sociedade. Temos de ter o setor privado pressionando o Congresso para aprovar a reforma. Como nós vamos fazer a abertura unilateral da economia, vai ter um cronograma gradual de abertura, o setor privado vai se mobilizar para pressionar o Congresso, porque, se tivermos o sistema tributário atual com abertura comercial, muita gente vai quebrar. Então, você vai criar um senso de urgência no setor privado. Com um governo colocando pressão para ser votado o projeto, um projeto que já existe um certo consenso político no Congresso, e mais pressão na sociedade, vamos aprovar, como já aprovamos a reforma previdenciária e a reforma trabalhista. Precisamos da combinação desses três itens: força do governo e do Poder Executivo, consenso no Congresso e pressão da sociedade.

O senhor governaria com o Centrão?

Nós vamos construir uma coligação em torno do projeto. E por que vai aprovar? Porque vamos mostrar que isso vai trazer mais investimento, renda e emprego. Nenhum político é contra aumento de investimento, renda e emprego. Vai ficar muito mais fácil. Também é questão de construir uma boa narrativa sobre como isso vai dar voto. Como a boa reforma tributária vai se traduzir em mais emprego e renda.

Outro problema no Congresso é o Orçamento de 2023. Foi para lá sem garantia dos recursos para pagar R$ 600 do Auxílio Brasil. O governo tem dito que pode prorrogar o estado de calamidade, caso o presidente Jair Bolsonaro seja eleito, ou fazer a taxação de lucros e dividendos. Apoia essa proposta de lucros e dividendos?

O primeiro ponto fundamental: não podemos aumentar a carga tributária no Brasil. Nós já somos o 14° país que mais paga imposto no mundo e temos um serviço público de péssima qualidade. Portanto, não podemos aumentar a carga tributária. O que nós temos de fazer? Aprovar a reforma tributária e diminuir o imposto sobre pessoa jurídica, para depois discutir o imposto sobre dividendo. Por quê? O Brasil precisa padronizar sua regra tributária para o restante do mundo. E um dos pilares importantes nesse sentido é o Brasil ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Precisamos ter regras padronizadas para o restante do mundo, e no restante do mundo você taxa mais a renda do que o consumo. Mas o problema desses projetos é que vai votar o aumento de dividendos e manter do jeito que está. Aí, é o pior dos dois mundos. Temos de ter uma estabilização da relação dívida/PIB (Produto Interno Bruto). Avaliação de cada gasto público. O ponto número um é: aprovar a reforma tributária. Ponto dois: reduzir o imposto sobre pessoa jurídica, e, aí sim, aprovar o imposto sobre dividendos.

É favorável ao teto de gastos?

Certamente. O teto de gastos é fundamental. Por duas coisas: primeiro, porque vai mostrar para o mundo e para o Brasil essa estabilização da relação dívida/PIB. Se nós não tivermos essa relação estabilizada, ninguém acredita que o Brasil vai equilibrar o Orçamento em médio prazo. E isso vai fazer pressão sobre a taxa de juros, e os juros são o maior inimigo dos investimentos no país. É fundamental ter essa estabilização da dívida sobre o PIB, e isso é o que o teto de gastos faz.

Manteria o Auxílio Brasil de R$ 600?

Nenhum governo vai manter. A grande diferença da minha candidatura para as demais é que todos aumentam mais gastos públicos, e ninguém diz onde vai cortar. Isso se chama demagogia, isso se chama populismo. Se aumentar R$ 600, onde vai cortar? O que vai ser tirado do Orçamento? É muito importante, hoje, manter, sim, o valor de R$ 400, mas temos de focalizar os programas sociais. O único jeito de reduzir a miséria no Brasil é a focalização dos programas. E o que é a focalização? Você pega o auxílio emergencial: dar R$ 400 para um jovem solteiro, de 20 anos, e para uma mãe de duas crianças, não vai estar resolvendo o problema. Devemos focalizar nos mais pobres, para que o auxílio seja uma ajuda, para que a pessoa saia da condição de miséria. Mas o melhor programa social se chama emprego. E para emprego, a economia precisa de uma retomada.

Todas as empresas devem ser privatizadas ou é preciso ir devagar?

Precisamos acelerar o projeto de privatização. E eu vou falar por quê. A privatização deve ser vista pelas pessoas como aumento da concorrência. Pega qualquer comerciante aqui em Brasília: é o aumento da concorrência que o faz ser o maior comerciante. Esse é o objetivo da privatização. Quando olhamos para o que foi a privatização da telefonia: com a privatização, aumentou a oferta, reduziu o preço. Hoje, todo brasileiro tem um telefone no bolso. A mesma lógica vai funcionar para outras áreas. Vou dar um exemplo do saneamento básico, que é um desastre no Brasil. É um problema do século 19, que não resolvemos no século 21, porque 100 milhões de brasileiros não têm acesso ao esgoto tratado. Agora, finalmente, aprovamos o marco do saneamento e haverá investimento privado, parceria público-privada, concessão ou privatização. E já temos uma meta da universalização do saneamento básico até 2033. Portanto, a privatização é fundamental para melhorar a qualidade do serviço público para as pessoas, melhorar a eficiência do Estado e prestar serviço de melhor qualidade para a população.

Outro desafio que temos pela frente é a educação. A pandemia deixou muito clara a diferença entre o aluno que conseguia acompanhar o ensino de casa e o de escola pública, que sequer tinha acesso às aulas on-line. Como pretende atuar nessa área? Qual é a proposta que tem para a educação?

Focar na educação básica. Nós temos de resolver a questão da educação básica. O Brasil está entre os 10 piores do mundo no Pisa, que é o exame internacional que mensura o conhecimento das crianças, aos 15 anos, em matemática, ciência e línguas. O Brasil está nos últimos lugares, e não é por conta da pandemia, não, isso é de muito tempo. Precisamos colocar o Brasil entre os 20 melhores do mundo. Focar na educação básica. Como vamos fazer isso? Mudar a régua. Nós gastamos muito na educação, mas na máquina da educação, e não no aprendizado do aluno.

Como pretende trabalhar essa distribuição de recursos da educação entre os vários níveis?

Vou focar na educação básica. Se a gente não resolver a educação básica, não vamos conseguir resolver o resto. No fim do governo Lula, 50% das crianças até os 8 anos não estavam devidamente alfabetizadas, e não tinha pandemia. Esse é um problema do sistema educacional brasileiro. No governo Lula, quatro em cada 100 alunos não sabiam o conteúdo devido de matemática no ensino médio, ou seja, a tragédia da educação vem há muito tempo. Porque esse dinheiro público vai para a corporação da educação e não para o aprendizado do aluno. O que vamos fazer é inverter essa lógica. Vamos mensurar se o aluno está aprendendo ou não.

Em relação à saúde, como o senhor vai fazer? Porque a pandemia mostrou a importância do SUS, e a gente vê que, agora, para este Orçamento, foi retirada a obrigatoriedade de os parlamentares aplicarem a maior parte das emendas na área de saúde.

A saúde teve duas boas notícias. A primeira é que todo mundo descobriu a importância do SUS. Digo que o SUS é a maior parceria público-privada do mundo. No SUS, a saúde é pública, mas não é estatal, porque o SUS só funciona por causa dos hospitais filantrópicos, por causa das santas casas. Essa mistura de Estado com sociedade civil organizada faz o SUS funcionar. Precisamos melhorar a coordenação, e isso vamos fazer acabando com essa briga que o presidente da República teve com estados e municípios, vamos voltar a ter essa harmonia para coordenar melhor. A segunda boa notícia que aconteceu durante a pandemia foi o início da digitalização da saúde. Aprovamos a telemedicina, que os médicos eram contra. Precisamos acelerar o projeto de digitalização da saúde. Hoje, o seu exame tem um pedaço num laboratório, um pedaço de que você foi tomar a vacina no SUS, outro no hospital privado. Precisamos ter uma unificação desses bancos de dados para não ter desperdício de exame público, senão você pede cada vez mais exames. Vamos focar na saúde primária, principalmente na saúde preventiva, e essa é a importância do histórico eletrônico. O terceiro ponto é termos uma central única de monitoramento do SUS. Porque, por exemplo, você tem pressa em ter uma consulta com o oftalmologista. Aí, perto da sua casa não tem, mas se você andar dois quilômetros tem vaga. Essa digitalização do atendimento vai dar celeridade. Precisamos fazer com que a saúde sirva ao cidadão, e mensurar o resultado final. Vamos fazer essa mudança de cultura na saúde.

Em 2018, o presidente Jair Bolsonaro levou uma facada. Este ano, tivemos o assassinato do militante do PT que comemorava o aniversário. Ontem, houve um atentado contra Cristina Kirchner. Como analisa essa violência contra os políticos? O que é preciso fazer para que esse cenário não
se agrave?

Isso é reflexo da polarização. Perdemos a civilidade da política, civilidade de entendermos o outro como um adversário, mas não como um inimigo a ser eliminado. Temos divergências de ideia, porém isso não pode ser levado ao ponto de querer eliminar a pessoa. Então, isso mostra que a tensão política só diminuirá com um presidente capaz de pacificar o país. Coisa que será muito difícil com Lula e Bolsonaro.

*Estagiários sob supervisão de Cida Barbosa