Saúde

Sem foco: fique atento aos sinais do transtorno de defit de atenção

Nem sempre diagnosticado na infância, o TDAH pode trazer sérias consequências na vida adulta, inclusive depressão. Entenda o transtorno e saiba como tratá-lo

O transtorno de deficit de atenção com hiperatividade, o TDAH, é uma alteração no funcionamento neural. Ele surge ainda na infância, mas o diagnóstico nem sempre ocorre tão cedo. Durante a pandemia, ao acompanharem mais de perto as crianças, muitos pais notaram alguns hábitos e dificuldades dos filhos que são indícios da doença, mas é preciso uma avaliação multidisciplinar para fechar o diagnóstico.

De acordo com Alessandra Araújo, psicóloga clínica da Clínica Via Vitae, o desenvolvimento do TDAH está associado a fatores hereditários, pois está ligado ao funcionamento cerebral. Ela explica que existem grandes diferenças na região do hemisfério direito, no córtex pré-frontal, corpo caloso e cerebelo das pessoas que têm TDAH.

Muita gente só descobre que tem o transtorno quando chega à vida adulta. Nessa fase, entre outros sintomas, ela passa a ser disfuncional, ter comprometimento nas vivências, atrapalhando as suas relações. “Muitas vezes, um quadro de ansiedade é reflexo desse TDAH não tratado no momento certo da vida do sujeito”, explica Alessandra.

Os sintomas mais comuns de uma pessoa com transtorno de deficit de atenção com hiperatividade são padrões comportamentais de desatenção, distração com facilidade, falta de concentração, foco em diversos estímulos ao mesmo tempo e inquietação — não consegue ficar quieta por um tempo mais prolongado. Além disso, irritabilidade e pouca resistência a frustrações são sinais que surgem ainda na primeira infância e podem demonstrar que essa criança está precisando de cuidados.

Alessandra destaca que, por mais que um indivíduo com TDAH se esforce para conseguir focar e aprender, ele não consegue, de modo natural, obter essa aprendizagem, porque se trata de uma disfunção neurobiológica. Portanto, é muito importante que familiares e professores fiquem atentos quanto ao comportamento das crianças quando estão no processo de aprendizagem.

Muitos são tachados de burros, desinteressados e preguiçosos e, se as crianças internalizam aquilo que é falado, elas crescerão sendo adultos de baixa autoestima e ansiosos. Por mais que se esforcem, não alcançarão a perfeição que, muitas vezes, é exigida deles. “Ser empático no processo de dificuldade do outro dá ao sujeito a oportunidade de, no seu diferente, ser tão bom quanto quem não tem transtorno.”

O que é?

O TDAH é um transtorno neurobiológico de origem genética que surge na infância e pode perdurar a vida inteira.

Sintomas

- Dificuldade em manter a concentração em uma atividade
- Excitação e raiva diante de uma atividade que requer parar para resolvê-la
- Agressividade
- Dificuldade em reter novas informações
- Inquietação
- Esquecimentos constantes

Diagnóstico

Só se fecha um diagnóstico mediante uma avaliação com equipe multidisciplinar e testes neuropsicológicos, para que se tenha uma avaliação mais concisa e fidedigna.

Grupos de risco

Crianças são mais propensas a desenvolver o transtorno, mas o diagnóstico costuma vir apenas na adolescência ou na fase adulta da vida.

Por que há uma impressão que os casos aumentaram durante a pandemia?

Os especialistas explicam que a nova realidade (estudo e trabalho em casa) exigiu que a escola viesse para dentro de casa. Logo, os pais associaram a função do home office à do home schooling e tiveram essa proximidade no processo de aprendizagem dos filhos. A partir disso, perceberam que algumas atividades a serem realizadas geraram mais dificuldade do que o normal no processo ensino aprendizagem.

Causas

Estudos comprovam que as causas são hereditárias por terem genes que predispõem o sujeito a ter TDAH. Alguns estudos mostram que substâncias ingeridas na gravidez, como álcool e nicotina, também podem causar alterações no cérebro do bebê. Além disso, o sofrimento uterino do bebê na hora do parto.

Tratamentos

O principal tratamento é psicoterapia, terapia ocupacional e medicamentos. Quando a criança, o adolescente ou o adulto começa a entender como ele funciona na resolução dos problemas e aprendizagem, a qualidade de vida melhora. Os sintomas, que antes traziam desconforto e sofrimento, podem diminuir e até desaparecer, o que traz melhoria nas relações sociais e consigo mesmo.

Palavra do especialista

Houve, de fato, um aumento de diagnósticos de TDAH em crianças de até 12 anos durante a pandemia?
Existe a possibilidade de maior queixa dos pais em perceber seus filhos mais agitados ou desatentos, mas é importante ressaltar que, neste período, o cuidado para a definição do diagnóstico é delicado devido à situação pandêmica que vivemos. O próprio confinamento e a redução da interação escolar podem influenciar o padrão de atenção e hiperatividade da criança, que não se configure, necessariamente, um diagnóstico de TDAH. Por isso, a importância deste diagnóstico ser realizado por profissionais que atuam na saúde psíquica da criança, como o neuropediatra, o psicólogo da infância e o psiquiatra da infância.

Quais são os sinais que os pais devem ficar atentos e que indicam TDAH?
Os principais sinais da desatenção são: período de atenção curto e sendo facilmente distraído; comete erros e descuidados com frequência; sempre perde algo; pouca capacidade para realizar tarefas que são tediosas ou demoradas, parecendo incapaz de ouvir ou seguir as instruções; realiza atividades ou tarefas, mas muda constantemente; e, por fim, dificuldades em organizar tarefas.
Os sintomas de hiperatividade são: incapacidade de ficar parado, especialmente em ambientes silenciosos ou calmos; inquietação constante; dificuldade em se concentrar nas tarefas; movimentos físicos em excesso; dificuldade em esperar sua vez em filas ou atividades; comportamento impulsivo, em que age sem pensar; interrompe as conversas dos outros; e, por fim, pouca ou nenhuma sensação de perigo.

Qual a importância de não se taxar o TDAH como uma “frescura” de criança? Como a falta de tratamento pode atrapalhar a infância, adolescência e a vida adulta?
Estudos mostram que o não tratamento do TDAH pode levar a maior índice de acidentes de trânsito, quedas em ambientes de trabalho e demissões. Além disso, pessoas com o transtorno têm riscos aumentados na fase de adolescência e vida adulta para utilizar álcool, cigarro ou até substâncias ilícitas. Reduzir o estigma, sem dúvida, auxiliará na procura e na aceitação do tratamento, reduzindo essas possibilidades e desfechos psicológicos, já que pacientes com TDAH, ao se perceberem com mais dificuldades de concentração e atenção, podem desenvolver personalidades inseguras, ansiosas ou deprimidas.

Luan Diego Marques é médico psiquiatra do Hospital Universitário de Brasília (UnB) e professor universitário do Centro Unieuro.


*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte