Diversão e Arte

Série de fotos traz referências do glamour e do trash

Fotógrafo franco-húngaro desembarca no Brasil e cria série que questiona a permanência de valores contemporâneos

postado em 13/01/2016 07:31
Aretha Sadick, por Paul Kurucz
As imagens do fotógrafo franco-húngaro Paul Kurucz falam sem emitir som, ou melhor, gritam. As cores fortes, os cenários apocalípticos do Rio de Janeiro e a temática que versa sobre sexualidade e gênero transmitem expressão de alegria, o ridículo e o jovial, o glamour e o trash. O artista brinca com corpos e sorrisos forçados que parecem derreter-se e revelar a felicidade irracional do mundo contemporâneo. As fotos estão expostas no site www.paulkurucz.zone.
As fotografias fazem parte do projeto Zona ; glamour trash no Rio, lançado no ano passado pelo coletivo Kolor. O projeto é dividido em séries de fotos formando zonas diferenciadas por estilo, textura, tema e atmosfera. O coletivo Kolor nasceu há um ano como produtora de arte e fotografia. Paul Kurucz, fundador e fotógrafo; lançou a produtora em 2011 na Hungria, antes de radicá-lo e reinventá-lo no Rio para incluir os ensaios.

Paul é formado em direção teatral e economia aplicada. Ele abandonou palcos e equações para criar a kolor, um bar no centro de Budapeste em 2011, onde rola música experimental, cinema alternativo, palestras-shows, exposições multimídia, e aparecem DJs do mundo inteiro que topam tocar nas segundas.

A ideia da kolor veio de um trauma, o fim de um relacionamento que virou uma ficção aditiva e que o Paul tentou substituir com a criação de uma multiplicidade de experiências humanas, instigantes, sinceras e viajadas.

Os testes ocorreram no estúdio da kolor e no ferro-velho apocalíptico da Pereira Maquinas, onde o artista Vik Muniz trabalhou durante anos. A série de fotografias foi inspirada pela cena drag do Rio, artistas locais e influências internacionais, como David Lachapelle, Osborne Macharia e Jan Saudek.

Modelos, artistas, atores e drags do meio anarco-humanista da cidade, que formaram o elenco, participaram também na concepção dos personagens e cenas. Os outros ingredientes foram o uso pesado da estética teatral e o contraste glamour-trash criados pelo fotógrafo.

Em 2016, o coletivo vai continuar adicionando zonas mensalmente. Serão de quatro a cinco fotos por mês dispostas em áreas marcadas por códigos de três dígitos. As próximas zonas serão: Velhinha Sadomaso, Chefao Pink e Vaso de Ipanema.

Descarga de Gêneros, por Paul Kurucz >> Entrevista // Paul Kurucz

Qual foi o seu primeiro contato com fotografia?
Não me considero fotógrafo, mas projetor de imagens. Foi também meu trabalho como diretor de teatro, produtor de cinema, e indiretamente como organizador de eventos de artes visuais através da Kolor, nosso coletivo. Investi numa câmera e comecei a tirar fotos no início do ano passado. Não tive nenhuma pretensão, apenas promover os projetos artísticos e culturais do coletivo no Facebook e Instagram. Era mais barato do que pagar um fotógrafo. Descobri logo que, apesar de se tratar de fotos básicas de evento, a composição e o ambiente dessas imagens são uma projeção da minha visão do mundo.
Depois de três meses senti a necessidade de me expressar de um jeito mais livre e elaborado. Queria determinar não apenas como, mais o que eu quero fotografar: os personagens, o cenário, as cores, texturas, luzes etc, enfim todos os componentes da mini-história que cada foto envolve. No final, o trabalho de planejamento, pesquisa e produção que fazemos com o coletivo é muito parecido com a produção teatral e cinematográfica que fazia no passado.

Como e quando começou a fotografar profissionalmente?
Tem gente na área da fotografia com uma experiência, trabalhos, conhecimento teórico e pratico incrível, eles são os fotógrafos. Nos apenas criamos universos, criaturas, histórias inusitadas que a ferramenta fotográfica ajuda a expor para o público.

Em que consiste e qual o conceito do Kolor?

O conceito da kolor é explorar. Tanto através dos nossos proprios projetos de fotografia, palestras multimídia, de cinema e de festas temáticas, como pelos festivais, mostras, exposições que montamos em parceria com a cena cultural carioca alternativa. A maioria dos projetos acontecem na casa Kolor, que é nossa base criativa, estúdio e funciona também como casa cultural.

Por que um cenário apocalíptico?

Gosto de tensão, de choque estético e achei o contraste entre o estilo trash ; cujo cenário lógico é caos apocalíptico de um ferro velho ; e do glamour um dos mais interessantes a explorar. Essa oposição satirizada e também é uma expressão da briga, mais atual e palpável entre a busca da perfeição e a realidade da imperfeição que domina a vida nesse país.

As imagens são fortes, mas apresentam tensão e alegria ao mesmo tempo. Era essa sua intenção?
A expressão da alegria, o ridículo jovial, a brincadeira são um sorriso forçado no rosto de uma criatura cuja alma esta derretendo. Essa criatura é nossa sociedade, somos todos nós. Por enquanto, o sorrir forçado faz sorrir os outros e acaba nos fazendo sorrir de verdade, a felicidade irracional virando contagiosa. Nos projetos de 2016 o coletivo vai explorar esse universo paradoxal do riso e do choro em contextos sociais e espaciais insólitos.

O que é preciso para embarcar em um projeto como esse? Ousadia?
A necessidade. Uma exigência irreprimível de se projetar pra fora. Em 2015 mais de 6 cenas aconteceram num banheiro, em 2016 vai ter mais. Eu vejo uma analogia clara entre defecar e produzir fotos. Enquanto ao estilo "ousado", eu acho que mostrar a realidade crua é tao provocadora quanto normal.
Quem ou o que são suas referências?
Meu pai (que tem 4 vasos sanitários em casa e uma pintura gigantesca com ele, de fantasia de rei, sentado num vaso sanitário de ouro) e David Lachapelle.

A estética teatral das imagens tem relação com sua formação teatral?
Sim. O mundo é uma mescla aleatória de slow motions de peças e de filmes. A fotografia me permite parar, refletir, mas a matéria-prima do meu trabalho continua a ser a ficção teatral.

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