O limite da inconsequência é transformado em uma comédia de boas piadas. Este é o princípio do longa Não vai dar nada, de Guel Arraes e Jorge Furtado. O filme conta a história de Kelson (Cauê Campos), um jovem envolvido em um esquema de furto de carros para revenda. O rapaz quer ter dinheiro para trocar de moto e se envolve em uma série de esquemas criminosos, gerando uma confusão generalizada na vida dele e na das pessoas que estão em volta.
O filme é cheio de núcleos, com cenas de ação com perseguições de moto, passando por um lado crítico forte, que ironiza a situação do país atual, chegando a piadas de humor pastelão. Um dos destaques é a a narrativa que envolve Fernando (Rafael Infante) e Suzy (Katiuscia Canoro). Os dois comandam o esquema dos carros, sendo Suzy a estrategista responsável por pensar os roubos e Fernando o cara que reforma os carros para a venda. Os dois, somados a Kelson, dominam as cenas em que estão envolvidos.
Porém, o longa é mais feito de roteiro do que de atuações. As piadas são muito bem colocadas, os atores apenas aproveitam as ideias bem escritas e encaixam no tempo certo. A graça passa, principalmente, pela ironia de o filme tratar de uma forma leve o mundo do crime, tendo um personagem principal moralmente duvidoso, mas que, na base do carisma e de uma oratória confusa e muito persuasiva, consegue convencer qualquer pessoa a fazer o que ele quer.
Não vai dar nada gira em torno do próprio título, apresenta uma realidade fictícia de pessoas que agem sem pensar que podem sofrer as consequências dos seus atos. A bola de neve em que elas vão se envolvendo é previsível desde o início do filme e isso tem um trabalho cômico extremamente importante para a produção, já que mantém o espectador o tempo todo atento para como aqueles personagens serão capazes de resolver as roubadas em que se meteram.
O longa vai, de forma leve, carregando o público como em um dos discursos mais detalhados de Kelson. Entre uma piada boa e outra, dá até para se deparar com uma atuação não tão boa, certas limitações no formato ou alguns discursos prontos ditos para justificar escolhas. Entretanto, é tudo tão divertido, que nada marca negativamente o filme.
A produção original da Paramount é um acerto ao entregar algo que é engraçado sem necessariamente ser escrachado ou apelativo. O longa usa comédia física, piadas e até jogos de câmera para fazer o público rir e tem em um roteiro inteligente e bem estruturado, de forma a trazer leveza para um contexto que dificilmente é tratado no cinema brasileiro sem um excesso de punitivismo. O crime é motivo de risada, sem abrir mão de criticar a forma como o sistema opera. Afinal, não é necessário que todo problema do Brasil seja resolvido na bala — às vezes, um bom discurso já é meio caminho andado.
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