Ciência e Saúde

Estudos buscam desvendar o megaterremoto que atingiu o Japão em março

Paloma Oliveto
postado em 20/05/2011 08:42
Há pouco mais de dois meses, o Japão foi devastado por um terremoto de magnitude 9, que resultou na morte de 15 mil pessoas e no desaparecimento de quase 10 mil. Pegos de surpresa, os sismólogos começam, agora, a tentar entender a dinâmica do tremor de Tohoku-Oki (nome da região nordeste do país, onde o epicentro ocorreu), responsável, ainda, por um tsunami que varreu a costa do arquipélago. A partir de uma rede de observações sismográficas, pesquisadores de diversas partes do mundo construíram modelos que revelam como a terra tremeu naquele dia. Três estudos publicados na edição de hoje da revista especializada Science descrevem as descobertas.

Logo após o fenômeno, muitos sismólogos acreditaram que o evento provocado por uma falha geológica próxima à costa norte do país seguiria os padrões normais de grandes terremotos. O Japão localiza-se em uma região chamada Anel de Fogo do Pacífico, bastante agitada devido ao constante deslocamento das placas tectônicas, estruturas que formam a parte externa da crosta terrestre ; a interna é recheada por magma. Essas placas se movimentam a esmo e podem resvalar umas nas outras, o que provoca terremotos, maremotos, tsunamis e erupções vulcânicas.

Em média, as placas tectônicas no leste do Japão movem-se em direção uma das outras a uma taxa de 8cm a 8,5cm por ano. Nesse ritmo, quando se encontram, pouco ou nenhum abalo costuma ocorrer. Às vezes, podem se passar séculos sem que a terra trema em um território acima de uma zona de convergência. Mas, quando um choque é muito forte, os níveis de energia estocada nas ondas são lançados de uma só vez, provocando o terremoto.

Japoneses estão acostumados aos tremores de terra, mas não podiam prever a fúria e o estranho comportamento do Tohoku-Oki. As análises apresentadas na Science mostram que a extensão da falha foi de 250km, metade do que seria esperado para um evento dessa magnitude. O padrão do grande terremoto não foi o mesmo observado ao longo do último século em fenômenos semelhantes. Em primeiro lugar, cinco segmentos contíguos foram rompidos de uma só vez, quando se acreditou, no início, que teria sido apenas um. Mas apenas duas placas atingidas sofreram um deslocamento forte, e o maior deles concentrou-se na parte mais rasa da falha.

;Pode ser que isso já tenha acontecido antes, mas agora a tecnologia está mais avançada e podemos observar melhor os detalhes de um evento como esse;, diz ao Correio Mark Simons, professor de geofísica do Laboratório Sismológico de Caltech e autor de um dos estudos. Para sua pesquisa, ele combinou dados registrados ao redor do mundo, movimentos da crosta terrestre obtidos por mais de 1,2 mil aparelhos de GPS no Japão e das ondas gigantes, cujas medições foram feitas por boias localizadas dentro do mar. Os pesquisadores descobriram que o Tohoku-Oki não disparou a mesma radiação sísmica liberada depois de um terremoto de magnitude 8,8 devastar o Chile no ano passado.

Quando ocorre um evento como esse, grandes quantidades de energia são lançadas pelas ondas mecânicas e é essa uma das variáveis usadas nas equações que compõem a escala Richter, que mede a magnitude de terremotos. No caso do Chile, as ondas liberaram energia equivalente à de 3 mil bombas atômicas. ;Enquanto o deslocamento principal do Tohoku-Oki foi duas ou três vezes maior ao de Maule, ele produziu muito menos radiação. Acreditamos que a diferença está no fato de a ruptura das placas no terremoto chinelo ter sido muito mais profunda;, explica Simons.

Para ele, dados inesperados registrados durante a passagem do Tohoku-Oki servem de alerta. ;Precisamos considerar potencialmente eventos similares em qualquer outra parte do país. É essencial monitorar também o sudeste do Japão para quantificar a extensão de qualquer ruptura que possa ter ocorrido depois do sismo.; Ele diz que, no modelo desenvolvido por sua equipe, o nível do mar elevou-se 2m a cerca de 50km da costa e, a 100km, perto do epicentro do terremoto, chegou a 9m. Um novo acontecimento como esse não seria inesperado, acredita.

Trabalho preventivo
Em outro estudo publicado hoje pela Science, Mariko Sato, da Universidade de Tóquio, examinou os efeitos decorrentes do Tohoku-Oki. De acordo com ele, nos 20 dias seguintes ao primeiro evento foram registrados diversos abalos pelo país. No artigo, Sato defende que é necessário intensificar as medições realizadas no epicentro do terremoto ; ou seja, dentro do oceano ; para entender melhor o que se passou e tentar evitar danos futuros. Com informações de GPS e dados acústicos, a equipe do pesquisador detectou movimentos muito fortes no fundo do mar, incluindo um deslocamento horizontal de 20m da crosta terrestre.

;Esses movimentos horizontais foram quatro vezes maiores do que o detectado pelos sensores instalados em terra firme. Provavelmente, a movimentação influenciou a força do tsunami, que foi provocado pelo terremoto;, analisa Sato ao Correio. ;O que podemos dizer é que as observações feitas no fundo do mar podem fornecer um alarme muito rápido no sentido de que está ocorrendo um terremoto que resultará em um imenso tsunami;, defende.

No terceiro artigo, Satoshi Ide, também da Universidade de Tóquio, analisou a evolução da ruptura do terremoto de Tohoku-Oki, identificando o movimento que ocorreu na direção oposta do deslizamento ao longo da falha. Ele sugere que, nos primeiros 40 segundos, a ruptura das placas tectônicas ocorreu nas profundezas do mar. Só mais tarde, as placas migraram para as áreas mais rasas da zona de convergência. Os maiores deslocamentos ocorrem a pouca profundidade, diz Ide. Assim como Sato, ele defende que os movimentos adicionais provocados na direção oposta da falha provavelmente influenciou a força do tsunami.

Para Mark Simons, os esforços de cientistas de várias partes do mundo para coletar o maior número possível de dados relativos a terremotos poderá ajudar a evitar futuras tragédias. ;Em vez de dizer que um enorme terremoto não poderia ter ocorrido naquele local, simplesmente deveríamos assumir que nós não sabíamos, pois, até agora, sabe-se muito pouco sobre a área de formação do Tohoku-Oki. É por isso que alertamos para o fato de que uma falha similar pode ocorrer no lado oposto (sudeste) do Japão. Não estamos prevendo um terremoto, mas, como existem poucos dados históricos, temos que intensificar nossa atenção para essa área;, diz.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação