Bichos

De difícil diagnóstico, a síndrome de cushing exige atenção dos tutores

Doença endócrina que afeta principalmente cachorros coloca em risco animais; entenda mais sobre a síndrome de cushing ou hiperadrenocorticismo

Carolina Marcusse*
postado em 31/01/2023 09:01 / atualizado em 03/02/2023 11:31
 (crédito: Arquivo pessoal)
(crédito: Arquivo pessoal)

Ainda pouco conhecida, a síndrome de cushing é uma doença de diagnóstico difícil, causada pelo excesso do hormônio cortisol no organismo de animais. No caso dos domésticos, ocorre principalmente nos cães, e embora seja mais raro, pode aparecer também em gatos. Apesar de representar um grande risco à saúde dos bichos, depois de um diagnóstico diferenciado, é possível investir em tratamentos para garantir uma vida de melhor qualidade para os peludos.

Gabriela Souza, médica veterinária especializada em endocrinologia e metabolismo, explica que a doença é causada por tumores que podem ser 50% benignos e 50% malignos. "Esses tumores podem estar localizados na hipófise, que é uma glândula que fica no centro da cabeça, ou nas adrenais, que são glândulas que ficam acima dos rins", afirma.

Segundo a veterinária, os sintomas são clássicos e podem passar despercebidos, por isso, a atenção do tutor com os sinais de que algo não vai bem desde o início são importantes para um diagnóstico precoce. Quanto antes a doença é descoberta, maiores as chances de que as intervenções aliviem as manifestações clínicas e evitem o agravamento da síndrome.

Um dos principais sintomas, bem característico da doença, é o animal beber muita água, além do normal, o que é chamado de polidipsia. A poliúria, que é o xixi em excesso, a polifagia, um aumento do apetite causado pelo cortisol, a queda de pelo, o afinamento da pele, que fica com "aspecto de papiro" e faz com que as veias da barriga fiquem saltadas, também se fazem presentes na síndrome de cushing.

O abdômen pendular é outro sinal que pode confundir. Os tutores podem presumir que o animal está com sobrepeso, mas, na verdade, o que acontece é a redução da massa muscular e aumento da circunferência abdominal por conta de ligamentos que ficam frouxos ou até mesmo pelo aumento do tamanho do fígado.

Diagnóstico

A veterinária Gabriela Souza explica que, de maneira geral, o diagnóstico é realizado com base nos sinais clínicos, ou sintomas, e dosagens hormonais, mas informa que são necessários vários exames para investigar. "São necessários raio x, ultrassom e exames de sangue. Às vezes fazemos até mesmo a ressonância para ver como está a hipófise, até porque é uma doença que mexe com todo o organismo do cachorro", esclarece.

Embora um veterinário endocrinologista possa trazer mais precisão no diagnóstico, ela explica que pode ser feito por clínico geral, basta basear-se nos aspectos clínicos e nos principais exames, que sempre apontam grandes alterações. Souza declara que a maior parte das suspeitas que recebe atualmente vêm de "achados" laboratoriais em exames de pacientes que estão fazendo checapes anuais.

"Às vezes o veterinário vê as adrenais aumentadas e já encaminha. Nem sempre o cachorro está com síndrome de cushing, porque alterações teciduais nas adrenais podem evoluir para alguns outros tumores, inclusive uns que não tem secreção de nenhum hormônio, mas a maior parte é, sim, cushing", declara.

Um alerta que a veterinária faz é que, dependendo da experiência do profissional, pode-se confundir com outras doenças. Ela conta que ao pedir os exames completos, não resta dúvidas de que se trata do hiperadrenocorticismo, como a doença também é conhecida, mas que quando se observa somente um exame de sangue, é possível ver um marcador hepático elevado – o que pode levar a uma confusão de achar que se trata somente de uma doença hepática.

Alguns sinais, como o aumento de peso, queda de pelos, triglicerídeos e colesterol alto podem lembrar o hipotireodismo. "Mas, a partir do momento em que é feito o diagnóstico diferencial de forma correta com os exames corretos, essa dúvida já cai por terra", reitera.

A veterinária endocrinologista Janaina Falco afirma que os grupos mais afetados pela doença são os de meia idade e idosos. Por isso, por volta de 5 a 8 anos, os exames de checape devem fazer parte da rotina anual, principalmente se o animal for de raças como shihtzu, poodle, yorkshire e dachshund – as mais propensas geneticamente.

Tratamento

Segundo Falco, no Brasil, atualmente, o tratamento é realizado de forma conservadora, através de fármacos que inibem a conversão de enzimas que atuam na formação de cortisol. A cura definitiva só ocorreria no caso de processo cirúrgico de remoção da glândula hipófise, que ainda não é realizada no país. Por isso, acaba sendo uma doença que possui somente controle dos sintomas, níveis hormonais e consequências.

A cirurgia, que é um procedimento mais invasivo, pode não ser segura para a maior parte dos pacientes, já que fazem parte de um grupo com idade mais avançada e comorbidades. As medicações são individualizadas caso a caso, avaliando o quadro clínico, mas, de modo geral, costumam ter valores altos.

Riscos

Os principais perigos quando não é feita a intervenção adequada e precoce, segundo a veterinária Janaina Falco, estão relacionados às sequelas do excesso de cortisol no sangue, como hiperviscosidade sanguínea, pancreatite, tromboembolismo, obesidade, sobrecarga do fígado, risco de diabetes, hipertensão, fraqueza muscular, entre outros. "Quando completamente não tratado, o paciente pode evoluir para o óbito, diminuindo a longevidade pela piora das manifestações clínicas", avisa.

Mudanças de vida

Associado ao uso correto dos remédios, de acordo com recomendação veterinária, diversas mudanças no dia a dia dos bichos devem ocorrer, como a adaptação da alimentação com troca da ração e suspensão de petiscos e atividade física para auxiliar no controle e tratamento da doença.

Sabendo disso, a bióloga Neuza Silva tenta trazer o máximo de qualidade de vida para Tuka, uma poodle de 13 anos que possui a síndrome. A cadela foi diagnosticada há quase um ano após uma crise que a levou a internação, pois Neuza não conseguiu reconhecer os sintomas que apareceram. Na época, Tuka tomava muita água e tinha apetite em excesso, com uma série de exames requeridos pela veterinária, o diagnóstico de diabetes apareceu e a constatação de que outros indicadores apresentavam alteração, também.

Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing.
Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing. (foto: Arquivo pessoal)

Nesse momento, Neuza conheceu Falco, que assumiu como endocrinologista responsável pela peluda. Inicialmente ela começoua a tratar a diabetes mas, em seguida, com um olhar mais atento aos sintomas, descobriu a síndrome. Hoje, Neuza avalia que a diabetes, na realidade, é uma das consequências da síndrome de cushing em Tuka. A tutora conta que foi um longo processo até o quadro se estabilizar e passou por momentos de muito medo de perder a companheira, mas que hoje respira mais aliviada.

Para ela, uma das questões mais complicadas é a financeira, pois gasta com medicações diárias, insulina, medicação para doença renal, controle da pressão alta e fígado, que atuam simultaneamente. Uma grande mudança na vida das duas foi a alimentação, pois além de horários específicos para acompanhar os remédios, também precisou mudar o que era consumido.

Na época do diagnóstico, chegou a realizar consulta com uma veterinária especializada em nutrologia, que elaborou uma dieta que abarcasse todas as restrições e garantisse o máximo de sabor e nutrientes possível, para que Tuka não sentisse tanta diferença. Neuza garante que hoje os únicos petiscos são tomate cereja e algumas frutas e vegetais específicos. Com amor e cuidado, mostra que é possível para o animal viver bem com a doença.

*Estagiária sob a supervisão de Ailim Cabral

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  • Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing.
    Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing. Foto: Arquivo pessoal
  • Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing.
    Cadela Tuka, de 13 anos, que vive com a síndrome de cushing. Foto: Arquivo pessoal
  • Cadela Tuka que vive com a síndrome de cushing e sua tutora, a bióloga Neuza Silva.
    Cadela Tuka que vive com a síndrome de cushing e sua tutora, a bióloga Neuza Silva. Foto: Arquivo pessoal
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