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Medicamento aprovado nos EUA para a doença de Alzheimer deve ser avaliado com cautela

Os resultados clínicos foram muito discretos e apenas com as doses altas. Muito ainda será discutido sobre o custo-benefício da medicação, já que em altas doses ela teve associação com inchaço e hemorragia cerebral em 40% dos pacientes testados

Um dos principais marcadores da doença de Alzheimer é o acúmulo no cérebro de uma substância proteica chamada beta-amiloide, substância também encontrada no cérebro de idosos saudáveis, porém em pequenas quantidades. Esse acúmulo excessivo de proteínas no cérebro, que é geneticamente determinado, faz com que, aos poucos, ele vá ficando ineficiente. Os medicamentos atualmente aprovados para o tratamento da doença não mudam a história natural da doença, apenas melhoram os sintomas. O grande sonho é encontrar uma estratégia eficiente que reduza o acúmulo dessas proteínas no cérebro. Entretanto, uma série enorme de estudos nos mostram que a simples redução desses depósitos proteicos não garante um impacto clínico positivo.

Os anticorpos monoclonais, medicações amplamente usadas em inúmeras condições clínicas, têm sido testados há muitos anos para o tratamento da doença de Alzheimer, mas sem resultados muito animadores. Um desses anticorpos, o Aducanumab, foi aprovado pelo órgão regulador americano de medicamentos (FDA) este mês, mas com muitas críticas.

O Aducanumab se mostrou eficiente na redução do acúmulo das placas de beta-amiloide no cérebro, mas as evidências clínicas não foram muito convincentes, nem mesmo para o comitê consultor independente do FDA. Três membros desse comitê pediram afastamento, após a aprovação, como protesto. A desconfiança é a mesma com inúmeros especialistas ao redor do mundo. A aprovação foi feita, mas com a condição de que um estudo com resultados mais robustos seja realizado o mais breve possível e, se os resultados não forem clinicamente positivos, a liberação pode ser cancelada. A agência é criticada por não ter retirado de circulação algumas drogas para o tratamento do câncer em que os respectivos fabricantes ficaram de conduzir um estudo complementar e não o fizeram. E com as medicações no mercado, quem se habilitaria a receber placebo em testes clínicos?

Os resultados clínicos foram muito discretos e apenas com as doses altas. Muito ainda será discutido sobre o custo-benefício da medicação, já que em altas doses ela teve associação com inchaço e hemorragia cerebral em 40% dos pacientes testados. Dos dois estudos realizados, um deles não mostrou eficácia clínica nem mesmo em doses altas.

A aprovação foi feita dentro de um programa do FDA chamado aprovação acelerada, que libera precocemente terapias potencialmente valiosas a pacientes com doenças graves, mesmo sem a demonstração inequívoca do real benefício.

É claro que o lobby da indústria farmacêutica move montanhas. As ações da fabricante subiram 38% no dia da aprovação e o custo do tratamento com Aducanumab é de 56 mil dólares por ano. Efeitos clínicos discretos já foram demonstrados com suplemento de curcumina por 18 meses, inclusive acompanhados de redução nos depósitos de amiloide. Que tal então, por enquanto, usar mais curry na sua cozinha?

*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e diretor clínico do Instituto do Cérebro de Brasília