Cidades

Erosão com profundidade de 40m rasga Planaltina de Goiás e preocupa

Luiz Calcagno
postado em 14/01/2011 08:06
A cada chuva, a cratera avança. Nos últimos dias, as águas levaram mais 4m de terra, ampliando o abismo, que já engoliu muros, árvores e cercasCom mais de três quilômetros de extensão e, em alguns pontos, com uma profundidade superior a 40 metros, uma erosão que corta parte da cidade de Planaltina de Goiás ; município do Entorno, distante 58 quilômetros ao Norte do centro de Brasília ;, amedronta moradores e preocupa a prefeitura. O buraco tem mais de 30 metros de largura e a cada chuva vem se expandindo há cerca de 20 anos. No início tinha menos de um metro. Em pontos, como nas Quadras 1 e 2, do Módulo Residencial 6 do Setor Oeste do município, a largura da cratera aumentou quase 4 metros nos últimos dias. Um trecho da pista voltada para a voçoroca foi engolida. O que restou está rachado em forma de mordidas e avança em direção às residências. Algumas casas estão a menos de 1,5 metro do abismo. Segundo levantamento da Defesa Civil, um total de 39 famílias foram afetadas, das quais 10 foram retiradas da área e 12 estão em situação crítica.

O abismo ameaça também um hospital particular. Situado na Rua 7 do mesmo setor, a unidade de saúde está a menos de 20m do buraco. Chácaras na região também estão na rota de expansão da cratera, que já engoliu muros, torres, árvores e cercas. Segundo moradores, um homem e uma criança de dois anos morreram ao caírem no abismo nos últimos anos. As paredes de terra exibem diversas rachaduras em todo o percurso. Manilhas de capitação de águas pluviais deságuam no local piorando ainda mais a situação.

A chuva desestabiliza ainda mais o solo e aumenta a sensação de insegurança da população. Embora a prefeitura garanta R$ 400 de auxílio aluguel, a maioria dos moradores mais afetados preferiu ir para a casa de parentes. A última a partir, a dona de casa Maria Aparecida, que morava com o marido e três filhas em uma casa da Quadra 1, saiu às pressas, debaixo de chuva, com ajuda de um caminhão de mudança da Secretaria de Assistência Social do Município. ;Moro aqui há muito tempo. Sempre estivemos próximos do buraco. Mas, agora, com as chuvas, está desbarrancando tudo e ficou muito mais perigoso;, disse.

Resistência
A família da dona de casa Raquel Cardoso de Moura, 31anos, decidiu ficar. Os integrantes do grupo assinaram um termo assumindo a responsabilidade pelos riscos. Ela disse que não sairão se não tiverem um lugar certo para ir, já que são donos do terreno. Raquel disse que, ao procurar uma imobiliária, ouviu do responsável pelo estabelecimento que nenhuma empresa do ramo aluga casas para a prefeitura, porque o órgão não paga o aluguel em dia. ;Não vamos morar em uma escola. Somos donos do terreno e não temos para onde ir. Quando não tiver mais jeito, a gente muda. Hoje estou em área de risco, mas quando vim morar aqui o buraco estava muito mais distante e menor;, contou.

Medo
Para o porteiro Rosélio Alves dos Santos, 22 anos, mudar não seria problema se ele conseguisse uma casa para alugar. Ele mora na residência que fica exatamente em frente ao local onde a erosão devorou a rua. Caso se estenda ainda mais, a ravina engolirá o muro. O buraco foi até a calçada. Para engolir o trecho e interromper a passagem de veículos foram apenas quatro dias. Com a mulher, ele já decidiu, não sairá enquanto não tiver um lugar para ir, mesmo ;com medo;. ;Não sei o que pode acontecer daqui pra frente. A Defesa Civil me pediu para sair, mas até agora não encontrei outro lugar. Ainda bem que moro de aluguel. Muita gente perdeu a casa;, lembrou.

O médico Wilson atribui o problema ao escoamento de água da cidadeO secretário de Transportes e Serviços Urbanos, Ronaldo Portilho, lamentou que a situação tenha chegado a esse ponto. Segundo ele, o prefeito decretou estado de emergência no município, e nós aguardamos um parecer da Secretaria Nacional de Defesa Civil. O local deve se transformar em uma galeria, mas a obra custaria R$ 40 milhões. ;Já solicitamos recursos da União. A prefeitura não tem dinheiro para bancar essa obra. Precisamos de apoio dos governos estadual e federal.Não queremos nos isentar da responsabilidade;, disse.

No entendimento da secretária de Assistência Social do município, Beralice Lourenço de Oliveira, a prefeitura está dando à população atingida ;todo o apoio ao seu alcance;. A casa de Maria Aparecida, por exemplo será demolida. A secretária garantiu que a dona de casa ganhará um barraco, a ser construído no lote da mãe de Maria. Ela acredita que, mesmo a contragosto quem estiver em área de risco vai deixar o local antes que algo pior aconteça. ;Mesmo quem assinou um termo de responsabilidade está saindo. Não vamos deixar ninguém desassistido;, afirmou.

Fenômeno
A voçoroca é uma ferida aberta na terra, causada por erosões e agravada nos períodos de chuva. Também conhecida como ravina, ocorre em solos frágeis ou com vegetação escassa, e na encosta de morros. Os desmatamentos contribuem para o avanço das voçorocas.

Exigências
; Para que a decretação de estado de emergência em um município seja reconhecida pelo governo federal, a prefeitura deve fazer o credenciamento na página virtual do Ministério da Integração Nacional (www.convenios.gov.br). Em cada estado há uma unidade para que o prefeito cadastre o projeto a ser realizado a fim de sanar ou amenizar um problema que afeta a população com recursos federais. No caso de Planaltina de Goiás, a prefeitura deve negociar a aprovação do projeto diretamente no ministério. A equipe técnica da pasta analisa o pedido do município e solicita, se necessário, informações complementares para aprovar o projeto. Cabe ao ministério ainda acompanhar a execução das obras e avalia as prestações de contas.

Morador culpa prefeitura
O trecho onde se formou a cratera era um vale coberto de vegetação. Em 2000, era possível atravessar a pequena erosão, comum em áreas de cerrado. Mas a prefeitura da cidade teria canalizado as águas pluviais, que criavam lagoas no centro de Planaltina de Goiás, para a erosão. O que seria uma grota se transformou em um desastre, que hoje coloca em risco residências e a vida de moradores. ;Isso foi uma tragédia anunciada ao longo dos últimos anos;, afirmou Guiomaci Brandão, administradora do hospital particular, situado às margens da cratera.

Segundo ela, há mais de 10 anos que a direção do hospital e a associação de moradores do Setor Oeste pedem uma providências à prefeitura. Nada foi feito. A ravina se tornou uma vizinha inconveniente e perigosa. A terra que cai com as chuvas é levada para o Córrego Lambari, que está assoreado. ;As pessoas estão perdendo suas casas. Nós somos o primeiro hospital do município. Damos emprego para 30 famílias. O que vamos fazer com essas pessoas se formos interditados? A prefeitura procura o governo do estado e da União, e nós ficamos sem respostas;, reclamou Guiomaci.

Omissão
Situado em uma área que tinha sido reservada para ser um setor hospitalar no início de Planaltina do Goiás, o hospital não está próximo o bastate da ravina para ser interditado, mas sem uma obra de contenção, o risco existe. Para a administradora da unidade, a maior causa do buraco não é a chuva, mas ;um total desinteresse e omissão das autoridades do município nos últimos 15 anos;.

O cirurgião-geral Wilson Brandão, dono do hospital, reclamou das manilhas que desembocam na erosão, trazendo a água de chuva do centro da cidade. ;Isso desgasta ainda mais a grota. É uma irresponsabilidade;, acusou.

O chacareiro José Gomes da Silva, 61 anos, tem, com o pai e os filhos, quatro chácaras à beira do abismo, onde criam gado leiteiro. Ele contou que a erosão ainda não ameaçou sua residência, e não cresceu na sua parte nos últimos anos, mas caso tenha que sair dali, exigirá que o município pague a ele, em dinheiro, tudo que investiu no lugar. ;Antigamente, pulávamos a grota para ir de um lado a outro, mas ninguém cuidou dela e ela cresceu. Agora virou esse problema. Lá dentro é pura lama;, contou.

A prefeitura quer que o Ministério da Integração Nacional reconheça o estado de emergência decretado dia 4 último e libere recursos para conter o avanço da cratera. De acordo com o procurador-geral de Planaltina de Goiás, Benedito Castro da Rocha, a expectativa é de que, até a próxima semana, a Secretaria Nacional de Defesa Civil, vinculada ao ministério, reconheça a decisão da prefeitura. ;Tínhamos reunião marcada com o secretário, Humberto Vianna, mas ele teve que ir a São Paulo para atender outras urgências. Mesmo assim, eles estão analisando nosso decreto. A fase seguinte será a liberação da verba;, explicou.

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