Cidades

Superação, meta contagiante

Para pessoas como o mecânico Adriano Silva, limitações físicas não significam o fim de um sonho. Apostando em seu talento e amparado por um projeto inovador, ele vai, em breve, compor uma orquestra formada por pessoas em situação especial

Juliana Boechat
postado em 17/10/2009 09:00
<I>Adriano: " />Adriano Silva, 31 anos, não vê a hora de começar as aulas de música. Ele sonha com o dia em que poderá ganhar dinheiro tocando violino, e não como mecânico em uma fábrica de cadeira de rodas. A oportunidade de aprender a tocar um instrumento apareceu há pouco mais de um mês graças a seu chefe e presidente do Instituto Cultural, Educacional e Profissionalizante de Pessoas com Deficiência do Brasil (Icep) (1), Sueide Miranda Leite, que lhe ofereceu uma vaga no projeto Roda Viva. Adriano aceitou o convite imediatamente e foi o primeiro a se matricular. A partir de janeiro do próximo ano, ele estudará violino e participará da organização de uma orquestra sinfônica e de um grupo de choro compostos por cadeirantes do Distrito Federal, com apoio de Guilherme Klava, bacharel em violino pela Escola de Música e Artes da Universidade Federal de Goiás.

Cadeirante há pouco mais de três anos, Adriano sempre fez questão de ser útil com suas habilidades. Passou por setores de telemarketing e há pouco mais de um mês foi contratado pelo Icep. Trabalha todos os dias, das 8h às 18h, na fábrica de cadeiras de roda no quintal do instituto, no Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA). Com uma camiseta de futebol do Brasil número 7 do jogador Adriano, o mecânico aperta parafusos e remonta cadeiras de roda. Ele ficou paraplégico ao levar um tiro na quinta vértebra em uma festa no Setor O. Passou por tratamento no Hospital Sarah Kubitscheck e nunca desistiu de lutar pela vida. Casou-se, viu o filho nascer e leva a vida normalmente. Ao ouvir os acordes do violino de Guilherme, decidiu que queria seguir os passos do professor. ;Minha mulher ficou orgulhosa quando contei a ela das aulas de música. Dá vontade de chegar logo ao ano que vem. Dá até vontade de andar;, contou.

A ideia de desenvolver um projeto dessa magnitude partiu do violinista goiano Guilherme. Ele pretende começar as aulas do novo projeto em janeiro do próximo ano e, em quatro meses, deixar os alunos prontos para uma apresentação no cinquentenário de Brasília, em 21 de abril. Em casos como este, em que os participantes não são profissionais, um músico experiente guia a orquestra e faz os solos das composições famosas. ;O grande desafio é que o grau de dificuldade elevado dos instrumentos de corda;, explicou Guilherme. O primeiro passo do professor será desenvolver a sensibilidade do ouvido dos alunos para que eles percebam os intervalos musicais. A partir de então, ensinará sobre a história e manutenção dos instrumentos e, finalmente, a tocar.

Otimista, Guilherme espera ver a primeira turma de alunos regendo sozinha uma orquestra em dois anos. Para isso, se esforçará ao máximo para garantir um ensino de excelência a essas pessoas. Analisa até mesmo a possibilidade de se mudar para Brasília, a fim de acompanhar o projeto de perto. ;Os participantes serão multiplicadores de qualidade. A evasão nas escolas de arte é muito grande, então o convívio é fundamental. Vamos desencadear um quadro irreversível no Brasil;, disse, animado. Experiente na área, Guilherme acredita ser essa a primeira orquestra formada por cadeirantes no Brasil. O professor escolheu Brasília para efetivar o trabalho porque, além de ser uma cidade próxima à sua terra natal, contou com apoio do Icep para colocar a ideia em prática. ;Juntou mão e luva;, comemorou.

O Roda Viva é um dos vários projetos desenvolvidos pelo Icep. Criado em 1999 pelo atual presidente Sueide Miranda Leite, o instituto desenvolve oficinas variadas que proporcionam a capacitação do deficiente físico. Dessa forma, a pessoa consegue voltar ao mercado de trabalho e ainda incrementa a renda da casa no fim do mês. Hoje, são 6 mil associados. Em setembro deste ano, 45 pessoas foram encaminhadas a algum trabalho e 18 empregadas. Para investir nesse novo projeto, Sueide pretende erguer, a partir de janeiro de 2010, 14 salas com acústica em um espaço de 500m; para os mais de 120 alunos esperados. ;Queremos alcançar as pessoas que ficam em casa sem fazer nada porque recebem o Benefício da Prestação Continuada do governo federal concedido a quem não consegue mais trabalhar. Sem atividade, o cadeirante desenvolve feridas e problemas de saúde;, concluiu o presidente.


Pioneirismo
Em 2008, o Icep se tornou a primeira entidade a fomentar o basquete de cadeiras de roda de Brasília. O instituto ajudou a estruturar um time que já existia. Montou novas cadeiras de roda, doou bolas e ainda conseguiu, com parcerias, bolsa atleta para todos os integrantes do time. Assim, eles puderam investir integralmente no esporte. Em apenas um ano, o retorno: o grupo ganhou o troféu de primeiro lugar na terceira divisão do Campeonato Brasileiro da categoria.


INSCRIÇÕES ABERTAS
Os interessados em participar, conhecer ou ajudar o projeto Roda Viva podem procurar o Icep. O instituto fica no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), Trecho 3, Lote 1240. O telefone para contato é 3031-1700.

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