Diversão e Arte

Kohan divide debate com o conterrâneo Lucas Gioja e com a francesa Mario

Escritores marcarão presença na 2ª Bienal do Livro e da Leitura

Nahima Maciel
postado em 17/04/2014 07:00

Martín Kohan: escritor critica maneira grupos editoriais conduzem negócios entre diferentes países

É triste, mas os intercâmbios literários entre o Brasil e América hispânica dependem de fatores nos quais a literatura não está em primeiro lugar. ;Lamentavelmente, esses intercâmbios dependem, em boa medida, das políticas comerciais e dos grandes grupos editoriais, que insistem em segmentar seus mercados e separar os países de maneira que muitos dos livros que se publica em um país não chegam a outro país;, explica o argentino Martín Kohan, que fala sobre o tema nesta sexta (18/4), às 10h30, na II Bienbal Brasil do Livro e da Leitura, na palestra A importância de ser traduzido: estratégias de intercâmbios culturais entre nações. Kohan divide o debate com o conterrâneo Lucas Gioja e com a francesa Marion Loire.


Autor de nove romances, Kohan viu apenas dois serem traduzidos para o português. Em Ciências morais, ele narra uma história dos tempos da ditadura e em Segundos fora, um caso jornalístico nos confins da Patagônia que mistura uma luta de boxe e concertos eruditos de Richard Strauss. ;As empresas (editoriais) são transnacionais, mas paradoxalmente isolam em boa medida as literaturas das diferentes nações. Já com a literatura brasileira ocorre algo interessante: a necessidade de superar esse obstáculo que supõe a diferença linguística propiciou que se implementassem medidas de difusão importantes e efetivas;, diz o escritor. Segundo ele, as prateleiras das livrarias argentinas estão bem abastecidas de traduções da produção brasileira. E nisso entram tanto os clássicos quanto a literatura contemporânea.

Professor de teoria literária na Universidade e Buenos Aires e herdeiro de uma tradição crítica que tem mentores como Beatriz Sarlo, Kohan acredita em um discurso que seja capaz de aproximar os leitores do pensamento acadêmico. ;Não acho que esse seja um requisito exclusivo para produzir crítica literária de qualidade, há críticos muito bons que respondem a outra classe de formação. Mas considero que isso contribui para o nível crítico geral;, diz o argentino. A crise no país vizinho também é algo que preocupa os escritores e o tema foi inevitável nas mesas da bienal que receberam autores da Argentina.

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O intercâmbio literário entre países da América Latina é efetivo?

Lamentavelmente, os intercâmbios literários na América Latina dependem das políticas comerciais dos grandes grupos editoriais, que insistem em segmentar seus mercados, o que quer dizer separá-los os países, de maneira que muitos dos livros que se publica em um país não chegam aos outros. As empresas são transnacionais, mas paradoxalmente isolam as literaturas das diferentes nações. Somente alguns livros passam, somente alguns autores se difundem. É responsabilidade dos meios, dos críticos, das editoras e das feiras compensar ou reverter esse estado das coisas. Enquanto isso, acontece algo notável na literatura brasileira: a necessidade de superar esse obstáculo que pressupõe a diferença linguística propicou a implementação de medidas de difusão importantes e efetivas. O certo é que, na Argentina, a literatura brasileira contou nos últimos anos com uma forte presença e múltiplas traduções: apareceram traduções de Clarice Lispector, Joao Gilberto Noll, Rubem Fonseca, Daniel Galera, Milton Hatoum, Lima Barreto, Dalton Trevisan, e muitos outros. Vocês souberam fazer da dificuldade uma vantagem: hoje, é uma das literaturas mais difundidas na Argentina.

Você é professor de teoria literária em um país conhecido pela qualidade de sua crítica literária. Como descrever a crítica literária argentina hoje? Que caminhos ela tem apontado? Ainda há lugar para o marxismo?

Uma característica muito valiosa, na minha opinião, é que vários críticos de formação acadêmica sólida se preocupam em elaborar uma escrita que possa circular para além dos circuitos acadêmicos para alcançar uma intercenção e uma incidência que excedam o âmbito acadêmico. Não acho que esse seja um requisito excluviso para produzir crítica literária de qualidade, há críticos muito bons que respondem a outra classe de formação. Mas considero que isso contribui para o nível crítico geral atenda a uma exigência educada. Quanto ao marxismo, enquanto existir a luta de classes haverá lugar para ele.

O que você acha da crise econômica e social na Argentina hoje e do kirchnerismo instalado no país?


Os governos kirchneristas são muito provavelmente melhores que o que o peronismo pode proporcionar aos argentinos. Mas têm, necessariamente, limites objetivos em suas reivindicações e em suas possibilidades de se questionar estruturas de poder e dominação na Argentina. O desafio da esquerda é precisamente este: apontar esses limites, evidenciá-los e denunciá-los. Desafio e, ao mesmo tempo, urgência, porque historicamente o peronismo conta com o apoio da classe trabalhadora, das bases populares, das quais a esquerda necessida.

Qual o lugar da Argentina na literatura contemporânea latino-americana? E qual a importância da história e da política na tua escrita?

Me interessa muito colocar a literatura em um ponto de tensão de certas zonas de sentido muito cristalizadas. E tanto a história como a política tendem a produzir cristalizações de sentido. Pretendo desestabilizar essa rigidez, abrir interrogações sobre essas certezas. Não gosto do romance histórico no sentido convencional, tampouco do realismo, tampouco da literatura de "mensagem", justamente porque apontam na direção contrária ao que me proponho. Nessas variantes, os sentidos estabelecidos tendem e ser recorrentes. Só que para mim, ao contrário, interessa questioná-los. O que me interessa na literatura é o "como": a pergunta que me faço é como?.

Como você pensou na história de Segundos fora?

Me ocorreu por uma combinação de histórias distintas. Me detive na briga entre Firpo e Dempsey, de 1923, sobretudo porque foi uma derrota, porque as derrotas me interessam, porque o argentino perdeu. Me atraiu essa situação: a glória e o mérito. Me atrai esse ponto de vista formal, que tudo isso se resolveria em apenas 17 segundos, o que me apresentava o desafio de uma narrativa de altíssima concentração temporal. Mas o romance foi tomando forma quando decidi cruzar a história da luta de boxe com os concertos de Richard Strauss em Buenos Aires, o que quer dizer, travar na narrativa um conflito entre o mundo da cultura popular e o mundo da cultura dita alta, sofisticada.

A importância de ser traduzido: estratégias de intercâmbios culturais entre as nações

Com Martin Kohan, Lucas Gioja e Marion Loire .Sexta (18/4), às 10h30, no Auditório Nelson Rodrigues

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