Brasília foi por mais de 20 anos o lar de um dos artistas mais importantes do nosso país. Rubem Valentim foi um gênio, e sua obra ganha importância redobrada neste ano, em que comemoramos os 100 anos da Semana de Arte Moderna e os 200 anos da nossa independência de Portugal.
Ele pensou o Brasil, expressou o Brasil e mostrou ao mundo a profundidade da imagética de um povo cujas raízes podem ser encontradas em africanidades, indigenismo e muito mais.
Depois de uma temporada de sucesso em São Paulo, na Almeida & Dale Galeria de Arte, Ilê Funfun: Uma homenagem ao centenário de Rubem Valentim, com a curadoria de Daniel Rangel, chega a Brasília e fica em cartaz no Museu Nacional da República até 7 de agosto.
O público da capital não pode perder esta oportunidade de entrar em contato com a obra que, como ele mesmo dizia, traz um alfabeto kitônico capaz de traduzir as energias da terra. Este pintor, desenhista, escultor e criador de obras que são verdadeiros totens, altares e chaves de acesso a portais místicos e religiosos sonhava em ter seu trabalho exposto a céu aberto, nas praças, onde o público pudesse interagir e descobrir seus mistérios.
Uma cena linda retrata sua reação diante da multidão que ocupava a Praça da Sé, em São Paulo, pelas "Diretas Já" e que subiu em cima e até pichou uma escultura sua. Ele não se incomodou nem um pouco, ficou foi feliz em ver o povo se apropriando do que sempre deveria ter sido dele. Em 1972, enquanto dava aula para estudantes da Universidade de Brasília (UnB), fez um mural de mármore para o edifício-sede da Novacap, considerada sua primeira obra pública!
Os símbolos e signos escolhidos para compor as obras foram batizados pelo artista como "logotipos poéticos dos orixás ", belo titulo, né?
Que maravilha termos a chance de apreciar a sensibilidade de um homem que acessava o simbólico humano e divino para além do espaço e do tempo. Nessa exposição, está reunido o essencial da trajetória do artista: um potente conjunto artístico-sagrado e referências de seu universo particular, juntando ainda as coleções do Museu de Arte Moderna da Bahia, do Instituto Rubem Valentim, cuja sede está em São Paulo, e do Museu de Arte de Brasília — locais que foram suas casas, espaços que foram seus ilês.
O destaque é O Templo de Oxalá, cuja cor branca é predominante, representando o panteão dos orixás, saudando Obàtálá. Ele foi apresentado pela primeira vez em 1977, na XIV Bienal Internacional de São Paulo, em uma sala especial dedicada ao artista. À época, Frederico de Moraes disse: "Foi a primeira eclosão da espiritualidade dos afro-brasileiros (...) realizado no mais alto nível das conquistas plásticas da arte contemporânea internacional". Daniel Rangel conta que "essa analogia de uma possível festa para Oxalá, na qual as esculturas são divindades vestidas de branco em louvor ao orixá funfun, é o ponto de partida da narrativa".
Sempre fui uma admiradora de Valentim e me lembro até hoje de uma Bienal de SP, há muitos anos, em que, depois de visitar tudo, percebi que a obra que mais havia me comovido era dele.
Por essas e outras, este é mais que um convite, é uma convocação para que os brasilienses apreciem e se deixem ser impactados pela arte desse homem notável.
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