Economia

Atraso de encomendas internacionais vira jogo de empurra no Brasil

Produtos adquiridos em lojas on-line do exterior estão sofrendo atrasos cada vez mais constantes. Receita e Correios dividem responsabilidades

Fernanda Borges/Estado de Minas
postado em 21/10/2014 10:43

Funcionários separam pacotes em centro de serviço de entrega expressa na China. No Brasil, encomendas de países asiáticos subiram 100% no ano passado

Os preços convidativos e a facilidade para comprar em sites internacionais não são proporcionais aos imprevistos enfrentados por consumidores brasileiros. E nessas horas, o que mais aflige o comprador é a falta de informação. Muitos nem sabem, por exemplo, sobre os prazos de liberação e entrega estabelecidos pela Receita Federal e Correios. Consumidores reclamam que ao procurar as instituições, percebem um jogo de empurra-empurra quanto ao retorno das encomendas e se queixam que são respondidos com e-mail padrão.

Sites na internet, como o Reclame Aqui e comunidades nas redes sociais, acumulam milhares de queixas, a maioria envolvendo atrasos, extravios e avarias. Uma delas é a Correios 100% Reclamações, criada em novembro de 2012 no Facebook. A página já tem pelo menos 4.700 seguidores. No Reclame Aqui, problemas com compras virtuais em sites importados foram responsáveis por 443 reclamações no site no ano passado. Em 2012, esse número foi de 326.

Em nota, os Correios informam que possuem canais próprios de atendimento, adaptados às necessidades de seus clientes. Informou ainda que o número de manifestações em sites de reclamação desde 2012, engloba diversos motivos, não apenas a entrega de encomendas internacionais, e mesmo assim corresponde a apenas 0,03% do total de cartas e encomendas entregues pela empresa no mesmo período. Além disso, segundo a estatal, o padrão de qualidade de entrega mantém-se acima de 99%, a porcentagem de indenizações pagas pelos Correios por atraso, extravio ou avaria em relação ao total de cartas e encomendas internacionais transportadas foi sempre inferior a 1% nos últimos seis anos.

Há casos em que a espera por encomendas chega a 120 dias. Exemplo do vendedor Fernando de Souza. Para economizar, ele prefere frete sem rastreamento, mesmo sabendo que a chegada do produto pode levar meses. Segundo ele, as suas duas últimas encomendas já estão paradas há dois meses no Centro de Tratamento do Correio Internacional (CTCI) de Curitiba (PR), para onde os pacotes de até dois quilos são enviados. ;Compro desde filmes e games a produtos estéticos e odontológicos. A diferença de preço é exorbitante, mas o lado ruim é a demora na entrega. Comprei um Blu-Ray em fevereiro deste ano, mas o filme só chegou em junho. Foram quatro meses de espera", disse.

Patricia Andrade com o noivo Paulo Eduardo Nunes Barbosa: Terapeuta ocupacional aguarda a chegada de 21 encomendas para o casamento

Patrícia Andrade, de 27 anos, aguarda 21 encomendas feitas no chinês AliExpress.com - a maioria, produtos para o casamento marcado para outubro do ano que vem. Ciente da demora, a terapeuta ocupacional disse que já compra os produtos com antecendência para não ter dor de cabeça no grande dia. Entre os pedidos, estão os vestidos das daminhas, o sapato de noiva e o arranjo de cabelo. "Só não comprei o vestido porque as minhas amigas não deixaram (risos). O que compensa são os valores e, muitas vezes, a qualidade também surpreende". Segundo ela, em lojas da capital mineira, o aluguel de um vestido de dama sai em média por R$ 300, enquanto que no sites no exterior, as peças podem ser compradas de R$ 30 a R$ 40.

No entanto, Patrícia ressalta que nem sempre teve boas experiências nas compras online. Ela conta que recentemente, foi taxada e surpreendida na porta de casa. "Me cobraram R$ 250 de taxa e a compra não compensou, conclui. Segundo os Correios, a empresa só realiza entrega de encomendas tributadas em agências, mediante recolhimento do imposto, portanto, a cobrança só pode ter sido realizada por empresa concorrente. A empresa esclarece que são isentas apenas as encomendas de até US $ 50 dólares enviadas por pessoa física e destinadas à pessoa física. No caso de compra pela internet, o remetente é um site pessoa jurídica, ou seja, todas as encomendas são passíveis de tributação, independentemente do valor.

Atenção para os prazos

Os Correios esclareceram que todas encomendas que chegam do exterior passam por raio-x onde é feita a triagem para fiscalização da Receita e outros órgãos competentes, como Anvisa e Exército, para verificação de conteúdo ou aplicação de tributos de importação, de acordo com a legislação de cada país.

Quanto aos prazos, a empresa informa que fretes econômicos são mais demorados, podendo chegar a 50 dias úteis para a entrega da encomenda, caso de encomendas internacionais com código de rastreamento iniciado pela letra ;R;. Esse tipo de encomenda tem apenas dois registros de rastreamento: um quando entra no Brasil e o outro, somente quando é entregue ao destinatário ; a movimentação interna da encomenda não é mostrada no sistema de rastreamento. Já os fretes expressos são mais rápidos (1 a 7 dias úteis), mas também são mais caros.

Nos últimos anos, os Correios registraram aumento de 389% no volume das encomendas internacionais e no ano passado, o crescimento geral dos serviços mais direcionados ao e-commerce foi em torno de 65%, o que contribui em parte, para a lentidão na liberação de mercadorias. No final de 2013, houve um crescimento de quase 100% em alguns corredores de negócios, como os países asiáticos. Para acompanhar a demanda, a empresa informou que reestruturou a unidade de tratamento dessas encomendas e aumentou em 170% o número de empregados da atividade.

Já a Receita Federal informa que as mercadorias vindas de outros países, como China e Estados Unidos, poderão ficar até 90 dias retidas para análise e investigação. A regra está em vigor desde 2011. Até então, a Receita apreendia essas mercadorias por no máximo 60 dias. Ao chegarem ao Brasil por São Paulo, Rio de Janeiro ou pelo Paraná, os pacotes são separados e remetidos para um setor especial, onde ficam aguardando vistoria para detalhar se há tributação.

Produtos adquiridos em lojas on-line do exterior estão sofrendo atrasos cada vez mais constantes. Receita e Correios dividem responsabilidades

Em nota, o Fisco informou que o tempo de entrega do produto varia de acordo com a origem, o frete contratado, o envio de informaçõe e documentação corretas quanto ao conteúdo, remetente e destinatário e a capacidade operacional dos Correios e dos outros intervenientes. ;Sabe-se que algumas empresas internacionais represam as suas entregas, com a finalidade de negociarem fretes mais baratos, ficando às vezes, até 30 dias sem a expedição para o país de destino;, informou o órgão.

Novidade na tributação

A Receita Federal e os Correios vão apertar o cerco e aumentar o número de mercadorias tributadas. A partir de novembro, os pacotes serão taxados automaticamente, o que segundo os órgãos, irá diminuir o prazo final de importação pelos cidadãos brasileiros. Segundo os Correios, o sistema permitirá a troca antecipada e a disponibilização de informações eletrônicas sobre as encomendas (especialmente as do e-commerce), que também darão maior segurança a todo o processo.

Os Correios e a Receita receberão eletronicamente as informações (dados do remetente, destinatário, conteúdo detalhado, valor dos produtos etc.) sobre as remessas que estão sendo enviadas ao Brasil. Assim, antes mesmo de o pacote chegar ao Brasil, será possível definir o processo aduaneiro a que será submetido, inclusive quanto à necessidade de fazer a verificação intrusiva do pacote, para checagem de documentos, conteúdos, etc. Mesmo no novo processo, toda carga que chegar do exterior continuará passando pelo Raio-X, para controle de segurança.

ONDE RECLAMAR

A Central de Atendimento dos Correios é pelo telefone 0800 725 0100 ou via endereço eletrônico: http://www2.correios.com.br/sistemas/falecomoscorreios/.

Na Receita Federal, as reclamações formais devem ser feitas no site da Ouvidoria da Receita Federal: http://portal.ouvidoria.fazenda.gov.br/

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