Encontro com o chef

Doces que curam: gastronomia ajuda confeiteira contra depressão

Brasiliense encontra na gastronomia uma forma de enfrentar a depressão e se torna confeiteira de sucesso

Sibele Negromonte
postado em 12/06/2022 07:15
 (crédito: Fotos: Ed Alves/CB)
(crédito: Fotos: Ed Alves/CB)

Karla Sousa costuma dizer que a gastronomia, literalmente, salvou a sua vida. Aos 17 anos, a jovem estava na academia se exercitando quando teve a primeira crise de ausência. "Só não me machuquei porque o rapaz que estava do lado percebeu que havia algo errado e pegou o peso, que ia cair em cima de mim", recorda-se.

Doença neurológica, a crise de ausência faz com que a pessoa se desligue do mundo exterior por alguns segundos. Em seguida, ela retorna à atividade anterior sem nem notar os momentos em que ficou "fora do ar". O diagnóstico de Karla veio até rápido, mas a vida dela ficou em suspenso. "Eu estava concluindo o ensino médio, cheia de planos para cursar uma faculdade de arquitetura ou jornalismo e, de repente, tudo parou."

Como poderia ter uma crise a qualquer momento, a brasiliense passou a viver em sobressaltos e isso desencadeou ataques de pânico, ansiedade e depressão. O projeto de entrar em uma universidade foi deixado de lado e, dos 17 aos 22 anos, Karla foi se afundando na depressão. Bastante religiosa, ela pediu a Deus que lhe desse uma luz.

Com o casamento marcado, Karla decidiu esculpir ela e o noivo, em biscuit, para pôr no topo do bolo. Com facilidade para trabalhos manuais, pesquisou, estudou e confeccionou os bonequinhos com perfeição. Tanta que os convidados ficaram encantados e, no boca a boca, começaram a pedir que ela confeccionasse os bonecos. O ano era 2007 e ninguém mais fazia algo do gênero em Brasília. "Os topos de bolo personalizados fizeram muito sucesso. Cheguei a enviá-los até para o exterior", recorda-se.

A ocupação tinha tirado o foco da jovem para a doença. Com o tempo, as crises de ausência foram sumindo e a depressão começou a ficar controlada. Mas ela não estava feliz. Não gostava de trabalhar com biscuit e queria dar outro sentido à vida.

Filha de confeiteira, Karla cresceu vendo a mãe preparar bolos, doces e salgados. Aos 12 anos, inclusive, começou a ajudar a matriarca com as encomendas e, de tanto observar, acabou aprendendo os segredos do mundo dos doces. Ela, porém, nunca tinha pensado naquilo como profissão. Até fazia festinhas familiares, mas sempre como hobby.

Em 2009, a brasiliense decidiu fazer o aniversário da sobrinha. Preparou bolo e cupcakes e postou nas redes sociais. A festa foi um sucesso, tanto para quem estava presente quanto para quem viu a produção pela internet. "Como eu conhecia muitas noivas por causa dos bonequinhos personalizados, uma cliente me procurou pedindo para eu fazer 400 cupcakes e o bolo, em pasta americana, para o casamento dela", lembra.

Ela aceitou o desafio, mesmo nunca tendo feito um bolo de pasta americana. "Minha mãe falou que eu era louca", diverte-se. Mas não só deu tudo certo como, no boca a boca e nas redes sociais, os doces e bolos de Karla começaram a fazer sucesso e os pedidos de encomenda não paravam de chegar. A brasiliense, finalmente, tinha encontrado algo que a fazia feliz e estava pronta para seguir a vida. "Era uma porta que Deus estava abrindo para mim. A gastronomia me salvou."

Tudo de brigadeiro

Diante do sucesso e dos pedidos que não paravam de chegar, Karla sentiu que era o momento de abrir uma loja física. Assim surgiu, no Sudoeste, a Brigadeirando, em 2010, época em que os brigadeiros gourmets se tornaram febre no Brasil. Além dos populares doces e bolos, a confeitaria oferecia os cupcakes que caíram no gosto dos clientes lá no início. No ano seguinte, abriu uma filial em Águas Claras e, em pouco tempo, já eram quatro lojas espalhadas pelo Distrito Federal.

A confeiteira passou a investir também em sobremesas que eram servidas na taça. "O nosso forte nunca foi o brigadeiro em si, mas ele está presente em praticamente todos os doces que oferecemos — na borda do café, no recheio dos bolos, na cobertura dos sorvetes…", exemplifica.

Quando veio a pandemia e o consequente lockdown, Karla e o marido, que é seu sócio, perceberam que não tinham como manter as lojas, pagando aluguéis altos e todas as outras despesas. Decidiram, então, em julho de 2020, fechar todas as unidades. "Estávamos isolados e meus filhos, que ficavam com a minha mãe enquanto eu ia trabalhar, não podiam mais ter contato com ela, por causa do risco de contaminação", lembra.

Era preciso, então, pensar em um novo modelo de trabalho. Em setembro de 2020, a confeiteira abriu uma loja em Águas Claras apenas para produção e retirada dos bolos e doces. Por questão de logística, os cupcakes e suas coberturas, assim como as sobremesas na taça, não funcionavam nesse modelo de take out. "Decidimos, então, trabalhar com doces que não precisavam ser montados na hora e ofertar apenas aqueles que estavam na vitrine."

Os doces para pronta-entrega tornaram-se o carro-chefe, inclusive quando a Brigadeirando voltou a abrir uma loja física, na 407 Sul. No cardápio, bolos gelados, bombons, brigadeiros, copos de pavê, pão-de-mel, minibolos e outras delícias. "Em alguns fins de semana, promovemos festivais, como o da rabanada, do cupcake, do bolo de cenoura, do donuts", enumera.

As encomendas para bolos e preparação de festas continuam a todo vapor e, em breve, a brasiliense pretende lançar um cardápio de salgados. "Eu adoro cozinhar. E não apenas doces. Quando chego em casa, depois de um dia cansativo, o meu hobby é ir para a cozinha", conta. Não à toa, ela credita sua cura à gastronomia. As crises de ausência passaram, assim como a depressão. "Só tenho a agradecer."

Coxinha de morango

 07/06/2022. Crédito: Ed Alves/CB/D.A Press. Brasil. Brasília. Revista. Encontro com Chefe  Karla Sousa, dona da empresa Brigadeirando. Receita da coxinha de brigadeiro com morango.
07/06/2022. Crédito: Ed Alves/CB/D.A Press. Brasil. Brasília. Revista. Encontro com Chefe Karla Sousa, dona da empresa Brigadeirando. Receita da coxinha de brigadeiro com morango. (foto: Ed Alves/CB)

Ingredientes

Brigadeiro

1 leite condensado

100g de creme de leite

3 colheres de sopa cheias de chocolate em pó (50% cacau) ou cacau 100%

1 colher de sopa de manteiga

Granulado ou chocolate ralado para cobrir

1 bandeja de morango para rechear as coxinhas

Modo de fazer 

Coloque todos os ingredientes no fogo médio e mexa até dar o ponto de enrolar — quando desgruda do fundo da panela.

Ponha numa vasilha, tampe com plástico filme em contato com o brigadeiro para não criar película e leve à geladeira para esfriar.

Lave e seque os morangos, retire a folhinha.

Com as mão untadas com manteiga, faça bolinhas do brigadeiro, cubra o morango em formato de coxinha e depois passe no granulado ou chocolate ralado.

SERVIÇO

Instagram: @brigadeirando

Endereço: CLS 407, Bloco A, Loja 16

 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação