Brasil

Educação em pauta no Legislativo

No primeiro semestre, o Congresso votou várias propostas que buscam melhorar a qualidade do ensino no país. Para especialistas, definição do piso salarial dos professores é o principal avanço

postado em 25/07/2008 09:19

Entre as discussões sobre a Comissão Social da Saúde (CSS), o uso de cartões corporativos e a lei seca, ainda sobrou espaço para a educação no primeiro semestre legislativo deste ano. O destaque da atuação dos parlamentares na área foi a regulamentação do piso salarial dos professores do ensino básico, fixado em R$ 950. O projeto do Executivo foi apensado ao texto original do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), apresentado há quatro anos, e sancionado em 16 de julho. ;Essa foi a grande conquista dos últimos seis meses. Todos os estudos mostram que o principal elemento que garante a condição do direito de aprender é o professor. Ele é o ator e o autor da aprendizagem;, analisa a oficial de projetos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) Maria Salete Silva.

Para a deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO), integrante da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, a aprovação do piso representa um momento histórico para o país. ;O Brasil passou da fase de afirmação da categoria para focar no desempenho acadêmico, no aprendizado;, afirma. ;Tudo o que diz respeito à carreira e salário está relacionado à qualidade do ensino. Quando o Executivo e o Legislativo se unem em torno de um projeto de relevância como esse, sem distinção partidária, quem ganha é a sociedade. Agora, esperamos que nos próximos 12 meses os governadores e prefeitos se adequem à lei para chegarmos a 2010 com o valor integral do reajuste repassado ao magistério;, diz o presidente da comissão, deputado João Matos (PMDB-SC).

Outros projetos aprovados que receberam destaque foram a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas, que, para virar lei, só precisa da sanção presidencial; a determinação de que, já no ano que vem, toda criança a partir de 4 anos tenha direito a uma vaga na escola pública mais perto de casa; e o fim da Desvinculação de Recursos da União da área de educação. Esse último precisa ainda passar pela Câmara e conta com o apoio da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Estima-se que a DRU tenha retirado R$ 72 bilhões da educação nos últimos 12 anos. Caso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) seja aprovada pelos deputados, o fim da desvinculação passa a valer a partir de 2011.

Ensino superior
O ensino superior também foi contemplado. Enviado pelo Executivo em março, o PL n; 3128/08 tramitou em prazo recorde e acabou aprovado por unanimidade em maio. Com isso, foram criados 27.230 cargos efetivos e comissionados nas universidades e escolas públicas federais para abastecer as 155 escolas técnicas previstas no Plano de Expansão da Rede Federal de Educação Tecnológica, do Ministério da Educação. O desejo do ministro Fernando Haddad era que a matéria fosse enviada como projeto de lei e não por meio de medida provisória.

Presidente da Comissão de Educação do Senado, Cristovam Buarque afirma que, apesar da pauta robusta, a educação ainda é um tema pouco explorado pelos parlamentares. ;A postura reflete o que o eleitor pensa. A educação não é uma preocupação. Por duas razões principais. O brasileiro não coloca a educação como valor fundamental. No máximo, pensa que ser educado é bom porque pode garantir um salário. A segunda razão é política. Tudo que é do pobre é abandonado;, declara.

Para ele, o eleitor ainda pensa muito no que é imediato. ;E a educação só dá resultado a longo prazo.; Mas o senador acredita que começa a haver uma mudança positiva. ;Hoje, o conhecimento virou o grande capital de um país. Como falta mão-de-obra, os empresários perceberam que a revolução do futuro é a educação;, argumenta. No entanto, com a chegada das eleições municipais, a educação deve ter de esperar até o próximo ano para voltar a merecer atenção. ;Tenho poucas expectativas. Como é ano eleitoral, vai haver um grande esvaziamento no Congresso;, diz a deputada Raquel Teixeira.

A frase

"O brasileiro não coloca a educação como valor fundamental. No máximo, pensa que ser educado é bom porque pode garantir um salário"
Cristovam Buarque, presidente da Comissão de Educação do Senado

O número
R$ 950
; o piso salarial dos professores conforme determina lei sancionada em 16 de julho

Diferenças entre a lei e a realidade
Embora reconheça a relevância dos projetos apreciados pelo Congresso Nacional, a presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Justina Iva de Araújo Silva, argumenta que é ;preocupante o fato de os parlamentares estarem a todo momento determinando novas obrigações e exigências para a educação básica sem apontar os caminhos para que seja possível cumpri-las;.

Ela cita como exemplo a lei que garante vagas em escolas próximas de casa para crianças a partir de 4 anos. ;O Legislativo não pode determinar certas coisas se efetivamente não há como garanti-las. Alguns projetos são inexequíveis;, diz. ;Não se pode criar mais despesas. A maioria dos municípios tem o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) como única fonte de recursos para a educação;, afirma.

Somente em Natal, onde atua como secretária municipal de educação, Justina afirma que seriam necessários R$ 1,5 milhão por mês para cumprir a determinação da lei do piso salarial de que um terço das 40 horas semanais deve ser voltado a atividades extracurriculares. ;Teríamos que aumentar em 25% o efetivo de professores. É inviável;, comenta. ;Nós aplaudimos e defendemos a lei do piso, mas é preciso ter muito cuidado. Os gestores das políticas deveriam ser ouvidos.;

Um dos projetos aprovados que poderá desfalcar o orçamento dos municípios e, conseqüentemente, não ser colocado em prática é a obrigatoriedade de toda a rede de ensino básico possuir quadras de esporte. De acordo com dados do Ministério da Educação, em 2006, das 159.016 escolas de ensino fundamental existentes no país, apenas 44.763 possuíam essa estrutura.

Para a oficial de projetos do Unicef Maria Salete Oliveira, mesmo com as dificuldades de execução, a aprovação dos projetos na área de educação foram importantes. Mas ela ressalta que os parlamentares deixaram de fora da pauta uma proposta que considera fundamental para a permanência dos adolescentes na escola. Trata-se do PL n; 1659/2007, que tramita apensado ao PL n; 2877/2008. O projeto garante aos alunos do ensino médio da rede pública material escolar, transporte, alimentação e saúde gratuitos. ;Todos os projetos que fortalecem a permanência no ensino básico são fundamentais;, salienta. (PO)

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