novo governo

Entenda a tramitação e o texto protocolado da PEC da Transição

Texto protocolado pela equipe de transição prevê R$ 175 bilhões para o Bolsa Família fora do teto de gastos por quatro anos e exclui das regras fiscais R$ 23 bilhões voltados a investimentos. Estratégia é buscar consenso sobre valores e prazos durante a tramitação

Ingrid Soares
Vinicius Doria
Taísa Medeiros
Victor Correia
postado em 29/11/2022 03:00 / atualizado em 29/11/2022 06:52
De acordo com o relator do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro, o ideal é que o texto seja aprovado até 16 de dezembro -  (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)
De acordo com o relator do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro, o ideal é que o texto seja aprovado até 16 de dezembro - (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)

Com o aval do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do Orçamento de 2023, protocolou, ontem, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição que prevê R$ 198 bilhões fora do teto de gastos. Desse valor, R$ 175 bilhões serão destinados ao pagamento do Bolsa Família de R$ 600 mais um adicional de R$ 150 por criança de até 6 anos.

Pela proposta, as despesas com o programa serão excluídas das regras fiscais por quatro anos, e não mais de forma definitiva, como previa a minuta apresentada há quase duas semanas. O texto também pretende deixar fora do teto R$ 23 bilhões para investimentos públicos. O novo governo, porém, deixa aberta a porta para negociar com o Congresso mudanças em prazos e valores.

Castro explicou que, devido à demora nas negociações da proposta, a busca por consenso ocorrerá durante a tramitação. "Nós combinamos com os líderes que daríamos entrada e, à medida que a PEC for tramitando na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), vamos buscando um texto comum. Na hora que nós chegarmos a esse texto comum, o relator da PEC, então, colocará em votação na CCJ; em seguida, no plenário, e, depois, iria para a Câmara", destacou, ao chegar ao Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede do governo de transição.

"O ideal é que tudo isso seja aprovado antes de 16 de dezembro, que é o prazo final para eu apresentar o meu relatório (do Orçamento) para ser aprovado na comissão e depois no plenário."

Para começar a tramitar, a PEC precisa de 27 assinaturas de senadores, das quais 14 foram alcançadas até a noite de ontem. "O ideal é que até amanhã (hoje) a gente tenha coletado todas as assinaturas. Eu sou o primeiro subscritor, para dar autoria, e depois vamos atrás das outras", disse Castro. O relator do Orçamento enfatizou, ainda, que o texto deve mudar significativamente.

"Dificilmente uma matéria entra no Congresso e sai da mesma maneira que entrou. Claro que nós estamos esperando que essa PEC sofrerá modificações até a gente chegar a um consenso", frisou. A base de Lula acredita que o petista, que esteve ontem no CCBB, pode desatar os nós que travaram a proposta no Senado.

A PEC prevê R$ 175 bilhões para o programa de transferência de renda, "sendo R$ 70 bilhões adicionais ao previsto no projeto de Orçamento encaminhado pelo Poder Executivo", diz o texto protocolado. A peça orçamentária elaborada em agosto pelo governo de Jair Bolsonaro previa R$ 105 bilhões para pagar o benefício no valor R$ 405.

Além disso, a proposta retira do teto de gastos receitas extras correspondentes ao ano anterior, a serem destinadas a investimentos. O montante é limitado a 6,5% do excesso de 2021 — o equivalente a R$ 23 bilhões. Somados aos R$ 175 bilhões do Bolsa Família, o estouro do teto será de R$ 198 bilhões.

Apesar das controvérsias em relação à PEC, há confiança em um consenso. "O mais importante é que a gente tem de ter, até o plenário do Senado, uma convergência com os líderes da Câmara dos Deputados, porque não teríamos tempo pra fazer pingue-pongue. Então, temos de acertar um texto com a maior convergência possível, que seja aprovado no plenário do Senado para que possa também ser aprovado no plenário da Câmara", disse o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (PT-MG).

Para o vice-presidente do PT, deputado federal José Guimarães (PT-CE), a negociação na Câmara está "bem pavimentada". Segundo ele, é necessário, também, encaminhar as discussões sobre o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que aguarda apreciação no Congresso.

Bezerra vê chances com valor abaixo de R$ 150 bi

A negociação desta semana em torno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) vai ficar sob a responsabilidade do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), principal cotado para relatar o texto. Cabe a ele, também, pautar a matéria no colegiado.

O senador Fernando Bezerra (MDB-PE) afirmou ter sugerido aos senadores petistas Humberto Costa (PE) e Jaques Wagner (BA), além do senador eleito Wellington Dias (PI), que o governo de transição tentasse uma composição no Senado tendo com base o texto protocolado pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Pela proposta do tucano, o limite do teto seria elevado em R$ 80 bilhões de forma permanente. "Fui procurado, sim, e passei as minhas impressões", disse Bezerra.

Ele afirmou que vê chances de construção de um entendimento com valor abaixo de R$ 150 bilhões. O número é considerado pelos negociadores "neutro" do ponto vista fiscal, ou seja, que mantém as despesas em 2023 em patamar próximo ao que o presidente Jair Bolsonaro (PL) deve deixar ao fim deste ano. Para Bezerra, a proposta de Jereissati está bem construída, mas é cedo para falar em valor final.

Ex-líder do governo Bolsonaro e negociador de diversas PECs fiscais, o senador emedebista disse que a maior dificuldade nas negociações é a definição do prazo de vigência da proposta. "Quem vai ter um papel decisivo é o Davi, que é o relator."

Tramitação é longa, mas prazos podem ser encurtados

O regimento interno do Senado prevê que propostas de emenda à Constituição (PECs) necessitam ser assinadas por 1/3 dos senadores — 27. Só então, é feita uma leitura protocolar no plenário da Casa e o texto é automaticamente despachado para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde pode ser colocado em votação após cinco dias. Lá, cabe ao presidente do colegiado definir quando acontecerá a apreciação. A regra determina que isso ocorra em um prazo de até 30 dias.

A norma interna do Senado destaca que, após a análise no colegiado, a PEC segue para o plenário, onde passa por cinco sessões de discussão, e então está pronta para a votação em primeiro turno. Até o segundo turno, são cinco dias úteis de intervalo e mais três sessões de debate. Para ser aprovada, precisa do aval de 49 dos 81 senadores nos dois turnos.

Como é fruto de negociações, contudo, todos esses prazos estão sendo desconsiderados tanto pelo PT quanto por lideranças na Casa. A expectativa é que, tão logo atinja as assinaturas previstas, a PEC seja lida no plenário e despachada para a CCJ. Até lá, espera-se já haver um acordo com o presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), para pautar prontamente o texto.

Contudo, sem esse pacto ainda acertado, bem como em torno dos termos finais do texto, a previsão inicial de votar a PEC na CCJ e no plenário amanhã está praticamente descartada.

Saiba mais

Redução do valor

A estratégia acertada pela equipe de transição com o senador Marcelo Castro é negociar a PEC durante a tramitação no Senado para um patamar de R$ 150 bilhões em despesas fora do teto, mas há pressão no Congresso para reduzir esse valor ainda mais.

Para o coordenador do Observatório Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas, Manoel Pires, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva está pedindo "bastante" ao Parlamento. "De certa forma, vai abrir um espaço fiscal grande nos próximos anos e tirar um pouco o poder do Congresso na definição do Orçamento, no sentido de que o governo não vai mais recorrer aos parlamentares o tempo inteiro para fazer uma PEC sempre que ele precisar fazer uma mudança orçamentária", argumentou Pires.

Para ele, as negociações deverão chegar a um valor em torno de R$ 130 bilhões, o que seria suficiente para ter um Orçamento "direito", mantendo a despesa primária constante em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) ou com ligeira queda, o que ajudaria na política de juros do Banco Central.

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