Brasil

Incompatibilidade dificulta transplante para as vítimas da leucemia

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postado em 08/02/2009 09:58
De acordo com o Ministério da Saúde, foram realizados, em 2008, 1.582 transplantes de medula óssea no país. Estima-se que hoje existam 3 mil pessoas na fila de espera. A maior dificuldade é encontrar um doador, como o que ocorreu com Pietro, filho do deputado Beto Albuquerque. No mês passado, a esperança dos que aguardam por um transplante ganhou forças, depois que o ministério oficializou parceria com o maior banco de doadores de medula do mundo, o americano National Marrow Donor Program. O convênio vai permitir que a busca por doadores estrangeiros ocorra de forma mais sitemática. Segundo Carmino de Souza, conselheiro científico da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), metade dos pacientes com leucemia não chega ao transplante de medula óssea porque não encontrou doador ou porque não sobreviveu ao tratamento. Na sua opinião, porém, o maior problema para tratar a doença no país não são os transplantes de médula óssea, mas sim o atendimento inicial. Ele defende um aumento da quantidade de leitos em todos os estados para tratar os pacientes da doença. ;Se isso fosse feito, muita gente seria curada, uma vez que a fase inicial do processo é fundamental para a matar a leucemia.; Carmino diz que isso não ocorre porque o paciente com a doença custa muito ao sistema de saúde, exigindo a atençao de uma equipe multidisciplinar. ;Aqui em Campinas, por exemplo, todas as pessoas que têm leucemia se tratam na Unicamp;, aponta. Mesmo com tantas pesquisas sobre o assunto, os cientistas ainda não sabem o que causa a leucemia. A chefe do Serviço de Hematologia do Instituto Nacional de Câncer (Inca), Jane Dobbin, alerta que alguns fatores ambientais podem influenciar no surgimento da enfermidade. ;O ar que respiramos, muitas vezes poluído, a água, a terra e a alimentação são elementos importantes para os seres vivos;, explica. Além disso, os efeitos da irradiação, exposição a drogas quimioterápicas, fatores genéticos e imunológicos e contato com algumas viroses podem provocar a doença. ;Mas é importante ressaltar que nenhum desses fatores está comprovado como causador da doença;, pondera Jane. Sonho Mobilizada desde o ano passado para encontrar um doador de medula para Bruno Bukvic, 23 anos, Brasília torce pela recuperação do rapaz. Estudante de engenharia mecânica da Universidade de Brasília (UnB), Bukvic está em São Paulo para fazer o transplante, que deve ocorrer nos próximos dias. ;Estamos muito confiantes de que tudo vai dar certo. A esperança de cura é grande;, afirmou ao Correio Gerson Bukvic, pai de Bruno. Foi encontrada uma medula compatível na Alemanha, mas a burocracia para trazê-la ao país obrigou a família a utilizar outra alternativa. ;Para não perder mais tempo e aumentar as chances de cura do Bruno, decidimos realizar um transplante haploidêntico (quando os doadores de medula óssea não precisam ser totalmente compatíveis);, explicou. A mãe do estudante será a doadora. O sonho da família de Bruno é ver o jovem tão saudável quanto o atleta Rafael dos Anjos, 25 anos, está hoje. Foi em novembro de 2004 que o corredor de marcha atlética descobriu que tinha leucemia linfoide aguda. Assim que recebeu o diagnóstico, Rafael foi internado no Hospital Universitário de Brasília, para iniciar tratamento à base de quimioterapia. Ele conseguiu a cura sem o transplante de medula. ;Passei momentos muito difíceis, mas nunca desanimei;, conta (lei depoimento). A maneira como enfrentou a enfermidade fez de Rafael um exemplo de superação. Ainda durante o tratamento, ele conquistou, em junho de 2006, a terceira colocação no Troféu Brasil Caixa de Atletismo, a mais importante competição da modalidade no país. No ano seguinte, na mesma semana em que foi submetido a uma sessão de quimioterapia, conseguiu a prata no Troféu Brasil. Totalmente recuperado, Rafael conquistou, em julho do ano passado, o primeiro lugar na mesma competição. Desde setembro passado, ele integra o elenco da equipe paulista BM, a mesma de atletas como Maurren Maggi e Marilson Gomes. Exame de ponta disponível para crianças do DF Aproximadamente 3 mil casos de leucemia infantil surgem a cada ano no Brasil, de acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Em crianças, 85% das leucemias são da forma linfoide aguda (LLA), 10% são mieloides agudas (LMA) e 5%, mieloides crônicas (LMC). As linfoides crônicas (LLC) não se manifestam nos pequenos. Graças a uma parceria entre a Universidade de Brasília (UnB) e o Hospital de Apoio (HAB), especializado em oncologia infantil, já é oferecido aos pacientes do Distrito Federal o diagnóstico molecular, exame que consegue aumentar a eficiência do tratamento em até 80%. ;O exame, que já está disponível desde o ano passado no HAB, oferece um diagnóstico detalhado da doença;, afirma Cezar Martins de Sá, professor do Instituto de Ciências Biológicas da UnB e responsável pelos estudos que culminaram na implantação do diagnóstico na capital. No HAB, quase 150 crianças já fizeram o exame, que também é oferecido em algumas capitais do Sul e Sudeste. Denominado RT-PCR, o teste permite identificar exatamente o tipo de leucemia presente no organismo. Ao olhar a célula cancerosa no nível molecular, tipo de exame mais refinado que existe hoje, é possível identificar qualquer um dos mais de 10 subtipos da doença entre as crianças. ;A viabilização desse exame só ocorreu graças ao financiamento da Fundação de Apoio à Pesquisa do DF;, destaca Martins de Sá, lembrando que o teste também pode ser aplicado em adultos. ;Esse diagnóstico é parte de um projeto sobre leucemia que pretendemos estender para outras faixas etárias.; Preocupação Com apenas 3 anos, Artur Almeida convive com a leucemia linfoide aguda (LLA) desde 2008. Sua mãe, a auxiliar administrativa Soraia Almeida, 36 anos, lembra que tudo começou em 24 de junho do ano passado. ;Apareceram alguns hematomas na coxa do meu filho. A primeira coisa que veio à minha cabeça foi que ele estava apanhando dos coleguinhas na creche que frequentava desde os 5 meses;, lembra. Soraia estava enganada e, logo em seguida, veio a notícia de que seu filho estava com leucemia. As sessões de quimioterapia são realizadas no HAB. Já se sabe que o pequeno vai precisar se submeter a um transplante de medula, mas exames realizados nos dois irmãos mostraram que um tem 50% de compatibilidade, enquanto o outro tem zero. ;Ficamos muito abalados com tudo isso, mas não vamos desanimar. Meu marido até largou o emprego para acompanhar de perto o tratamento dele;, relata a auxiliar administrativa, que desde o diagnóstico da doença não consegue dormir sossegada. Até sexta-feira passada, Artur se preparava para deixar o Hospital Regional da Asa Sul, antigo Hospital Materno Infantil, onde estava internado para tratar de uma infecção. Depoimento - Rafael dos Anjos ;Nunca duvidei que eu seria curado; ;Naquela época, eu não podia imaginar como uma pessoa saudável poderia ter uma doença tão grave como o câncer. Ainda mais um atleta que dedicava sua vida para o aperfeiçoamento do corpo. Simplesmente não pensava no assunto, até o dia em que recebi o diagnóstico de leucemia. Lembro que o momento foi muito marcante. Eu já estava no hospital havia três dias, sem saber o que estava acontecendo. Eu ia de um lado a outro para fazer exames. Até então, eu nunca tinha ficado mais do que alguns minutos no hospital, por causa de alguns pontos que levei na perna quando era criança. O diagnóstico foi dado por uma médica muito sensível, que me fez entender de forma tranquila o que estava ocorrendo. Foi a primeira vez que chorei no tratamento. Uma coisa muito forte de que me recordo é que nunca duvidei que eu seria curado. Nunca cheguei a pensar em outra possibilidade. Encarei o tratamento como mais uma meta a ser vencida para alcançar o futuro, e logo poder treinar novamente. O tempo foi passando e fui me estabilizando. Comecei a me sentir melhor e as coisas começaram a fluir. Acho que a partir daí, com a cabeça mais tranquila, pude despertar para um mundo que nunca tinha visto antes: minha percepção das coisas simples e fundamentais parecia muito mais clara. Quando a fase mais pesada do tratamento acabou, resolvi recuperar o tempo perdido. Na verdade, queria aproveitar cada segundo e fazer as coisas de que mais gosto: treinar e competir. Agora, porém, não penso apenas nas medalhas e nos resultados. Sei que o maior valor está na jornada, na alegria de poder subir e curtir a evolução do trabalho, passo a passo, a cada dia.;

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