Especial

Natal de reencontros: famílias voltam a se reunir para celebrar

Depois de quase dois anos de reclusão, as famílias brasilienses, finalmente, podem organizar os encontros para celebrar o Natal

Foram quase dois anos de reclusão. Em 2020, celebrações on-line, ligações telefônicas e ceias só entre pessoas que dividiam a mesma casa substituíram os abraços e trocas de presentes nas comemorações de Natal e ano-novo das casas de muitas famílias brasileiras. Mas, com o avanço da vacinação, a chegada dos últimos dias de 2021 traz consigo a alta expectativa pelo retorno dos encontros familiares para celebrar as festividades, principalmente o Natal.

Antes da pandemia, o jantar farto de 24 de dezembro era tradição para a família da advogada Fernanda Mara Henriques Gomes Cortez Toledo, 39 anos. Ela conta que a celebração tinha início com a chegada dos parentes que moram em outros estados, na véspera de Natal, e se estendia até o ano-novo, com todos reunidos na casa de seu pai, no Sudoeste. Entre tios, tias, primos e primas, avós, avôs e agregados da família, cerca de 20 pessoas se reuniam todo ano na data.

No entanto, a festa em família não aconteceu no ano passado. "Surgiu uma nova onda (do coronavírus) e todos se recolheram, com medo. Eu não saí de casa para nada, nem meu marido. Mas ele precisou ir trabalhar no hospital, local em que contraiu a covid-19 e trouxe a doença para casa. Nós passamos muito mal. Não conseguimos ver ninguém. Foi um natal perdido, bem triste", recorda Fernanda. "Eu dou muito valor à minha família, sempre passo as festas com eles e tento aproveitar esses momentos lado a lado, então foi bem difícil", completa.

A advogada conta, ainda, que o pai tem cerca de 10 comorbidades e ficou preocupado com uma possível contaminação. Por isso, a família distante também não compareceu à capital para a celebração do último ano. "Eu testei positivo até fevereiro e, mesmo que já não estivesse contaminado, esperei dar negativo para ter qualquer tipo de contato com minha família. Mas, durante todo esse tempo, ainda evito contato direto com meu pai. Passamos a conversar através de um vidro, sem se abraçar ou se tocar", diz.

Apesar de se verem, Fernanda ressalta que a falta de contato faz falta. Recentemente, seu pai precisou amputar o pé, em decorrência da diabetes. "Eu e ele sempre fomos muito próximos, então tem sido difícil não poder abraçar, durante tudo isso que está vivendo", lamenta.

Agora, a advogada explica que aguarda pelo momento em que vai poder abraçá-lo novamente. E pretende fazer isso neste Natal. Isso porque, neste ano, a confraternização com toda a família reunida vai voltar a acontecer. "A celebração será grande. Já estão todos vacinados, vem muita gente, alguns para o Natal, outros para o ano-novo. Meu pai está animado, assim como todos nós", reitera.

Para poder abraçar o patriarca, Fernanda diz que ela e o esposo farão um exame da covid-19. "Eu vou fazer o teste cerca de dois dias antes e permanecer em casa para não correr qualquer tipo de risco e poder dar aquele abraço apertado, seja na cadeira, na rede, onde for. Esse, definitivamente, vai ser o meu presente do ano."

Farra em família

Arquivo Pessoal - 15/12/2021. Crédito: Arquivo Pessoal. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Reencontros de Natal. Para a aposentada Maria Teresa Vieira Tosi, 59, o último Natal também foi diferenciado. Mãe de três, ela conta que precisou passar a festividade afastada dos filhos e que, neste ano, vai aproveitar o avanço da vacinação para se reunir com a família toda. Na foto, Maria com os filhos e o marido em uma das reuniões de família que aconteceu em 2019, ano antes da pandemia.

Para a aposentada Maria Teresa Vieira Tosi, 59 anos, o último Natal deixou um vazio. Mãe de três, ela conta que precisou passar a festividade afastada dos filhos e, este ano, vai aproveitar o avanço da vacinação para se reunir com a família toda. "Eu tenho três filhos, uma mora em Brasília, e os outros dois em São Paulo e Belo Horizonte, então não nos encontramos. Foi muito ruim, fizemos uma videochamada, ficamos conversando, o que fez com que o coração aquecesse um pouquinho", diz.

Depois da festividade, Maria conta que chegou a se encontrar com os filhos que moram em outros estados, mas, até então, a família não estava completa nas reuniões. "Eu e meu marido fomos os primeiros a tomar a vacina e estivemos com os filhos separadamente, mas essa é a primeira vez que eles vão se reunir. Montamos toda uma programação para este momento."

Para este ano, a família decidiu alugar uma casa a 70 quilômetros de Belo Horizonte. "Vamos passar uma semana juntos, aproveitando o recesso de Natal. Nós temos uma família grande, mas optamos em fazer este momento apenas com os filhos para não aglomerar muitas pessoas. Vamos poder matar a saudade desse abraço coletivo", explica a aposentada.

Para Maria, o último ano serviu como aprendizado. "Entendemos ainda mais a importância das pessoas e como precisamos desapegar de certas coisas. Agora, estamos focados em estar juntos, conversando, falando sobre o que foi vivenciado por cada um, do que se presentear. Combinamos de ser um momento de papo, conversa, resgate do carinho, amor", completa.

Saudade acumulada

Arquivo pessoal - Mayara (blusa laranja) recorda a reunião do último Natal em família, que aconteceu em 2020: na contagem regressiva para rever, este ano, os avós

A microempreendedora Mayara Nogueira, 29 anos, aproveitará o fim de ano para matar a saudade da família que mora longe. Com os avós morando em Minas Gerais, a família costuma visitá-los uma vez ao ano, sempre no réveillon. Porém, com a pandemia, a visita precisou ser adiada e, já vai completar três anos que eles não se reúnem. Agora, com todos vacinados, Mayara conta que pretende aproveitar o momento. "É muito importante, porque, além de serem meus avós, meu filho vai poder estreitar o laço com os bisavós, algo que poucos têm a oportunidade", diz.

Para a microempreendedora, os últimos dois anos foram ruins. "O distanciamento é ainda maior porque moram em outro estado. Então, é algo mais difícil de lidar; às vezes, ficamos preocupados sem saber se estão bem mesmo. Estou bem feliz de saber que vou conseguir vê-los, porque fazem muita falta. Desde a chegada da pandemia, foi difícil ficar longe.

"Mas, de acordo com Mayara, o momento ainda será difícil. Isso porque acredita que, ao vê-los, não será possível correr para um abraço. "A vontade é correr para dar aquele abraço apertado, mas como vamos viajar, ter contato com outras pessoas, precisamos manter as regras de segurança. Então vou abraçar, mas depois de um banho bem tomado", garante.

Para ela, a alegria de poder viver este momento próximo dos avós é grande, apesar da pandemia. "Não estamos livres, mas sabemos que estamos todos bem e que vamos celebrar a saúde, a vida e aproveitar aquele momento com todos. Infelizmente, a pandemia mostrou que a falta de convívio faz com que os anos passem muito rápido. Então, é importante aproveitar cada momento e situação, é o principal, a família, a união, o carinho e o amor", completa.

Reencontros de amigos

Arquivo pessoal - A empresária Letícia Coutinho se reuniu com as funcionárias para confraternizar depois de dois anos: todas vacinadas

Assim como as reuniões familiares, o amigo secreto entre amigos, o happy hour nos barzinhos e os churrascos no clube estão de volta. Em Brasília, a contagem regressiva para o fim de ano fez com que restaurantes e bares ficassem lotados. Isso porque o último ano também foi de afastamento entre amigos e colegas de trabalho, devido ao isolamento social, e alguns optaram por aguardar o avanço da vacinação para curtir as confraternizações de fim de ano. Agora, é a oportunidade que muitos encontraram para viverem esses momentos.

A empresária Letícia Coutinho, 33, é sócia e proprietária da loja SOS Makeup e conta que se reuniu com os colaboradores da empresa para celebrar o fim do ano. “Como a loja tem três anos, a gente conseguiu fazer uma confraternização, que foi de 2018 para 2019. Em 2019, não fizemos por causa do início da pandemia. Estava tudo aberto, mas não fizemos por vários motivos. Um deles é que os lugares que a gente escolhia dava medo de gerar aglomeração”, diz.

Agora, com tudo mais tranquilo, e a vacinação avançada, Letícia diz que decidiu fazer a confraternização. “Nós nos permitimos fazer uma festinha para celebrar os três anos da loja e foi bom, porque conseguimos passar pela pandemia. Escolhemos um barzinho na Asa Norte, no dia em que estaria mais vazio, e fomos para lá. Comemoramos estar com a empresa de pé e de manter os funcionários”, diz.
Todas as funcionárias já se vacinaram e aguardam a dose de reforço. “O clima da confraternização foi muito bom. Foi gostoso, aconchegante, conseguimos conversar, dar risada. Preferimos dessa forma do que algo maior. Dá para conversar, ficar mais cara a cara.”

Impacto psicológico

A psicóloga e professora do Centro Universitário Iesb Caroline Salles explica a importância das celebrações nestes tempos de pandemia. De acordo com a especialista, as festas, geralmente, apontam para um momento de encerramento de ciclo, e isso ajuda o ser humano a avaliar o que se passou. “É nesse momento em que precisamos descansar, muitas vezes, da sobrecarga, do estresse. E, além de descansar, precisamos nos reconectar com o que é importante, buscando desenvolver as nossas faculdades intelectuais mais superiores do pensamento, da reflexão, para que possamos estar mais presentes, e ver o que funcionou ou não, para planejar o futuro”, ensina.

Além disso, as festas promovem momentos simbólicos, principalmente aquelas em família. “É um momento de encontro, de prazer, relaxamento, que são funções sociais e simbólicas muito importantes para que a gente possa viver emoções positivas e saudáveis”, explica. Segundo Carolina, é na família que se aprende os valores mais básicos e encontramos as maiores referências de vida. “A gente compartilha histórias, momentos, identidades. E isso é importante para que tenhamos um senso de pertencimento”, reitera.

Para as reuniões familiares, Caroline dá a dica: “Vamos valorizar as possibilidades que temos neste momento, dentro do que a realidade está permitindo”, ressalta. “Que a gente cultive a esperança. Isso não significa que devemos cultivar fantasias que estejam desconectadas da realidade da vida. Mas, sim, desenvolver e reforçar pensamentos, emoções e crenças que nos conectem com nossa capacidade mais humana, e que envolve a possibilidade de sonhar e de acreditar.”

Nada de relaxar

Para o infectologista Leandro Machado, os cuidados para evitar contaminação pelo coronavírus devem continuar os mesmos. “As pessoas precisam entender que ainda temos um vírus, não estamos livres. Os dados mostram que a ômicron não causa infecção grave, mas ainda é cedo”, justifica. O médico reforça que é importante, neste final de ano, que as pessoas optem por lugares arejados, com distanciamento mínimo, uso de máscaras e a garantia, dentro do possível, de que os convidados tenham tomado a vacina. “Eu sou contra impedir que os indivíduos deixem de fazer algo por conta da vacinação, é uma perda de liberdade. Mas é importante que as pessoas conversem usando máscaras e distantes. Se tiver bufê, use máscara para pegar a comida. São cuidados básicos que já fazem parte do dia a dia.”

 

Arquivo pessoal - A empresária Letícia Coutinho se reuniu com as funcionárias para confraternizar depois de dois anos: todas vacinadas
Arquivo pessoal - Mayara (blusa laranja) recorda a reunião do último Natal em família, que aconteceu em 2020: na contagem regressiva para rever, este ano, os avós
Arquivo Pessoal - 15/12/2021. Crédito: Arquivo Pessoal. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Reencontros de Natal. Para a aposentada Maria Teresa Vieira Tosi, 59, o último Natal também foi diferenciado. Mãe de três, ela conta que precisou passar a festividade afastada dos filhos e que, neste ano, vai aproveitar o avanço da vacinação para se reunir com a família toda. Na foto, Maria com os filhos e o marido em uma das reuniões de família que aconteceu em 2019, ano antes da pandemia.