Brasil

Educação: movimento pró-cotas

Grupos que apoiam a adoção de critérios étnicos para a reserva de vagas nas universidades tentam convencer senadores a aprovar o projeto sobre o tema sem modificá-lo. Mas sabem que tarefa é difícil

postado em 25/04/2009 08:00
Estudantes, professores e militantes dos movimentos negro e indígena vão peregrinar pelos gabinetes dos integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal nesta terça-feira. Eles pretendem convencer os parlamentares a votarem, na sessão marcada para quarta-feira, pela aprovação do relatório de Serys Slhessarenko (PT-MT), favorável às cotas raciais em universidades públicas. A proposta, que tramitou por uma década na Câmara, corre o risco de ser modificada e voltar à etapa inicial. ;A resistência dos senadores ao projeto é muito forte. Nosso medo é que fique travado como ocorreu com o Estatuto da Igualdade Racial;, diz Fernando Benício, representante da organização não-governamental (ONG) Educafro. De autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), o projeto de lei que cria o estatuto está parado desde 2003. A presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Lúcia Stumpf, concorda. ;Acho muito difícil que (o projeto) seja aprovado. Mas precisamos defendê-lo;, diz. Reportagem publicada pelo Correio na edição de ontem mostrou que, dos 25 titulares da CCJ, apenas os seis que compõem o bloco de apoio ao governo devem acompanhar a relatora. Nem mesmo o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) deu certeza sobre seu posicionamento. Depois de um ato público que criou o Comitê Brasileiro em Defesa do PLC 180/08, na quinta-feira, ele disse que vai pensar a respeito do assunto. Os demais integrantes não estão convencidos sobre a necessidade da adoção de cotas raciais e preferem a reserva de vagas de corte social, argumentando que, dessa forma, já contemplam os negros, pardos e índios, sem discriminar os demais. ;O negro é o pobre dentro do pobre;, rebate Manoel Barbosa Neres, fundador da Associação Civil Faci, que integra o comitê em defesa do projeto. Para ele, o posicionamento dos senadores é racista. ;Defender apenas as cotas sociais é uma maneira de não tratar a questão como ela de fato é;, sustenta. Em seu relatório, Serys Slhessarenko vai destacar as desvantagens sociais entre negros e brancos, com base em estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Um deles mostra que, em 2006, 16% dos negros com mais de 15 anos eram analfabetos, enquanto o percentual caía para 7% na população branca. Naquele mesmo ano, somente 5% dos negros obtinham diploma de curso superior aos 30 anos ; mesmo índice registrado entre brancos duas décadas antes. ;O hiato racial quase triplicou;, constata a senadora no texto. O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão, sustenta que as cotas raciais não vão favorecer uma etnia em detrimento de outra. ;Não é um privilégio, mas o pagamento de uma dívida histórica com pessoas que foram excluídas da educação brasileira.;
Entenda o caso Discussão desde 1999 Apresentado originalmente em 1999 pela deputada Nice Lobão (DEM-MA), o projeto que cria reserva de vagas nas universidades públicas foi aprovado em 20 de novembro do ano passado, Dia da Consciência Negra, pela Câmara. A proposta passou na forma do substitutivo do deputado Carlos Abicalil (PT-MT) e recebeu, de última hora, uma emenda de Paulo Renato Souza (PSDB-SP), atual secretário de Educação de São Paulo. Na forma como foi aprovado na Câmara, o PLC 180/08 prevê a reserva de 50% das vagas das instituições públicas a estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. Dentro dessas vagas, metade deve ser preenchida por autodeclarados negros, pardos e índios, respeitando a proporção dessas etnias em cada unidade da Federação, de acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A outra metade é destinada a qualquer estudante de escola pública com renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo. No Senado, depois de passar pela Comissão de Constituição e Justiça, o projeto vai para as comissões de Educação e de Direitos Humanos. Daí segue para plenário. Caso sofra alteração, o texto volta para a Câmara e o processo recomeça. (PO)

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