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Cientistas desenvolvem "pele eletrônica" capaz de monitorar batimentos cardíacos

Dispositivo extremamente fino e elástico pode ser preso a qualquer parte do corpo e executar tarefas sensoriais distintas, como monitorar batimentos cardíacos e saturação de oxigênio. A solução vestível também tem a vantagem de ser 100% reutilizável

Paloma Oliveto
postado em 23/11/2020 06:00
 (crédito: Caltech/Divulgação)
(crédito: Caltech/Divulgação)

Nos últimos anos, os relógios inteligentes conseguiram concentrar em um único equipamento funcionalidades que, antes, exigiam diversos apetrechos. Contador de passo, medidor de distâncias, temperatura e batimentos cardíacos são algumas das utilidades concentradas nesse tipo de aparelho. Porém, para uma equipe de pesquisadores da Universidade do Colorado (UC), em Boulder (EUA), um mundo ideal dispensaria qualquer material não reciclável. Por isso, eles desenvolveram um dispositivo vestível, completamente reutilizável, inspirado na pele humana.

Além de extremamente fino — da espessura de um adesivo curativo —, o equipamento é esticável e, assim como a pele, autocurável. Ou seja, se houver algum dano, ele mesmo faz o autorreparo. Esse adesivo pode ser colocado em qualquer lugar que o usuário queira, como pulso ou pescoço, bastando o calor natural para a adesão. Os testes mostraram que ele executa com eficácia uma variedade de tarefas sensoriais.

“Relógios inteligentes são funcionalmente bons, mas sempre são uma grande peça de metal em uma pulseira”, diz Wei Zhang, professor do Departamento de Química da instituição estadunidense e um dos responsáveis pela pesquisa. “Se quisermos um dispositivo realmente usável, o ideal é que seja uma película fina que se ajuste confortavelmente ao corpo.” Jianliang Xiao, que também trabalha no projeto, diz que o objetivo é, um dia, permitir que as pessoas consigam obter dados precisos sobre seu organismo ao mesmo tempo em que reduzem as crescentes quantidades mundiais de lixo eletrônico.

A pele eletrônica, conhecida como e-skin, é um material fino e translúcido que pode imitar a função e as propriedades mecânicas da pele humana. Vários tipos e tamanhos diferentes de e-skins vestíveis estão, agora, sendo desenvolvidos em laboratórios em todo o mundo, à medida que os pesquisadores reconhecem o valor do material em diversos campos médicos, científicos e de engenharia, conta Xiao.

O dispositivo da UC Boulder tem sensores integrados para medir pressão, temperatura, umidade e fluxo de ar, entre outras funcionalidades. Segundo Xiao, o equipamento engloba várias propriedades distintas, incluindo um novo tipo de polímero de rede dinâmica ligado covalentemente, conhecido como poli-imina, que foi misturado com nanopartículas de metais líquidos para fornecer melhor resistência mecânica, estabilidade química e condutividade elétrica.

“O que é único aqui é que a ligação química da poli-imina que usamos permite que a e-skin seja autocurativa e totalmente reciclável em temperatura ambiente”, diz o pesquisador. “Considerando as milhões de toneladas de lixo eletrônico geradas em todo o mundo a cada ano, a reciclabilidade de nosso e-skin faz sentido do ponto de vista econômico e ambiental.”

Para 2021, as estimativas apontam que os humanos produzirão mais de 55 milhões de toneladas de smartphones, laptops e outros eletrônicos descartados. O dispositivo da pesquisa, porém, é projetado para evitar os aterros. Quando se mergulha um desses adesivos em uma solução de reciclagem, a poli-imina se despolimeriza, decompondo suas moléculas, enquanto que os componentes eletrônicos afundam. Tanto a parte eletrônica quanto o material elástico podem ser reutilizados.

Autocurável

Outra vantagem do dispositivo é que ele pode esticar em 60% para qualquer direção sem interromper os componentes eletrônicos internos. “É realmente flexível, o que permite muitas possibilidades que antes não eram uma opção”, diz Xiao. Além disso, ela é autocurável. “Se você cortar um pedaço de pele eletrônica, tudo o que você precisa fazer é juntar as áreas quebradas. Em alguns minutos, as ligações que unem o material de poli-imina começarão a se reparar. Em 13 minutos, o dano será quase totalmente indetectável”, descreve Zhang. “É semelhante à cura da pele, mas estamos falando de ligações químicas covalentes aqui.”

Além de ser a base do dispositivo multifuncional da equipe, a pele eletrônica tem aplicações robóticas. “Digamos que você queira um robô para cuidar de um bebê. Nesse caso, você integraria a e-skin aos dedos do robô, permitindo que ele sinta a pressão do bebê. A ideia é tentar imitar a pele biológica”, ilustra Zhang.

Porém, o material ainda não está pronto para uso industrial. De acordo com os pesquisadores, que publicaram os resultados do estudo na revista Science Advances, é preciso desenvolver funções mais complexas antes de a pele eletrônica se tornar uma realidade.

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Pele eletrônica movida a suor

 (crédito: Chuanqian Shi/Divulgação)
crédito: Chuanqian Shi/Divulgação


No Instituto de Tecnologia da Califórnia, um grupo de pesquisadores do Departamento de Engenharia Médica desenvolve uma pele eletrônica de borracha flexível que também poderá servir como dispositivo de medição de funções corporais. A diferença é que ela é movida pelo suor. A e-skin funciona apenas com células de biocombustível, alimentadas pelo resíduo corporal.

“Um dos maiores desafios com esses tipos de dispositivos vestíveis diz respeito à energia”, diz Wei Gao, professor de engenharia e pesquisador do material. “Muitos projetos estão usando baterias, mas isso não é muito sustentável. Algumas pessoas tentaram usar células solares ou aproveitar a força do movimento humano, mas queríamos saber: ‘Podemos obter energia suficiente do suor para alimentar os vestíveis?’. E a resposta é sim.”

Gao explica que o suor humano contém níveis muito elevados de lactato químico, um composto gerado como subproduto de processos metabólicos normais, especialmente pelos músculos durante a prática de exercícios físicos. Células embutidas na e-skin absorvem esse lactato e o combinam com o oxigênio da atmosfera, gerando água e piruvato, outro subproduto do metabolismo.

À medida que operam, as células de biocombustível geram eletricidade suficiente para alimentar sensores e um dispositivo Bluetooth, semelhante ao que conecta o telefone ao som do carro, permitindo que a pele eletrônica transmita as leituras feitas pelos sensores sem fio.

Durabilidade

Conceber uma fonte de energia que pudesse funcionar com suor não foi o único desafio na criação da e-skin, diz Gao. O dispositivo também precisava durar muito tempo, com alta intensidade de energia e degradação mínima. Isso foi resolvido pela equipe. As células de biocombustível são feitas de nanotubos de carbono impregnados com um catalisador de platina/cobalto e uma malha composta, contendo uma enzima que decompõe o lactato. “Elas podem gerar uma saída de energia contínua e estável, de até vários miliwatts por centímetro quadrado, durante vários dias no suor humano”, garante o pesquisador.

Gao diz que a ideia é desenvolver uma variedade de sensores que possam ser incorporados à e-skin, conferindo a ela diversas funcionalidades, a exemplo do material desenvolvido na Universidade do Colorado. “Queremos que esse sistema seja uma plataforma”, afirma. “Além de ser um biossensor vestível, pode ser uma interface homem-máquina. Os sinais vitais e as informações moleculares coletadas através da plataforma podem ser usados para projetar e otimizar próteses de próxima geração.” (PO)

 

 

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