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Robô torna coleta de amostras de sangue mais rápida e eficaz

Dispositivo combina inteligência artificial, ultrassom e imagens infravermelhas para realizar um dos procedimentos médicos mais comuns. Segundo criadores, a solução poderá acelerar atendimentos e reduzir o número de tentativas para acessar as veias

A retirada de sangue é um procedimento comum em hospitais e outros centros médicos, mas pode tomar muito tempo dos profissionais de saúde. Com o objetivo de tornar esse processo mais rápido e preciso, um grupo de pesquisadores americanos criou um robô projetado para realizar apenas essa tarefa. A tecnologia, que junta inteligência artificial, imagens de infravermelho e ultrassom, mostrou resultados iniciais positivos em testes feitos com fantoches, animais e humanos. Os pesquisadores pretendem fazer com que, mais à frente, a tecnologia também consiga analisar as amostras colhidas. Os dados da empreitada científica foram divulgados nas revistas Nature Machine Intelligence e Technology.

Procedimentos comuns em hospitais, como coleta de sangue, aplicação de medicamentos e introdução de dispositivos de monitoramento, têm em comum a seguinte premissa: obter acesso a veias, artérias e outros vasos sanguíneos. A rapidez dos procedimentos pode ser crítica, mas obter acesso a vasos sanguíneos de alguns pacientes nem sempre é uma tarefa simples. “Falhas ocorrem em cerca de 20% dos procedimentos, e as dificuldades aumentam em pessoas com vasos pequenos, retorcidos ou colapsados, características comuns em pacientes pediátricos, idosos, doentes crônicos e com trauma”, explicam, no trabalho, os autores.

Segundo os cientistas, nesses grupos, a taxa de precisão da primeira tentativa de acesso às veias é inferior a 50%, e, com frequência, são necessárias pelo menos cinco tentativas, levando a atrasos no tratamento e a possíveis contratempos. “As complicações hemorrágicas podem surgir quando as principais artérias adjacentes, nervos ou órgãos internos são puncionados, e o risco de complicações aumenta significativamente com várias tentativas”, detalham os cientistas.

A fim de diminuir o tempo gasto nessa tarefa e reduzir as chances de erros, os pesquisadores projetaram um robô repleto de recursos, capaz, segundo eles, de identificar artérias e veias com maior precisão. Os primeiros testes foram feitos com fantoches, simulando o braço humano. Depois, em animais, e, por último, em voluntários. Em um grupo de 31 participantes, a taxa de sucesso foi de 87%. Dos participantes, 25 tinham veias de fácil acesso — neles, a taxa de sucesso foi de 97%.

“Usando voluntários, modelos (fantoches) e animais, nossa equipe mostrou que o dispositivo pode localizar, com precisão, os vasos sanguíneos, melhorando as taxas de sucesso e o tempo de procedimento, em comparação a profissionais de saúde especializados”, enfatiza, em comunicado, Martin L. Yarmush, professor do Departamento de Engenharia Biomédica da Escola de Engenharia da Universidade de Rutgers, nos Estados Unidos, e um dos autores do estudo.

O aparelho também contém um dispositivo integrado para realizar, por meio de uma centrífuga, a análise do sangue colhido. Os pesquisadores explicam que mais testes são necessários para avaliar a eficácia desse recurso, mas acreditam que, caso os resultados sejam positivos, a tecnologia poderá ser usada ao lado do leitos, em ambulâncias, salas de emergência, clínicas, consultórios médicos e hospitais. “No futuro, o dispositivo poderá ser utilizado em procedimentos como cateterismo e diálise entre outros”, apostam.

Os próximos passos incluem novas pesquisas envolvendo um número maior de pessoas, com vasos sanguíneos de características distintas, para refinar a tecnologia e melhorar as taxas de sucesso em pacientes com veias de difícil acesso. “Um dispositivo como o nosso poderia ajudar os médicos a obter amostras de sangue de forma rápida, segura e confiável, evitando complicações desnecessárias e dor em pacientes devido a várias tentativas de inserção de agulha”, frisa Josh Leipheimer, pesquisador da Universidade de Rutgers e também autor do estudo.

Tendência
Vivaldo José Breternitz, professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie, acredita que a tecnologia se destaca pela união de ferramentas conhecidas para a realização de uma tarefa importante na área médica. “É uma junção de recursos, com um computador que consegue enxergar bem melhor do que o olho humano uma área específica, nesse caso, as veias”, afirma. Para Breternitz, outro ponto importante da solução é a análise do sangue. “O recurso pode fazer com que você descubra rapidamente o tipo sanguíneo de uma pessoa que sofreu um acidente, por exemplo. Isso poupa muito tempo dos profissionais, que podem agilizar outros procedimentos mais urgentes. Essa economia de tempo é essencial, vemos isso no momento atual, quando enfrentamos uma pandemia.”

Luis Lambe, doutor em ciência da computação pelo Imperial College London, no Reino Unido, e membro do Instituto dos Engenheiros Eletrônicos e Eletricistas (IEEE), também acredita que a tecnologia da Universidade de Rutgers pode trazer grandes ganhos para a área médica, proporcionado um refinamento de uma prática importante. “É uma tendência usar tecnologias com base em inteligência artificial para fazer análises mais apuradas. Com seus múltiplos recursos, esse aparelho consegue fazer um posicionamento melhor da agulha e ter maior precisão no procedimento, detalhes que são importantes em uma tarefa do dia a dia da área médica”, justifica.

O especialista explica que o uso de robôs autônomos deve seguir crescendo na área médica e em outros setores. “Sem dúvida, a inteligência artificial estará cada vez mais frequente em setores importantes, como no agronegócio, em que muitos aparelhos estão sendo desenvolvidos para tarefas também do cotidiano, como a colheita”, ilustra. “Essa tecnologia também estará presente com ainda mais força no nosso dia a dia. Durante o isolamento, temos vistos como ter recursos mais inteligentes é algo importante.”

 

Melhor resposta às variações

“Esse tipo de tecnologia tem sido cada vez mais explorado, em que o robô é criado com base no maior número de informações técnicas possíveis para que possa reproduzi-las com ainda mais precisão do que os humanos. Já é algo que está sendo muito usado na área cirúrgica, por exemplo. Essa precisão que o aparelho pode proporcionar é positiva, pois temos variações anatômicas nos pacientes. Também passamos por situações de variação, como colher sangue em pessoas desidratadas, com extrema movimentação, crianças, por exemplo, e idosos, que têm uma textura diferente da pele. Esse dispositivo americano tem algumas tecnologias que já utilizamos na busca do acesso venoso. A ultrassonografia nos ajuda a escolher melhor a veia, e os raios infravermelhos, a ver o tamanho delas e a mapear seu trajeto. Eu imagino que esse tipo de tecnologia, uma vez que estiver consolidada, será usada principalmente em situações em que os recursos humanos são limitados. Em um cenário de poucos profissionais, teremos o acesso venoso em pouco tempo, com uma economia de 10 a 15 minutos e com um processo menos traumático para o paciente.”

Eduardo Flávio Ribeiro, médico hematologista e coordenador de Hematologia do Centro de Oncologia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília

Microagulhas impressas em 4D

Pesquisadores americanos desenvolveram microagulhas, com pequenas farpas, que se fixam na pele de forma semelhante a parasitas, sem provocar a mesma dor da clássica picada. A tecnologia feita por meio da impressão 4D foi apresentada recentemente, na revista Advances Funcional Materials.

Enquanto a impressão 3D constrói objetos camada por camada, a 4D vai além: produz materiais inteligentes, programados para mudar de forma após a impressão. Por esse motivo, a técnica foi a escolhida para criar as agulhas. “Acreditamos que nossa matriz de microagulhas 4D impressa permitirá o uso mais robusto e sustentado de microagulhas minimamente invasivas, sem dor e fáceis de usar para a aplicação de medicamentos, a cicatrização de feridas, em biossensores e em outras aplicações”, enfatiza, em comunicado, Howon Lee, professor-assistente do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Rutgers e um dos autores do trabalho.

No caso das microagulhas, a fraca adesão aos tecidos é um grande desafio para a entrega controlada de drogas a longo prazo. Para suprir essas demandas, os pesquisadores inspiraram-se na natureza. Eles explicam que alguns insetos e outros organismos vivos têm recursos microscópicos que aderem ao tecido, como os microganchos de parasitas, os ferrões farpados de abelhas e os espinhos escamados de porcos-espinhos. Motivados por esses exemplos, os engenheiros desenvolveram uma microagulha que se encaixa na pele, aumentando, assim, a sua adesão.

Nos testes, os pesquisadores usaram tecido muscular de frango como modelo. A adesão do tecido com a microagulha foi 18 vezes mais forte do que com uma microagulha sem as farpas, resultando em uma entrega de drogas mais estável e eficaz com menos dor que a agulha hipodérmica tradicional. “Obtivemos sucesso e partiremos para testes que possam nos ajudar a aperfeiçoar ainda mais essa técnica”, enfatizaram.