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Miriam Leitão foge do economês para conta a história da moeda estável

postado em 26/05/2011 09:20
Miriam constatou que foi o povo o maior protagonista dessa história;Porque há doçura e beleza na amargura atravessada, e eu quero a memória acesa depois da angústia apagada.; Com a citação do verso do poema Desejo de regresso, de Cecília Meireles, Miriam Leitão apresenta ao leitor o sentido do livro que poderia ser mais uma publicação técnica em economês escrita no Brasil. Mas não é. Em Saga brasileira ; A longa luta de um povo por sua moeda, a autora torna palatável toda a história da inflação no país, narrando, de forma empolgante, as agruras do povo, assim como os erros (e os acertos) dos governantes até a conquista da estabilidade.

;Eu puxo o fio condutor dessa história para mostrar que havia um projeto nacional de ter uma moeda estável. Não é um projeto planificado, decidido pelo governo, mas que era desejo do povo. Foi uma história dolorosa, com final feliz, que me faz ter orgulho do Brasil;, disse Miriam ao Correio.

Para reconstruir a história da luta contra a carestia no país, ela recorreu a exemplares raros de obras como O encilhamento, romance de Visconde de Taunay passado no fim do século 19, que tem como pano de fundo a crise inflacionária e especulativa gerada pela farra de emissões monetárias realizadas pelo governo de Deodoro da Fonseca.

Além da extensa pesquisa histórica, o livro foi escrito a partir de entrevistas com brasileiros que viveram, por exemplo, o período da hiperinflação do governo Sarney, assim como conversas com os responsáveis pelos planos econômicos adotados no país nos governos democráticos.

;O que eu quis mostrar é que a República começa com a crise monetária e completa 100 anos na hiperinflação. Me concentrei no período da democracia porque o governo democrático recebeu essa bomba de efeito retardado: a inflação de 200% associada a uma confusão fiscal e a uma dívida externa difícil de pagar. A ditadura não foi boa nem para a política nem para a economia;, enfatizou Miriam.

Conquista da democracia, a estabilidade é, hoje, importante alicerce dela. ;Essa instabilidade gerada pela inflação alimenta ideias como a de que pode haver um salvador da pátria. Foi o que aconteceu no governo Collor, que surgiu num momento em que a população estava desesperada com o sequestro do dinheiro da poupança;, lembrou.

O papel da imprensa também perpassa a narrativa. ;Vi que parte do nosso trabalho é prestar serviço ao consumidor. Em um momento de crise, você precisa responder: isso é caro ou barato? O jornalista tem um trabalho braçal, de bater perna, comparar preços e conversar com especialistas. Era uma economia de guerra;, recordou.

Após reunir as suas próprias experiências às de seus entrevistados, Miriam constatou que foi o povo o maior protagonista dessa história. ;É só pensarmos no desafio que foi entender a URV (Unidade Real de Valor), que havia uma moeda para fazer as contas, mas não fisicamente. Eram quantos cruzeiros reais para comprar um real? A conta chegou a ser uma divisão por 2.750. Se o brasileiro não tivesse feito esse esforço, teria havido a inflação da URV;, concluiu.

Em tempos de inflação em alta ; o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula elevação de 6,51% em 12 meses, rompendo o teto da meta estipulada pelo governo ;, o livro deixa lições para as gerações que não viveram os piores tempos da carestia, mas que começam a se preocupar com o descontrole dos preços. O recém-nascido Saga brasileira será leitura obrigatória em universidades.


SAGA BRASILEIRA
Míriam Leitão.
Editora Record. R$ 49

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