Brasil

O alívio e a consternação de parentes

Equipe do Correio/Estado de Minas acompanha o conforto do reencontro entre familiares e sobreviventes e a tristeza dos que perderam parentes

postado em 03/01/2010 08:41
Pedro Ferreira e Flávia Ayer
Ricardo Beghini e Daniel Antunes

Enquanto um batalhão dos bombeiros e da Defesa Civil fluminense trabalha na retirada de terra e escombros em Ilha Grande, sobreviventes relembram as cenas da tragédia na noite do réveillon. Uma das jovens que saiu viva do soterramento de parte da Pousada Sankay, a estudante Luciana Rattes, que completou 20 anos em 18 de dezembro, retornou ontem para a casa dos pais, em Oliveira, no Centro-Oeste de Minas. Ainda sob efeito de medicação e com escoriações no rosto, ela contou o pesadelo que viveu. ;Estávamos no quarto dormindo, oito pessoas contando comigo: Isabella, Paulo, Éric, Natasha, Yumi, Gustavo e Cris. Era por volta das 3h e não sei o que ocorreu. Não sei se acordei com o barulho ou se foi com alguém me abraçando. Não sei direito. Foi tudo rápido. Quando percebi, os meninos já estavam me tirando de lá;, disse a estudante.

Luciana conta que o cenário à sua volta era de destruição. ;Estava escuro. O Gustavo e o Éric me puxaram do meio da lama. Era desespero. Peguei um barco até uma pousada de uma vila pequena, lá perto, e só três horas depois, eu acho, a Defesa Civil me levou para o hospital;, disse a estudante.

Outra lembrança de Luciana é de ter visto o dono da pousada, Geraldo Faraci, pai da amiga Yumi, com uma lanterna tentando chegar perto deles. ;A gente estava vendo ele com a lanterna e ele gritando por nós, tentando chegar aonde estávamos. Tinha muita terra e ele nos ajudou a sair. Mesmo com a filha lá, ele cuidou da gente;, disse Luciana, que na tarde de ontem ainda não tinha sido informada da morte das amigas Yumi e Isabella.

Às 15h, ela tomava uma sopa preparada pela mãe, a farmacêutica e bioquímica Dulciana Rattes de Castro, 53 anos, que a todo momento agradecia a Deus a volta da filha. ;Não tenho nem palavras para dizer o quanto estou feliz;, repetia. Antes mesmo de tomar conhecimento da tragédia, Dulciana recebeu uma mensagem da filha pelo celular dizendo que estava bem. Na tarde de ontem, a maior preocupação da mãe era sobre como informar a filha das mortes de Yumi, Isabella e Paulo Sarmiento. ;A toda hora ela pergunta, mas a gente fala que não tem notícias. Estamos esperando a hora certa.;

Silêncio

O restaurante Kabuto, na rodovia MG-030, em Nova Lima, que pertence à empresária Lígia Imanishi, tia da jovem Yumi Imanishi Faraci, abriu as portas ontem, mas pouca gente foi ao local. Irmã de Sônia Yumi, proprietária da Pousada Sankay, Lígia viajou ao Rio e ajudou no reconhecimento(1) dos corpos. ;A Yumi sempre vinha aqui com as amigas e era alegre e simpática. Adorava a família;, lamentou Jocimara da Silva, 22 anos, auxiliar administrativa do restaurante.

1 - Uma triste confirmação
O corpo da estudante mineira Yumi Faraci, 18 anos, filha dos proprietários da Pousada Sankay, foi reconhecido no início da tarde por parentes no Instituto Médico Legal (IML) do Rio de Janeiro. De lá, seguiu para Belo Horizonte, onde será cremado hoje. Asfixia e politraumatismo são as principais causas de morte atestadas nas certidões de óbito das vítimas. O IML do Rio de Janeiro reforçou a equipe e atua com cerca de 50 profissionais.

Operação de guerra

Atracado em frente aos escombros da Pousada Sankay, na Praia do Bananal, em Angra dos Reis, um barco foi carregado ontem com colchões, cobertores e caixas com utensílios. Foi o pouco que sobrou do empreendimento inaugurado em 1994, soterrado na madrugada do dia 1; por uma avalanche de terra, pedras e árvores. Sete casas também foram atingidas. No meio da lama e dentro do mar, cerca de 150 homens dos bombeiros, Defesa Civil e Polícia Militar, usando retroescavadeiras, cães farejadores, pás e enxadas procuravam por mais vítimas da tragédia. Vinte e oito corpos tinham sido resgatados até as 18h e o número de desaparecidos era estimado em 15. Helicópteros transportando água e equipamentos sobem e descem a todo momento na ilha. Cinco embarcações da Marinha fizeram uma barreira no mar para evitar a aproximação de curiosos. No início da noite de ontem, o prefeito de Angra dos Reis, Tuca de Jordão, pediu à Eletronuclear o desligamento da Usina Nuclear de Angra dos Reis com base nos Planos de Emergência Nuclear. Ele fez o pedido porque o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) acaba de interditar a Rio-Santos na altura do KM 477, em Tapiatuba, próximo ao um dos acessos a Angra. Houve trincas na pista.

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