Jornal Correio Braziliense

democracia sob ataque

Governo Lula faz mudanças nas chefias da PRF e da PF

Adesão de agentes das duas polícias ao bolsonarismo nos últimos anos motivou o governo a destituir praticamente toda a cúpula das corporações nos estados

Um dos superintendentes dispensados é Virgílio de Paula Tourinho, que chefiava a corporação na Bahia. Ele chegou a ser intimado pela Justiça Eleitoral para prestar explicações sobre a operação policial feita no segundo turno. Outro que perdeu o cargo foi Alexandre Carlos de Souza e Silva, do Rio de Janeiro, pelo mesmo motivo. Na ocasião, usuários das redes sociais divulgaram vídeos da operação na Ponte Rio-Niterói.

Ainda não foram apontados os substitutos, pois a progressão de cargos na PRF não é atrelada ao tempo de carreira ou outras condições. A escolha passa pelo diretor-geral, Antônio Fernando Souza Oliveira, nomeado no dia 2 em substituição a Silvinei Vasques, bolsonarista declarado.

Vasques foi alvo do Ministério Público Federal (MPF) por suspeita de favorecimento aos bolsonaristas que ocuparam as rodovias após o segundo turno. O órgão requereu o afastamento do policial rodoviário.

Na PF, entre os 18 que assumem cargos de chefia está Leandro Almada da Costa. Ele comandará a unidade do Rio de Janeiro, que estava no centro da acusação de tentativa de interferência de Bolsonaro na corporação, feita pelo agora senador eleito Sérgio Moro (União Brasil-PR). O novo diretor da PF foi o responsável pelo inquérito que apura tentativa de obstrução da investigação dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. A apuração levou ao policial militar Rodrigo Ferreira, o Ferreirinha, e à advogada Camila Nogueira. Ambos eram parte de uma organização criminosa que tentava atrapalhar os trabalhos de elucidação do crime. Leandro substitui Ivo Roberto Costa da Silva.

Em São Paulo, Rogério Giampaoli substitui Rodrigo Bartolamei, indicado por Bolsonaro. Na Paraíba, a escolhida foi Christiane Correa Machado, que comandou a Coordenação de Inquéritos Especiais (Cinq), voltada para casos que envolvem pessoas com foro especial nas cortes superiores. Ela foi uma das envolvidas na investigação das acusações de Moro contra Bolsonaro. No total, nove mulheres foram nomeadas diretoras-gerais da PF.

Lula já havia antecipado a troca no DF, após os estragos de 8 de janeiro. Flávio Dino, ministro da Justiça e Segurança Pública, minimizou as trocas, afirmando que a mudança geral já estava programada. No lugar de Victor Cesar Carvalho dos Santos, entrou Cézar Luiz Busto de Souza.

No caso da PF, a progressão da carreira é mais condicionada. Pela portaria de 2018, só eram promovidos a diretor-geral delegados da classe especial, com mais de 10 anos de serviço e que tivessem passagem de, pelo menos, um ano em cargo de direção e assessoramento superior — de DAS 101.3 para cima.

Dino reduziu os requisitos e, agora, o delegado precisa apenas ser da classe especial para concorrer à indicação para a diretoria à corregedoria do órgão.

Punição

Segundo Leonardo Dickinson, integrante da Comissão de Direito Militar da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ), se ficar comprovada omissão ou conivência dos agentes da PF ou da PRF com atos antidemocráticos, eles podem ser responsabilizados criminalmente.

"Eles responderão na mesma proporção de eventuais causas criminais, porém, com incidência de causa de aumento, uma vez que se tratam de agentes de segurança pública e detêm uma função específica de agentes de garantia", explica. "Um agente garantidor tem como principal objetivo repelir ou prevenir a prática de crimes. Razão pela qual, quando o agente trai as suas funções naturais ou constitucionalmente previstas enquanto membro da segurança pública, ele responde em grau superior aos demais."

O especialista em direito penal e militar aponta que não há vedação legal específica para "partidarismos" nas forças de segurança, no entanto, aponta a necessidade de isenção desses atores durante o exercício da função.

"Não é razoável que se tenha tamanha confusão entre aquilo que esse agente acredita com a sua função profissional. Diante dessa avaliação, é preciso averiguar se existe algum tipo de previsão específica em regimentos internos, seja da Polícia Civil, seja da PRF ou da PF, em relação à responsabilização desses eventuais agentes que fazem confusão entre ideologia e função pública, que são coisas distintas", observa.