glicose

Glicose poderá ser monitorada por exame de saliva

Em testes, o dispositivo mede a concentração de açúcar com eficácia e em apenas um minuto. Biossensor poderá ajudar no monitoramento do diabetes

O professor Thomas Anthopoulos e Abhinav Sharma (foto) estão agora desenvolvendo uma série de sensores transistorizados que podem detectar simultaneamente vários metabólitos na saliva. -  (crédito: © 2023 KAUST; Anastasia Serin.)
O professor Thomas Anthopoulos e Abhinav Sharma (foto) estão agora desenvolvendo uma série de sensores transistorizados que podem detectar simultaneamente vários metabólitos na saliva. - (crédito: © 2023 KAUST; Anastasia Serin.)
Correio Braziliense
postado em 04/09/2023 06:05 / atualizado em 04/09/2023 06:35

Por Amanda Gonçalves*

Medidores de glicose dependem de métodos invasivos para funcionar, uma vez que há a necessidade de furar o dedo do paciente e fazer a coleta de sangue. A condição é, segundo médicos, um dos complicadores no tratamento do diabetes. Um dispositivo criado na King Abdullah University of Science and Technology (KAUST), na Arábia Saudita, poderá ajudar a resolver essa dificuldade. A nova tecnologia consegue fazer a avaliação pela saliva, oferecendo um monitoramento simples, rápido e indolor do açúcar presente no organismo.

"Entre os vários biofluidos que podem ser coletados de forma não invasiva, a saliva é o mais acessível, fácil de extrair e contém vários dados analitos de interesse, incluindo metabólitos, proteínas, bactérias e biomarcadores de doenças", explica Thomas Anthopoulos, um dos autores do estudo, publicado, recentemente na revista Biosensors and Bioelectronics.

O biossensor contém finas camadas de semicondutores à base de óxido de índio e óxido de zinco, cobertas com a enzima glicose oxidase. Quando a saliva entra em contato com o dispositivo, essa enzima oxida qualquer traço de glicose presente para produzir peróxido de hidrogênio (H2O2). Também submetido a um processo de oxidação elétrica, o H2O2 gera elétrons capazes de alterar a corrente que flui através dos semicondutores. O resultado permite indicar a concentração da glicose presente na amostra.

Os pesquisadores da KAUST desenvolveram um sensor que pode medir os níveis de glicose na saliva, oferecendo aos diabéticos um meio alternativo de monitorar os níveis de glicose no sangue.
Os transistores que compõem o sensor são pequenos, baratos e de baixa potência (foto: © 2023 KAUST; Anastasia Serin.)

Segundo Anthopoulos, o baixo investimento para a produção e possíveis adaptações do aparelho é outra vantagem. "Os biossensores baseados em transistores são tipicamente pequenos, leves e de baixa potência. Esses dispositivos podem ser facilmente miniaturizados e integrados com eletrônicos portáteis de baixo custo, como smartphones, tablets e vestíveis", detalha.

A solução tecnológica foi testada em versões diversas: na saliva artificial e humana com diferentes quantidades de glicose adicionada e em amostras coletadas de voluntários que haviam jejuado, uma vez que os níveis de glicose na saliva podem não estar correlacionados com a glicose no sangue imediatamente após uma refeição.

Os resultados mostram que o dispositivo mediu corretamente uma ampla gama de concentrações de glicose em menos de um minuto. Além disso, outras moléculas da saliva, incluindo derivados de açúcar, como frutose e sacarose, não atrapalharam o seu funcionamento. Embora a sensibilidade do sensor tenha diminuído com o tempo, ele manteve o bom desempenho após ser armazenado por duas semanas em temperatura ambiente, destacam os autores.

Simplicidade

Na avaliação de Filipe Tôrres, professor do Instituto Federal de Brasília (IFB), além de ser um método não invasivo e indolor, a tecnologia se destaca pela simplicidade e pela rapidez para detectar o nível de glicose. Ele considera que a utilização do biossensor diminui a possibilidade de infecções e poderá facilitar a análise de açúcar em crianças.

"A pessoa não precisa se furar várias vezes no dia para fazer as medições e não corre o risco de contaminação por sangue e agulha, pois utiliza apenas saliva. O dispositivo também é melhor que os sensores implantados, pois eles não são aprovados para crianças e não medem bem níveis de glicose mais baixos", explica o também doutorando em engenharia na Universidade de Brasília (UnB).

Os criadores ponderam que os níveis de glicose na saliva são significativamente mais baixos do que no sangue, tornando o diagnóstico salivar desafiador. Para Tôrres, a pesquisa é promissora, mas questões como sensibilidade, precisão e acurácia do dispositivo ainda devem ser melhoradas. "Só com uma melhor exatidão, poderá ser aprovado e vendido para a grande massa da população", avalia o professor do IFB.

Nutrólogo e endocrinologista do Instituto Anália Franco, Daniel Bratan explica que a sensibilidade do aparelho pode ser limitada para analisar baixas quantidades de glicose. "Em condição extrema, onde há quantidade muito baixa de açúcar no sangue, o aparelho passa a não ser tão efetivo. Então, os métodos convencionais acabam sendo mais fidedignos."

Mais doenças

Também segundo o médico, o biossensor ainda não consegue fazer medições para outras condições de saúde. "Por meio da saliva, a gente consegue identificar uma série de distúrbios, mas, nesse tipo de aparelho, que tem só essa captação com essa enzima, não existe condição de aferir para outras patologias", completa.

Anthopoulos considera que o aparelho apresenta potencial para detectar outros dados que ajudem no monitoramento de mais condições de saúde. "A superfície de detecção do biossensor transistor pode ser modificada com o biorreceptor específico para detectar analitos de interesse", afirma.

A equipe trabalha, agora, na criação de uma série de sensores portáteis que podem detectar simultaneamente vários metabólitos na saliva e ser integrados a um smartphone. Para o futuro, os planos são de superar a baixa sensibilidade através do desenvolvimento de receptores mais estáveis.

*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza

 

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