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Moradores lutam para revitalizar Capela São Geraldo no Paranoá

Segundo templo mais antigo da capital, a Capela São Geraldo, no Paranoá, tornou-se moradia de vândalos. Moradores da região brigam para revitalizar o local e, assim, preservar um pouco da própria história

Deborah Fortuna
postado em 15/03/2017 06:00
Grupo de moradores luta para manter o pequeno templo em atividade: recordações e história
De símbolo de fé a espaço abandonado, a Capela São Geraldo agora é um abrigo para vândalos durante a noite. O sino de bronze, que ficava na entrada, sumiu, assim como o relógio e as imagens de santos que antes ornavam a igreja. A cruz, no interior do prédio, sobrevive como o único símbolo religioso que sobrou de um local que já foi ponto de encontro dos fiéis do Paranoá. Os bancos de madeira, quebrados, hoje, servem como cama improvisada para invasores. Sujeira, fezes e janelas quebradas agora entram para um capítulo dos 51 anos da história desse patrimônio do Distrito Federal.
Ainda em 2014, a capela, localizada no Parque Vivencial do Paranoá, viveu um momento de esperança, quando foi reinaugurada, depois de ter sido demolida no ano anterior. A reforma custou R$ 282 mil, mas os moradores da região contam que o templo só recebeu quatro eventos ; três missas e um casamento ; desde então. Uma década antes, uma parte da construção cedeu e a demolição se fez necessária para preservar a segurança das pessoas. Na época, sobrou apenas a escadaria de concreto, que não levava mais a lugar algum. Fundada em 1966, ela é a segunda igreja mais antiga da capital e, durante 34 anos, permaneceu como a única do Paranoá.

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De acordo com moradores da região, o templo atendia aos trabalhadores que vieram para a nova capital para construir a barragem. ;Nós queremos que seja restaurado esse patrimônio histórico e que ele passe a ser um ponto da comunidade do DF. E também que seja um museu vivo da história do Paranoá;, explica o coordenador do Movimento em Defesa do Patrimônio da Capela São Geraldo, João Gomes Pereira, 57 anos.

Ele também conta que a igreja tem uma ligação histórica com muitos moradores da região e que esse é um dos motivos pelos quais eles lutam para que o lugar sobreviva a essa nova onda de abandono. ;Roubaram as fiações, todas as caixas de energia, quebraram tudo. Esse patrimônio, para nós, não tem preço. Eu fui um dos primeiros coroinhas daqui, fui catequista e toquei músicas durante as missas;, relembra.

O aposentado Ataíde Pereira das Neves, 82, também tem uma história de décadas com a igreja. Ele estava presente no momento da construção, nos anos 1960, quando o lugar ainda era apenas uma mata fechada e abandonada no meio do parque. Os quatro filhos foram batizados no templo. ;Eu tenho um filho com 51 anos que foi batizado aqui. Vinha gente de todos os lugares, e ocorriam muitos eventos naquela época.;

Abandono

A degradação pode ser vista de longe. E a única companhia de quem visita o lugar é um ninho, abrigado em cima da porta de entrada. O cheiro é insuportável por causa da sujeira que os invasores fazem. É justamente esse descaso com toda a história do lugar que o professor José Moreira Portela, 61, indigna-se. Ele também foi um dos coroinhas que participavam das missas quando o lugar ainda era símbolo cristão. ;Agora, está parecendo uma igreja fantasma.;

Josefa Moraes Sobrinha, 91, e o pioneiro Manoel Martins dos Reis, 78, desembarcam em Brasília poucos anos antes da construção da cidade, ainda na década de 1950. Os dois não só participaram ativamente da construção da capital federal como também viram a igreja nascer e crescer, tijolo por tijolo. Moradora desde 1986 do Paranoá, Josefa acredita que o templo é uma lembrança viva do patrimônio histórico da cidade. ;Eu considero essa igrejinha aqui a mãe de todas as outras igrejas;, afirmou. E mesmo Manoel, que hoje segue outra religião, disse que se sente honrado em ter seu nome ligado à história do lugar. ;Foi nessa igreja onde eu criei meus filhos.;

A Secretaria de Cultura do Distrito Federal informou que, apesar de ser tombada, a responsabilidade da Capela São Geraldo seria da Cúria ; parte administrativa da Arquidiocese de Brasília. A pasta também afirmou que enviou um memorando à organização responsável em outubro de 2016, relatando os problemas e sugerindo opções para a revitalização do lugar. Até o fechamento desta edição, a Arquidiocese não se pronunciou sobre o assunto.

Linha do tempo
1966 ; Fundação
1993 ; Tombamento
2003 ; Demolição
2013 ; Reconstrução
2014 ; Reinauguração

Para saber mais

O santo que não é santo
Apesar de muitos acharem que o nome da capela é um louvor ao santo italiano de mesmo nome, na verdade, a homenagem é para um homem comum. Antes de ser São Geraldo, havia uma igreja chamada São Pedro, que funcionava no Parque Vivencial do Paranoá, próximo à quadra de esportes. Como as missas eram celebradas no domingo, isso incomodava os moradores das construções próximas. Diante de tantas reclamações, houve uma negociação para o templo mudar de lugar. Um engenheiro da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil e responsável pelo acampamento do Paranoá, chamado Geraldo, tinha alguns materiais de sobra e preparou o terreno para que a nova capela fosse construída. A comunidade ficou tão agradecida pela ajuda que deu o nome dele ao espaço de oração.

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