Ciência e Saúde

Pesquisadores da Universidade de Brasília criam o supermaracujá

Pesquisa desenvolve fruta mais resistente e produtiva a partir do retrocruzamento de variedades selvagens e convencionais

postado em 23/10/2010 08:00
Ao ver um maracujá grande e de aspecto saudável, poucos imaginam o trabalho realizado por produtores e agrônomos para levar à mesa o fruto quase perfeito. Pesquisas desenvolvidas em diversos estados buscam o melhoramento da espécie, mas no Distrito Federal os resultados foram mais satisfatórios. Agrônomos da Universidade de Brasília (UnB), em parceria com a Embrapa Cerrados, desenvolveram uma variedade mais resistente a doenças e até quatro vezes mais produtiva que a comum.

Para criar a superfruta, conhecida no meio científico como maracujá-de-boa-tolerância, os pesquisadores utilizaram uma metodologia desenvolvida pela unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária que permite o cruzamento repetido entre variedades selvagens e as encontradas no mercado (veja arte). ;Repetimos esses cruzamentos até chegarmos a um fruto maior, com mais polpa, valor comercial e maior resistência;, explica Marcelo Alves de Figueiredo Sousa, agrônomo e pesquisador do Departamento de Fitopatologia da UnB.

De acordo com José Ricardo Peixoto, professor de agronomia, também da UnB, a Embrapa Cerrados possui um banco de germoplasma com variedades selvagens utilizadas nos experimentos. ;A variedade selvagem tem uma resistência natural a doenças. Quando a cruzamos com a variedade comum, recruzamos com a selvagem e, posteriormente, com a comum, obtemos um grau de tolerância às doenças bem maior;, descreve.

Após os retrocruzamentos, as sementes são levadas para uma estufa, onde se transformam em mudas. Os pesquisadores começam a avaliar a resistência às doenças. Para isso, borrifam fungos, bactérias e vírus, suspensos em uma solução aquosa, nas plantas ; processo conhecido como inoculação de patógenos. ;Se elas não apresentarem manchas e perda de folhas, é sinal de que o retrocruzamento foi um sucesso;, diz Peixoto. Nos experimentos com o supermaracujá, as mudas se mostraram tolerantes aos patógenos mais comuns que atacam as plantações: verrugose, antracnose, septoriose, bacteriose ; conhecida entre os produtores como mancha oleosa ; e o vírus CABMV.

Depois da avaliação na estufa, as mudas são levadas para o campo, na Fazenda Água Limpa, pertencente à UnB. É lá que ocorre o o teste de campo de produtividade, a etapa mais importante de toda a pesquisa. Na fazenda, porém, a inoculação de patógenos é natural, por ação da chuva e pela não aplicação de agrotóxico. ;Com a convivência natural com as doenças, é possível avaliar a resistência real do maracujá;, esclarece o agrônomo.

Produtividade
Além da resistência contra doenças, o supermaracujá se mostrou muito mais produtivo do que o comum. Na linguagem da agronomia, isso significa que a planta produz mais frutos por hectare. ;É como uma pessoa fazer dois relatórios em uma hora, comparada a outra que faz um relatório no mesmo período;, exemplifica Peixoto. Segundo Sousa, o novo maracujá tem produtividade quatro vezes maior que a do comum. Em média, são produzidas 11t por hectare ao ano da variedade comum do maracujá. A variedade produzida pelos pesquisadores rende até 40t por hectare, tudo isso sem agrotóxico. Outro destaque do supermaracujá é seu tamanho e peso. O fruto desenvolvido na pesquisa tem uma média de 200g a 400g, enquanto o maracujá comum possui 150g. ;Parece a realização de um sonho para os produtores rurais e mais ainda para a indústria;, afirma o pesquisador da UnB.

As sementes foram distribuídas aos produtores há cerca de dois anos. O resultado agradou bastante. Sousa conta que, na última década, esses produtores estavam desanimados com as safras do maracujá, pois as plantas só duravam dois anos no máximo. ;Com as sementes do supermaracujá, os produtores voltaram a sorrir e se mostram entusiasmados com as safras;, diz o pesquisador. ;Hoje eles têm a perspectiva de uma produção contínua, que pode durar até quatro anos;, aponta.

Contudo, chegar ao maracujá ideal é um trabalho que leva tempo e não tem fim. Uma pesquisa como essa dura até 12 anos para ser totalmente concluída. Nesse meio tempo, os cientistas descobrem novas metodologias e também novas doenças, o que faz a pesquisa se aperfeiçoar a cada etapa. De acordo com Peixoto, três mestrandos dedicam-se ao estudo do maracujá atualmente. ;É algo que deve ter continuidade;, afirma. A justificativa para isso é que, a cada resistência adquirida pelo maracujá, seus patógenos evoluem e voltam a causar doenças ainda mais agudas, numa disputa eterna com a natureza.

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