Economia

Ajustes "duros" não tiram Brasil da crise, diz economista professora da USP

"A meta fiscal deste ano claramente não será cumprida, mesmo depois de todos os esforços até aqui, que envolveram fortes cortes de investimentos públicos", declarou Laura Carvalho

Agência Estado
postado em 10/07/2015 09:16
A crise econômica brasileira não será resolvida com ajustes duros. Essa é a avaliação da economista Laura Carvalho, professora da Universidade de São Paulo (USP), doutora pela New School for Social Research, em Nova York (EUA) e voz do pensamento desenvolvimentista. Para Laura, a crise pode ser revertida se a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff fizer mudanças no regime fiscal e na meta de inflação.

Laura é coautora do recém-lançado livro Indústria e Desenvolvimento Produtivo do Brasil, feito em parceria com os economistas Nelson Marconi e Maurício Pinheiro, além do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Laura divide com o ministro a mesma bagagem acadêmica: ambos fizeram graduação e mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutorado na New School, berços desenvolvimentistas no Brasil e nos Estados Unidos, respectivamente.

"A meta fiscal deste ano claramente não será cumprida, mesmo depois de todos os esforços até aqui, que envolveram fortes cortes de investimentos públicos, o aumento de alguns impostos e a restrição de benefícios trabalhistas. Agora, o governo deve reduzir a meta, mas isso não resolve o problema estrutural", disse Laura, em entrevista ao Estado. Segundo ela, o governo Dilma deveria aproveitar a recessão, que reduz a arrecadação, para fazer uma reforma no regime fiscal.

Bandas

De acordo com a economista, o governo deveria introduzir um regime de metas fiscais em que o volume do superávit primário (a economia de recursos públicos voltada ao pagamento dos juros da dívida pública) é ajustado ao ciclo econômico e conta com "bandas" para administração. Isto é, caso o País atravesse uma recessão, como ocorre agora, a meta fiscal pode ser administrada de acordo com as circunstâncias.

"Apesar de todo o ajuste que foi conduzido no primeiro semestre, a confiança dos empresários e dos consumidores continuou caindo. É hora de o governo aumentar o investimento público e sinalizar que haverá uma melhora, e não de buscar mais ajuste", disse Laura, para quem esse aumento de gastos com investimentos poderia ser financiado com o aumento de impostos sobre a renda e sobre a herança - como parte do governo defende.

A professora da USP entende que o atual patamar das metas fiscais deste ano e do próximo "impõe" ao governo o caminho das manobras contábeis e das "pedaladas fiscais", combinadas com a busca incessante de receitas extraordinárias. "Esse foi um caminho que deu errado, mas como chegar em uma meta fiscal tão alta vivendo uma recessão? O governo deveria seguir o caminho atual, que acaba com as manobras e pedaladas, mas aprofundar uma nova estratégia, mudando todo o regime", disse ela.

Segundo a economista, as reformas na política econômica deveriam atingir também o regime de meta de inflação, que, tal qual o superávit primário, foi introduzido em 1999 e faz parte do "tripé macroeconômico", que é completado com o câmbio flutuante.

O mercado financeiro estima que a inflação deve fechar o ano com um avanço próximo a 9%, o maior em 12 anos. No esforço para reduzir a alta de preços, o Banco Central (BC) vem elevando a taxa básica de juros há mais de um ano. Hoje, o juro básico está em 13,75% ao ano e o mercado projeta novos aumentos. Para Laura, no entanto, essa política do BC reforça o ajuste fiscal ao "inibir" os investimentos privados, sem ter efeito preciso sobre os preços.

"O próprio BC registra em seus relatórios e atas que a inflação está alta pela correção dos preços controlados e pelo efeito câmbio. Com recessão, a demanda caiu, então como que continua subindo tanto os juros para controlar aumento de preços que não estão reagindo à demanda?", questiona.

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