Nas feiras de bebidas alcoólicas mundo a fora já havia um sussurro nos corredores sobre uma certa tendência na queda do consumo de álcool de uma forma geral. Na mais recente Wine South America, que aconteceu em maio deste ano em Bento Gonçalves no Rio Grande do Sul, muitas vinícolas e importadores lançaram vinhos sem álcool. Os atuais casos de falsificação de destilados que se tornaram casos de saúde pública, levantam diversas questões econômico-sociais, mas também históricas e culturais. Qual a importância das bebidas alcoólicas?
Em Curitiba, esta semana foi lançado o “Movimento Bebida Legal e de Procedência” como uma resposta à sociedade civil diante dos casos de consumo de destilados falsificados e intoxicação por metanol. Criada ainda no primeiro semestre de 2025, a iniciativa nasceu no Paraná com o propósito de conscientizar consumidores e comerciantes sobre os riscos das bebidas falsificadas e adulteradas, enfrentando a venda e o consumo de produtos descaminhados e sem procedência.
De outro lado, a mais recente moda, pelo menos nas redes sociais, são as cafeterias baladas, ou seja, encontros com muito entretenimento e zero álcool. O novo luxo está no bem-estar, na vida saudável, expressado muitas vezes nos grupos de corridas e seus cafés da manhã, em suplementos e muitos treinos. E onde entrariam as bebidas alcoólicas nesse contexto?
As bebidas alcoólicas já foram símbolo de muitos exageros, confusões, e carrega uma dualidade profunda – prazer e tragédia. E se comermos com a mesma irresponsabilidade? Não estaremos diante de um caso de saúde pública também? Por que estamos nos tornando a geração “canetinha do emagrecimento”? O que ainda não aprendemos com o AeB (Alimentos e bebidas) social?
Num passado pouco distante, o cigarro era sinônimo de elegância, liberdade, status. A publicidade e o cinema ajudaram a construir essa imagem. Hollywood transformou o cigarro em ícone de sensualidade e rebeldia; o cigarro foi defendido e incentivado como parte da cultura moderna; da autonomia feminina, da criatividade e intelectualidade. Tudo isso deixou de ser glamuroso quando passou a ser associado ao vício, à poluição, à decadência. Cigarros eram cultura ou costume?
Com a bebida é diferente?
As bebidas alcoólicas são expressões carregadas de símbolos sociais, religiosos e identitários. O vinho na Antiguidade grega era símbolo de comunhão; o saquê no Japão é parte de cerimônias xintoístas; a champanhe está ligado a séculos de história francesa e a cachaça no Brasil foi um símbolo de resistência popular e de afirmação nacional. Se compararmos com costumes, bebidas alcoólicas não são apenas um modo de agir repetido e que pode desaparecer sem que afete a identidade profunda de uma sociedade.
O ato de beber muitas vezes se tornou num escape e não num ritual: bebemos para esquecer e não para celebrar; bebemos para se encaixar e não para compartilhar; bebemos sem medida, sem tempo, sem sentido, como se o álcool fosse uma anestesia existencial e não uma celebração à vida. Em sociedades aceleradas, competitivas e ansiosas o álcool vira válvula de escape. Mas então o erro não está na taça, no copo, mas no vazio que buscamos preencher com eles. Excesso não é diversão.
Por isso, movimentos como o “Bebida Legal” fazem todo o sentido, não só comercial, mas também social. Por qual motivo devemos defender o consumo moderado das bebidas alcoólicas como expressão cultural? Ética, estética, história, reconhecimento da tradição civilizatória, sua semiótica. A falsificação das bebidas alcoólicas, além de todos os problemas de saúde pública, é um afronta a nossa cultura, um golpe nas tradições, no conhecimento.
Não ousaria influenciar ninguém a beber nem a comer mais do que deveria, talvez a refletir sobre o que faz parte da trajetória humana, como expressão da evolução social frente ao individualismo, a refletir sobre o que é costume e o que é cultura. Pensemos nisso!
Thiago Paes é colunista de viagem e gastronomia. Apresentador de TV no canal Travel Box Brazil. Está nas redes sociais como @paespelomundo Press.: contato@paespelomundo.com.br
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