Economia

Infraestrutura limitada dificulta desenvolvimento de tecnologias no Brasil

Problemas de infraestrutura para conexão dificultam o desenvolvimento do IoT no Brasil. Possibilidade de ataques de hackers aos aparelhos conectados, diminuindo a privacidade de empresas e usuários, retarda a implantação da tecnologia

Simone Kafruni
postado em 22/01/2017 08:00
O potencial de crescimento da internet das coisas é gigantesco no Brasil, que ainda engatinha em relação a economias mais maduras no aproveitamento de tudo o que a tecnologia pode oferecer. Porém, na opinião dos especialistas, a vulnerabilidade dos dispositivos conectados também é alta e as redes de infraestrutura para conexão não são robustas o suficiente.

Pietro Delai, gerente de pesquisa do IDC Analyse the Future, empresa líder em inteligência de mercado e consultoria, explica que, na Europa, onde a maioria dos setores cresce em taxas entre 1% e 4%, na IoT a expansão vai de 20% a 40%. ;Tem a parte do consumo de TVs, geladeiras, pulseiras. Mas o grosso dos negócios é na área corporativa;, explica. São nos processos de cuidados com a saúde, nas indústrias e logística que as aplicações se multiplicam. ;Em automação predial, de hospitais e museus, para segurança desde o movimento de materiais e fluxo de pessoas, até saber exatamente onde está uma determinada obra;, conta.

O que falta no Brasil, diz o especialista, é uma definição política. ;Na China, há política para IoT há oito anos. Aqui, o processo começou no ano passado, foi interrompido há dois meses e deve demorar nove meses para funcionar. Largamos atrasados, mas acredito que, a partir do segundo semestre, veremos novidades;, estima Delai. O gerente do IDC explica que, em termos de tecnologia, a coisa já está acontecendo. ;Não existe padronização. Todo mundo dizia que não ia sair IoT sem padronização e na verdade está andando, a tecnologia está evoluindo;, garante.

[SAIBAMAIS]Segundo ele, um grande avanço são os beacons, sensores que podem ser grudados em qualquer parede e que fazem a triangulação, como repetidores de sinal. Um GPS é apoiado por satélite, por isso, só funciona em ambientes abertos. ;A cobertura indoor está se materializando com os beacons;, assinala. Com os sensores, a localização precisa funcionará também em ambientes fechados. ;O Google, por meio do Waze, vai estrear a tecnologia em túneis do Rio de Janeiro. Dentro de um shopping, será possível saber onde está ocorrendo uma oferta. Em um prédio corporativo, os sensores vão saber quantas pessoas estão lá dentro para ajustar o ar-condicionado. Num restaurante, controlar o nível de comida pelo fluxo de clientes;, exemplifica.

O aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, saiu na frente e instalou 3 mil beacons no terminal 2 para permitir a navegação indoor. No futuro, também será possível instalar beacons menores, dentro das lojas, e até mesmo conectados a produtos específicos, como itens de vestuário em lojas para medir ao fim de cada dia quais modelos foram mais experimentados.

Embora as possibilidades sejam infinitas com a IoT, o que tem atrasado o desenvolvimento da tecnologia no Brasil são os riscos e a infraestrutura ainda precária. Na opinião de Paulo Miyagi, pesquisador do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), a cultura de coisas inteligentes já está disseminada. ;As coisas têm processadores, mas ainda não usamos toda a capacidade deles porque isso depende de aprimorar os nossos sistemas de comunicação via internet para conectar tudo;, ressalta. O especialista lembra que nem a tecnologia de conexão 4G funciona direito no Brasil. ;Há regiões onde nem 2G funciona;, lembra

Miyagi diz que o tamanho do Brasil também atrapalha. ;Países como a Coreia estão desenvolvendo isso mais rapidamente porque que têm geografia mais limitada. O Brasil é muito grande e muito atrasado. Em IoT tudo está relacionado à conectividade;, sentencia.

A vulnerabilidade a ataques também retarda o avanço da IoT no Brasil. ;Como tudo estará conectado na internet, a privacidade acaba. Um invasor poderá saber a hora que você chega em casa, destranca a porta, prepara seu banho. Essa interação tem um limite que é perigoso. É um ambiente novo que também está relacionado com a questão da segurança;, alerta.

Invasão
Se o dispositivo está conectado, é alvo de ataques de hackers, no entender de Antônio Augusto Fr;lich, professor do IEEE e da Universidade de Santa Catarina (UFSC). ;A IoT ainda não deslanchou como devia porque há muitos riscos envolvidos. Nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, há muito receio de invasão;, argumenta. Para ele, quem é ligado à tecnologia adora a automação, mas as pessoas menos apaixonadas são mais cautelosas.

;O mercado usa a mesma internet do computador para as coisas. Então, todos os ataques são possíveis. No computador, ainda é preciso clicar em alguma coisa. Nas coisas, as senhas são simples, as pessoas em geral deixam as de fábrica e não há antivírus. Isso significa que a vulnerabilidade é muito maior;, pontua.

Fr;lich defende um protocolo mais seguro para IoT para os dispositivos se difundirem. ;Ainda não dá para colocar em todas coisas sem correr riscos. Imagine semáforos abrindo na hora errada, ou equipamentos de hospitais sendo desligados de propósito por invasores. O que falta é privacidade e segurança para o consumidor dar um passo adiante e os mercados também;, preconiza.

Existem alternativas, de acordo com o professor. Mas como são voltadas para uma engenharia com hardware e processadores com dispositivos de segurança que não existem em computadores, necessitam de investimentos maciços. Por enquanto, o que se vê são aparelhos que dão pouco ou nenhum trabalho aos hackers. ;Entrar nas câmeras de segurança e congestionar servidores de grandes empresas é muito simples para os invasores;, diz.

O especialista alerta para o paradoxo da tecnologia. Para resolver a questão da segurança, é preciso tirar do usuário a responsabilidade de usar as senhas. Mas repassar o controle a terceiros também é uma forma de perder a privacidade. ;Ou seja, com comodidade máxima, nunca teríamos a certeza de que estamos protegidos e privados. Se puxarmos para nós a responsabilidade, temos que ter conhecimento de tecnologia. É um dilema;, afirma.

Para Pietro Delai, gerente de pesquisa do IDC, até mesmo a segurança precisará migrar para uma terceira plataforma. ;A terceira plataforma é apoiada na segurança com mobilidade. Serão necessários elementos para garantir privacidade, inibir violações de acesso, elementos de autenticação. Tudo isso precisa evoluir junto com a IoT;, sentencia.

"O mercado usa a mesma internet do computador para as coisas. Nas coisas, as senhas são simples, as pessoas em geral deixam as de fábrica e não há antivírus"
Antônio Augusto Fr;lich, professor do IEEE e da UFSC

"Serão necessários elementos para garantir privacidade, inibir violações de acesso, elementos de autenticação. Tudo isso precisa evoluir junto com a IoT"
Pietro Delai, gerente de pesquisa do IDC Analyse the Future

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