Ciência e Saúde

Para quem tem fibromialgia, há momentos em que até respirar provoca sofrimento

A doença acomete cerca de 4% da população brasileira, estimam os médicos

postado em 27/08/2009 08:15

A doença acomete cerca de 4% da população brasileira, estimam os médicosQuando a dor se torna uma companhia inseparável, cada dia é encarado como um grande desafio. Tarefas corriqueiras da vida se transformam em suplício. Caminhar dói, sentar dói, deitar também. Por vezes, até respirar é um sofrimento. Em momentos de crise, um simples abraço ou toque, por mais delicados que sejam, são torturantes. Quem convive com a fibromialgia conhece bem a anatomia humana e tem uma indesejada intimidade com sensações tão doloridas que sequer são imagináveis por aqueles que não são reféns do problema.

O sofrimento dos fibromiálgicos, porém, vai além do que é sentido no corpo. A doença era vista como um distúrbio psíquico e confundida com a depressão até bem pouco tempo atrás. Para os olhos alheios, a dor era fruto da imaginação ou do exagero. Hoje, a causa da fibromialgia ainda é um mistério, mas estudos comprovam que o mal é realmente físico e acomete cerca de 4 % da população brasileira. Em idosos com mais de 65 anos, a prevalência é de 7,5%. As mulheres são as mais atingidas.

A fibromialgia é caracterizada por dor muscular e esquelética crônica e difusa, fadiga e comprometimento do sono. No entanto, geralmente traz consigo uma série de transtornos, como rigidez nos músculos, enxaqueca, confusão mental, défice de memória, palpitação, tontura, depressão e muitos outros. O diagnóstico nem sempre é imediato. É preciso descartar outras patologias que também causam dores difusas. De acordo com o reumatologista Rodrigo Aires Correa Lima, eventos físicos e emocionais estressantes ou traumáticos são capazes de desencadear a doença, mas ainda não se sabe se ela pode surpreender qualquer um ou se ocorre apenas em pessoas predispostas ao mal.

Alerta
O médico lembra que, em homens e mulheres saudáveis, a dor é um alerta, um sinal de que algo está errado no organismo. Para quem tem fibromialgia, contudo, a dor por si só é a doença. ;Os sintomas nem sempre são compreendidos por médicos que conhecem pouco a síndrome. A fibromialgia não causa deformidades físicas e os pacientes têm o aspecto saudável. Atendo casos de fibromiálgicos que sofreram por quase uma década antes de conseguirem tratamento adequado. Para confirmar o diagnóstico, nos baseamos no histórico do paciente e da dor, que deve ser generalizada, atingir pelo menos 11 pontos específicos do corpo e durar mais de três meses sem motivo aparente;, explica o especialista.

A fonoaudióloga Maria Cláudia Silva de Camargo, 49 anos, viveu três anos com o diagnóstico errado e teve a vida completamente transformada por conta da fibromialgia. A doença trouxe tantas limitações que ela precisou parar de trabalhar e aprender a respeitar novos limites. ;Em mim, a fibro apareceu como uma sensação de queimação nas costas. Era como se eu tivesse sofrido uma queimadura de terceiro grau. Não conseguia sentar ou deitar. A dor é tão terrível que imaginei sofrer de algo muito grave, letal;, conta. ;Por três anos, fui medicada com remédios que amenizavam os sintomas por algumas horas apenas. Posso dizer que nesse período a vida passou em branco, me tornei uma pessoa introspectiva, pois a família e os amigos nem sempre entendem a dimensão da dor. Tive o diagnóstico confirmado somente em fevereiro deste ano e estou aprendendo a buscar uma nova qualidade de vida.;

Desconfiança
Para dormir, Maria Cláudia toma tranquilizantes. A depressão, as dores e os outras manifestações são controladas com medicamentos. Segundo ela, a sociedade desconhece a doença e o grande desafio dos fibromiálgicos é conviver com o turbilhão das crises e tudo o que elas acarretam, além da desconfiança das pessoas. ;Sigo à risca as orientações médicas e faço exercícios aeróbicos e terapia para aprender a conviver com o mal, mas não posso fazer planos, pois as dores surpreendem. Não sinto segurança em trabalhar, minha memória e concentração também foram afetadas. A minha vida precisou ser adaptada a essa nova condição. Atividades simples, como ir ao mercado sozinha ou sentar no chão para brincar com meus netos fazem parte do passado. Não posso sequer fazer planos;, lamenta.

A fisiatra e presidente regional da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor, Ana Paola Gadelha, explica que os pacientes acometidos pela fibromialgia têm uma percepção extrema dos estímulos dolorosos e que a doença é realmente incapacitante. ;Pesquisas comprovam que, ao mesmo tempo em que são hipersensíveis à dor, os fibromiálgicos também não conseguem ativar substâncias que aliviariam essa sensação. Por isso, estímulos suportáveis e contornáveis para aqueles que não sofrem da síndrome são extremamente penosos para quem tem a doença;, observa.

A médica destaca, no entanto, que é importante entender e desmistificar a doença. ;A fibromialgia não tem cura, mas a dor pode ser controlada com medicamentos e tratamentos não farmacológicos. Embora limitante, ela não é maligna. Remédios adequados, controle dos fatores estressores, exercícios e terapias complementares podem proporcionar qualidade de vida;, garante a fisiatra.

Com o diagnóstico errado, Maria Cláudia passou três anos convivendo com dores excruciantes

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