Atualmente, a doença não integra a lista de notificação obrigatória do Ministério da Saúde. Isso causa desconhecimento de dados na maioria dos estados brasileiros.
Segundo o infectologista Flávio Telles, coordenador do Comitê de Micologia da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), os casos vêm aumentando progressivamente ao longo da última década.
“Trata-se de uma epidemia em expansão. (...) Isso ocorre porque não há controle da doença entre os felinos. Não há vacinas, o tratamento do gato doente é longo e requer dedicação do tutor.”, ressalta.
A doença já foi registrada em países como Argentina, Paraguai, Uruguai e Chile. Em 90%, a transmissão acontece por gatos contaminados, visto que humanos e cachorros não podem transmitir a esporotricose.
Neste ano, houve um aumento de 40% dos casos registrados na cidade de São Paulo. No Paraná, pulou de 1.242 no ano passado para 2.887 em 2023. Cabe salientar que o estado é um dos poucos que fornece medicação para cães, gatos e seres humanos.
O Ministério da Saúde indicou que dados de dispensação dos medicamentos para o tratamento dessas pessoas sugerem um aumento no número de casos. Por outro lado, ainda não há um sistema oficial de registro de casos de esporotricose humana.
Especialista da Fiocruz, Dayvison Freitas informou que há uma“hiperendemia”, quando uma doença endêmica passa a crescer de forma acentuada.
"Desde 1998, o fungo se adaptou de uma forma tão grande ao gato, que o felino passou a transmitir para outros gatos, para o ser humano e cães também”, analisou.
Freitas explicou que, apesar das poucas chances de ser fatal, o fungo pode se tornar grave. Portanto, o tratamento deve ser iniciado assim que a doença for identificada.
A esporotricose é uma micose subcutânea causada pelo fungo Sporothrix. Pode ser encontrado no solo e em matéria orgânica em decomposição. A transmissão é feita por felinos contaminados através de arranhões, mordidas e secreções, resultando em uma infecção subcutânea.
Esporotricose cutânea: caracteriza-se por uma ou múltiplas lesões, principalmente nas mãos e braços.
Esporotricose linfocutânea: é a forma clínica mais frequente; são formados pequenos nódulos na camada da pele mais profunda, seguindo o trajeto do sistema linfático da região corporal afetada. Ocorre principalmente nos membros.
Esporotricose disseminada: acontece quando a doença se espalha pelo organismo, com comprometimento de vários órgãos e/ou sistemas (pulmão, ossos, fígado).
Esporotricose extracutânea: quando a doença se espalha para outros locais do corpo, como ossos, mucosas, entre outros, sem comprometimento da pele.
Segundo o Ministério da Saúde, a doença pode causar lesões na pele, pequenos nódulos na camada de pele mais profunda. Nos casos mais graves, pode afetar órgãos ou sistemas como pulmão, ossos e fígado.
O tratamento em humanos deve ser realizado após a avaliação clínica, com orientação e acompanhamento médico. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece gratuitamente o itraconazol e o complexo lipídico de anfotericina B para o tratamento da esporotricose humana.
O diagnóstico de esporotricose é feito com exames laboratoriais em que o fungo encontrado nas lesões é isolado. Em casos mais graves, é realizado por amostras, como escarro, sangue, líquido sinovial e líquor.
Segundo a Fiocruz, a doença tem cura, e o tratamento em animais deve ser feito por veterinários. Com o uso do remédio adequado, já se encontram sinais de melhora. O tratamento, porém, deve ser realizado em até dois meses depois das feridas desaparecem.
No momento, apenas dez estados incluíram a esporotricose humana em suas listas de notificação compulsória de doenças. Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, Paraná, Paraíba, Rio de Janeiro e Rondônia.
A Secretaria de Saúde da Bahia informou que houveram 492 casos em 2023, número superior aos 402 diagnósticos registrados durante todo o ano anterior.
São Paulo, por sua vez, já adota a notificação compulsória para a doença. A Secretaria de Saúde da capital paulista, por meio da Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa), informou que em 2022, até setembro, foram confirmados 388 casos. Em 2023, até o momento, foram diagnosticados 403.
Mesmo sem um crescimento parecido com o de outros estados. Pernambuco classifica a esporotricose como uma "zoonose emergente de interesse estadual".
“Nós não temos uma vigilância federal por notificação. Então, com o aumento do número de casos, alguns estados foram reconhecendo que havia um problema de saúde pública, envolvendo meio ambiente, animais e humanos. Conforme os estados foram tendo o crescimento de casos, eles foram instituindo a notificação compulsória em nível estadual”, explica Dayvison Freitas.
O infectologista Flávio Telles cita que a notificação compulsória é importante para entender melhor os casos e os tratamentos. Como medida de prevenção, deve haver a castração de animais, limitação de seu acesso à rua, além da orientação de cremar bichos que morrem de esporotricose.
“É importante ainda implantar medidas educativas e de saúde para esclarecer a existência da doença, explicando que o gato é uma vítima e não o culpado”, frisa.