Neurônios em dia

Novas pistas que explicam como a covid-19 afeta o cérebro

Já temos evidências de inchaço e inflamação do cérebro em alguns pacientes e tivemos também a demonstração de lesões na bainha de mielina bem semelhantes às que são encontradas em doenças neurodegenerativas, como esclerose múltipla

Dr. Ricardo Teixeira*
postado em 10/02/2022 17:23 / atualizado em 10/02/2022 17:23
 (crédito: Pixabay/Reprodução)
(crédito: Pixabay/Reprodução)

No início da pandemia, os holofotes eram todos voltados ao sistema respiratório e circulatório. Aos poucos, os transtornos provocados pelo vírus sobre o sistema nervoso começaram a ser identificados. Os problemas incluem desde a redução do olfato, dificuldades de memória e dores de cabeça até derrames cerebrais, encefalite, estados de confusão mental e psicose. Isso sem falar dos efeitos das mudanças psicossociais do fenômeno pandemia, como depressão, ansiedade e estresse pós-traumático.

Como isso tudo acontece no cérebro? Já temos evidências de inchaço e inflamação do cérebro em alguns pacientes e tivemos também a demonstração de lesões na bainha de mielina bem semelhantes às que são encontradas em doenças neurodegenerativas, como esclerose múltipla. Sabemos que o SARS-CoV-2 pode, sim, invadir o cérebro, mas as séries neuropatológicas apontam que a identificação do vírus no cérebro não é tão significativa quanto em outros órgãos. Entretanto, novas mutações podem ter um comportamento diferente.

Um achado muito relevante foi revelado este ano entre pacientes ambulatoriais com declínio cognitivo após a infecção, condição que conhecida por brain fog. Dez meses após os primeiros sintomas da covid-19, a análise do líquor mostrou alterações muito sugestivas de um processo inflamatório autoimune, em que o sistema de defesa do indivíduo ataca o próprio sistema nervoso central. O estudo foi conduzido por pesquisadores da Universidade da Califórnia nos EUA e publicado pelo periódico Annals of Clinical and Translational Neurology.

Não é definitivo devido à pequena amostragem, mas aponta para uma possível e fértil avenida terapêutica. E a Cell, periódico do grupo Nature, acaba de publicar evidências de que o vírus, mesmo sem conseguir penetrar em células nervosas do nosso olfato, promove um processo inflamatório que promove alterações da arquitetura do núcleo dessas células, tornando-as disfuncionais. Isso pode explicar inúmeros sintomas da chamada covid longa.

*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e diretor clínico do Instituto do Cérebro de Brasília

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