Cidades

Distritais arquitetam tática para livrar Benedito Domingos de investigação

Investigado pela Justiça por suspeita de direcionar licitações para favorecer empresas de familiares a vencerem concorrências, deputado pode escapar de investigação na Câmara sob o argumento de que os fatos ocorreram na legislatura passada

Ana Maria Campos
postado em 21/02/2011 07:00

Família lucrou R$ 14 milhões com a locação de enfeites natalinosIndiciado pela Polícia Civil por fraude em licitação e formação de quadrilha, o distrital Benedito Domingos (PP) pode se livrar da punição política com o argumento de que os fatos apurados pela Justiça se referem à legislatura passada. A justificativa deve ser recebida com boa vontade por colegas da Câmara Legislativa que, em nome do espírito de corpo e em troca de lealdade, podem ajudar o distrital a evitar o constrangimento de responder a um processo por quebra de decoro parlamentar. A operação para salvar Benedito Domingos de um processo que pode resultar até em cassação de mandato está sendo trabalhada nos bastidores e vai se escorar na tese de que a atual legislatura não tem competência para investigar e julgar eventuais irregularidades pretéritas. Benedito Domingos é acusado de agir em conluio com integrantes do governo de José Roberto Arruda para direcionar licitações de locação de enfeites natalinos para empresas vinculadas à própria família. As suspeitas de favorecimento recaem sobre um montante de R$ 14 milhões. Quebra de decoro De acordo com investigação da Polícia Civil, o direcionamento de concorrências públicas a empresas ligadas a familiares de Benedito ocorreu no segundo semestre de 2008. À época, Benedito já era distrital, mas diante da ameaça de processo por quebra de decoro alegará que foi reeleito para uma nova legislatura que já não guardaria conexão com o mandato passado. O argumento foi conversado por um grupo de deputados dispostos a arrumar uma solução jurídica para a situação do colega. O que se encontrou foi um caso que será usado como uma espécie de jurisprudência para Benedito. Trata-se do episódio ocorrido em 2007 com Gim Argello (PTB), que, à época era o suplente de Joaquim Roriz, então filiado ao PMDB. Com a renúncia de Roriz, que deixou o cargo para se livrar da cassação do mandato, o suplente assumiu o posto, mas foi imediatamente alvo de uma representação por parte do PSol, que o acusava de corrupção (leia memória) e alegava quebra de decoro. O processo contra Gim, no entanto, não prosperou, já que a Procuradoria da Casa se posicionou pelo arquivamento da ação alegando falta de competência por se tratar de acusações anteriores à diplomação do político no Senado, mesmo fator temporal que agora pode salvar Benedito de um calvário político. ;Pode até ser imoral, mas é legal. O fundamento está sendo trabalhado e pode evitar, inclusive, que uma eventual representação contra Benedito passe da Mesa Diretora;, afirma um distrital que soube das ações para livrar Benedito do processo político, mas prefere manter sigilo para evitar desgaste com os colegas. A tática para poupar Benedito estaria sendo costurada na Mesa Diretora com o respaldo do Grupo dos 14, ao qual o deputado pertence. Na turma, há nomes de deputados dispostos a criar uma rede de proteção até mesmo em função de suas próprias fragilidades. Há distritais que conseguiram se reeleger, mas convivem com o fantasma da Caixa de Pandora. É o caso de Aylton Gomes (PR), Roney Nêmer (PMDB) e Benício Tavares (PMDB), que tiveram seus processos políticos arquivados na legislatura passada, mas aguardam os desdobramentos das investigações na Justiça. No caso de Benedito Domingos, ainda não há uma representação contra ele na Casa em função do indiciamento por fraude, o que não evitou, no entanto, a antecipação da estratégia de salvamento do político. O que existe de concreto é um pedido de CPI apresentado por um advogado à Mesa Diretora. Ocorre que a abertura de comissão de inquérito não é o expediente mais adequado nesse caso. Quando paira suspeita contra parlamentares o instrumento é a representação por quebra de decoro. Sem resistência Integrantes da Mesa Diretora ouvidos pelo Correio negam qualquer movimento para evitar a investigação contra Benedito. O presidente da Câmara, deputado Patrício (PT), afirma que se houver uma representação contra o colega, o caso seguirá o trâmite da apuração. ;Vamos remeter à Corregedoria, desde que haja embasamento legal e que os requisitos da ação sejam observados;, afirmou. Patrício lembrou que o indiciamento de Benedito por fraude em licitações ocorreu este ano, o que justificaria uma eventual investigação por parte da nova legislatura. Assim como Patrício, Joe Valle (PSB), que também integra a Mesa Diretora, demonstrou que não fará resistência à apuração contra o colega: ;Sacanagem não tem prazo de validade. Se foi feita, precisa ser investigada;. ;Em nenhuma reunião da Mesa em que estive presente foi discutido o caso Benedito. Mas, se o assunto for colocado em pauta, vou me posicionar no sentido de que a Câmara deve investigar toda e qualquer denúncia sobre todo e qualquer parlamentar;, disse Raad Massouh (DEM), segundo secretário da Casa. O corregedor da Câmara, Wellington Luís (PSC), diz que, independentemente da vontade dele de investigar, depende da Mesa Diretora para que possa começar seu trabalho. ;Se algum dia a Mesa Diretora enviar processo por quebra de decoro contra Benedito, iniciarei minha apuração com base na Justiça e no bom senso;, promete. O Correio procurou Benedito Domingos, que preferiu não se posicionar. Uma carreira de confusões

Veja as confusões em que Benedito Domingos (PP) se envolveu recentemente: ; Caixa de Pandora Pivô da maior crise política do DF, o ex-secretário de relações institucionais do governo Durval Barbosa contou ao Ministério Público que, em nome do PP, Benedito Domingos teria cobrado R$ 6 milhões para apoiar a candidatura de José Roberto Arruda à chefia do Executivo em 2006. Em função da denúncia, Benedito Domingos tornou-se alvo de investigação do MP que, em agosto do ano passado, conseguiu na Justiça o bloqueio dos bens do deputado até o julgamento da ação de improbidade. ; Contas reprovadas Por unanimidade, a Corte do TRE reprovou a prestação de contas de campanha do distrital ao considerar que Benedito emitiu recibos eleitorais indevidos e incluiu no balancete receitas que não existiram. Por lei, os candidatos são obrigados a indicar quanto gastaram e os valores que receberam em doações, bem como a origem desse dinheiro. O suplente da coligação pela qual Benedito foi eleito, Juarez Oliveira, entrou na Justiça para pedir o mandato do titular. ; Fonte Luminosa O distrital destinou dinheiro de emendas para a construção das fontes luminosas do Taguapark e da Torre de TV, que ficou pronta no ano passado e se tornou uma atração turística. O valor indicado por Benedito beneficiou a empresa representada em Brasília por um dos filhos dele. Por conta do suposto direcionamento, Benedito terá de prestar esclarecimentos à polícia sobre seus interesses nas obras. A procuradora-geral de Justiça, Eunice Carvalhido, pediu a abertura de inquérito policial para investigar o suposto favorecimento. ; Decoração natalina Inquérito da Polícia Civil sustenta que as licitações para locação, pelo GDF, de enfeites de Natal para enfeitar a cidade foram direcionadas a empresas vinculadas à família de Benedito. Um filho, um neto e uma nora do distrital, além de empresários, foram indiciados por formação de quadrilha e fraude em licitação porque teriam, de acordo com o inquérito, participado do conluio para que firmas ligadas ao distrital vencessem as concorrências no segundo semestre de 2008. As investigações da Polícia Civil também responsabilizaram o ex-governador José Roberto Arruda.

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