Cidades

Guerra em paz

Colecionadores de material bélico preservam tanques, canhões, jipes, armamentos e equipamentos usados em grandes batalhas. e até medalhas de Adolf Hitler

postado em 27/04/2009 08:39
Brasilienses guardam armas capazes de derrubar aviões e prédios inteiros. São tanques, canhões, lança-foguetes. Alguns estão apontados para o Lago Paranoá e até o Palácio da Alvorada. Outros, para vias movimentadas e residências. Mas nada representa ameaça à segurança nacional, muito menos aos moradores. O arsenal, em sua grande parte desativado, pertence a colecionadores. Gente pacífica, sem nenhuma atividade militar, mas aficcionada pelas histórias das guerras. Colecionadores que gastam parte dos salários em compra e restauração de material bélico. Compram ainda uniformes, capacetes, medalhas, mapas, tudo que diz respeito a grandes exércitos e batalhas. Parte deles decidiu se organizar para trocar informações em torno do gosto comum. Surgiu assim a Associação de Colecionadores de Veículos Militares e Material Bélico do DF. A entidade é mais conhecida como Velhos Amigos de Guerra (VAG). Fundada em julho de 2003, tem 24 integrantes. Ao todo, eles conservam 34 veículos militares. Quase todos em condições de rodar. Além disso, alguns colecionam peças específicas. É o caso do presidente da VAG, Ricardo Ferreira, 42 anos. Procurador federal, ele mantém em casa, no Park Way, um jipe, dois caminhões de transporte de tropas e dezenas de rádios militares antigos. ;Me especializei em rádios. Tenho ainda uniformes e livros, mas nenhuma arma;, ressalta ele, um pacifista convicto, líder de grupo escoteiro. Como os demais integrantes da VAG, Ricardo se preocupa com a preservação da memória do Exército brasileiro, em especial a história da Força Expedicionária Brasileira (FEB) nas batalhas da Segunda Guerra Mundial (1940-1945). No momento, por exemplo, eles ajudam a montar um acervo com fotografias antigas de militares brasileiros. ;Tudo que encontramos, copiamos e mandamos para um outro grupo de colecionadores do Rio de Janeiro, que organiza e mantém tudo em um museu;, explica. Herança paterna Ricardo começou a se interessar pelo militarismo ainda criança. ;Meu pai era um funcionário civil da Presidência da República. Eu o acompanhava e via muitos carros militares. Logo comecei a pedir para comprar jipes de brinquedo. Na fase adulta, comprei os meus jipes;, conta o procurador. O filho dele, Juliano, 10 anos, segue o mesmo caminho. Tem uma pequena coleção de jipes e caminhões em miniatura. A filha, Vitória, 7 anos, deu nome a um jipe de verdade do pai. O advogado e professor universitário Carlos Felipe Alencastro Carvalho, 60, também sofreu influência do pai, um militar do Exército. Carlos estudou em colégio militar e foi cadete da Academia Militar, no Rio de Janeiro. Mas largou a farda para se dedicar ao direito. No entanto, deu enorme orgulho ao pai, que entrou para reserva como general, ao começar a comprar jipes militares. Teve seis. Hoje, exibe um bem conservado e imponente caminhão da brasileira Engesa fabricado em 1976. A relação de Aloísio Lopes de Souza com o universo militar é ainda mais próxima. O pai lutou como soldado na Segunda Guerra. Do pracinha da FEB, Aloísio ganhou diversas miniaturas de blindados. ;Também o meu primeiro jipe, de lata, verde, com a estrela do Exército americano no capô. Foi meu primeiro velotrol;, recorda-se. Há 30 anos, ele começou a montar um jipe norte-americano de verdade, da cor bege, modelo 1942, fabricado para a Segunda Guerra. Em três anos, o veículo estava como um novo. O jipe de Aloísio, sonho de consumo dele, é uma raridades da VAG. Hoje, aos 57 anos e trabalhando como mecânico, ele cuida também dos xodós de outros colecionadores, como Luciano de Castro, 46. O fiscal ambiental do governo local decidiu comprar jipes e caminhões militares justamente por causa do trabalho. ;Como sempre gostei de natureza, tive meu primeiro jipe aos 20 anos. Os meus veículos uso no dia a dia, para trabalhar.; E para viagens por lugares inóspitos, como o Jalapão, no Tocantins. AUTORIZAÇÃO Para colecionar veículos militares que carregam armamentos, como os tanques, é preciso ter autorização do Exército. O mesmo vale para itens como granadas e canhões. O acervo do Museu de Armas e História Militar Caramaschi, por exemplo, é autorizado.

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