Economia

Pesquisa mostra que 42% das famílias trocam marcas para economizar

O percentual de brasileiros que substituíram produtos para manter o orçamento mais do que dobrou de 2014 para 2016. Centro-Oeste andou na contramão. As despesas em relação à renda subiram 12,8%, enquanto no interior paulista houve queda

Azelma Rodrigues - Especial para o Correio
postado em 06/05/2017 08:00
Pesquisa de preços: consumidores procuram mercadorias pelo preço e não pela preferência ou hábito como há alguns anos

Parada em frente à gôndola de chocolates e doces de um supermercado, Maria Lana Fernandes, 13 anos, estudante, pega um tablete, olha e devolve. Pega outro, mas também devolve. Até que, depois de algum tempo, abandona o desejo de levar o que mais gosta e põe no carrinho a barra de chocolate com preço mais em conta. Diz que a mesada está curta e a mãe proibiu a compra da marca mais cara, sua predileta desde criança.

Assim como a adolescente, a crise tem forçado muitos brasileiros a trocarem as marcas mais caras por outras mais baratas. Em 2016, pesquisa do Instituto Nielsen apontou que essa foi a primeira medida das famílias para reduzir a pressão no bolso ao consumir produtos de alimentação, higiene e limpeza, sendo que, em 2014, era a sexta opção dos brasileiros. Nos dois anos de recessão, dobrou o número de famílias que incorporaram essa prática, passando de 20% para 42%.

O estudo mostra que a queda da atividade econômica, a inflação elevada e o cenário político instável geraram desesperança, tendo como resultado concreto, no ano passado, o encolhimento da renda familiar brasileira. Em cerca de 52% dos domicílios, algum membro da família foi atingido pelo desemprego em 2016.

Apertar os cintos foi a saída na maioria das regiões brasileiras, exceto no Centro-Oeste, onde as despesas, no ano passado, cresceram 12,8% em relação à renda. No interior de São Paulo, no mesmo período, houve uma queda de 6,5%. Segundo os pesquisadores, o brasileiro, castigado pela recessão continuada, tem se virado para tentar equilibrar as despesas. A troca de marcas na hora da compra foi o principal alternativa para baixar os custos, opção de 42% dos consumidores, seguida da redução do consumo no supermercado, adotada por 22% das famílias. A estratégia usada por 7% dos brasileiros para se manter no orçamento foi cortar a alimentação fora de casa, enquanto que, para outros 5%, a escolha foi diminuir despesas com vestuário e bens duráveis.

Henrique Miotto prioriza mudança de produtos de limpeza, que não têm gosto

Escolha


;A gente não leva mais a marca. A gente leva é o preço;, sentenciou a aposentada Rosana Santana Alves, 62 anos, encarando a gôndola de iogurtes. ;Tinha um tempão que não comprava o meu preferido, mas hoje dá, porque está em promoção;, disse. O gerente de um supermercado, que prefere não se identificar, ;assina embaixo; da sentença da aposentada. Conta que faz questão de abastecer a loja com quatro ou mais marcas de cada produto, para dar opção de preços aos clientes. ;Depende do segmento. Farinha láctea, por exemplo, tem uma mais famosa e outras duas com uma diferença sensível no preço. Nunca mais comprei da famosa;, conta ele, que tem filho de seis meses.

A tese de ;a marca determina o preço; é partilhada por Vani Soares, 39 anos, secretária desempregada. ;Para mim, é tudo a mesma coisa. Veja esses enlatados tipo ervilhas, milho, molho de tomate ou seleta de legumes, coisas que compro sempre. Ou o filtro de café. Também na área de limpeza tem uma variedade boa de preços, porque há muitas marcas;, afirmou.

;O enlatado francês é bem melhor que o brasileiro, mas entre os brasileiros não vejo diferença. É tudo a mesma coisa;, opinou a corretora de imóveis Gisa Paiva Girondi, 57 anos, ao revelar que sua renda caiu há três anos, com a aposentadoria e a crise no setor imobiliário. Para economizar, ela corre atrás de promoções e reduziu quantidades, mantendo suas marcas preferidas.

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Já Henrique Miotto, 31 anos, casado e com dois filhos pequenos, confirma que trocar marca em busca de menor preço é uma das coisas que tem feito, sim, especialmente do ano passado para cá. ;Faço isso com, praticamente, tudo. Só não consigo com o que tem gosto. Por exemplo, a manteiga. Já tentei a mais barata, mas achei muito ruim;, explicou. Por isso, ele busca a economia na troca de produtos insípidos. E na área de higiene e limpeza. Ou que não faz muita diferença em sua mesa: ;carne, por exemplo, vou direto pelo preço menor.;

O casal de aposentados Jorge Chula, 67 anos e Vanilda Alves Dias, 70, adotam comportamento parecido com o de Miotto. ;Já fui fiel a muitas marcas mas, agora, vou pelo preço. O sabonete tem uma dúzia de preços diferentes, pela marca e tipo, aí pego, às vezes, o mais barato, ou o preço mediano;, contou ela. ;Se você não corre atrás, pesa no bolso;, diz Jorge. ;Tudo sobe muito;, continua Vanilda, que fica de olho nas promoções para gastar menos. Só de uma coisa ela não abre mão: o shampoo, cuja marca tem preço ;salgadíssimo;, mas ela garante que nenhum outro trata tão bem seus cabelos brancos.

Cecília Duarte com os filhos Levi e Valentina: família não poupa com alimentação

Bolso leve


A concurseira Ana Flávia Fernandes, 32 anos, saúda o fato de o iogurte de sua preferência estar em promoção, pois há seis meses trocou de marca. ;Enquanto não me chamam para trabalhar, minha mãe me banca, e por isso tem umas coisas das quais gosto, mas não levo de jeito nenhum, para o bolso dela ficar mais leve;, conta. Flávia, porém, não escapa de criticar quem só vai pelo preço mais baixo. ;É horrível, porque minha tia compra uma esponja de lavar louça porque está R$ 0,20 mais barato do que a outra marca, de qualidade e efeitos melhores;.

Mãe em tempo integral, Cecília Duarte Lima Prado, 34 anos, quatro filhos, diz ser difícil demais sacrificar a qualidade por preço menor. ;Não acho que seja tudo igual, de jeito nenhum;, diz. ;Tenho uma amiga que faz isso; costuma ver o preço antes da marca do produto. Outro dia, troquei a marca de arroz, mas detestei;, exemplifica. ;Meu marido é sushiman, por isso, lá em casa, a gente prioriza a boa alimentação e não precisa ter muita preocupação com o preço;, conclui ela, acompanhada pelos filhos Levi, 4 anos, e Valentina, de nove meses.



  • Equilíbrio

    O educador financeiro Alvaro Modernell, da consultoria Mais Ativos, considera ;muito saudável; para o mercado e para o consumidor a troca de marcas em busca de menor custo. ;A médio prazo, pode levar a um equilíbrio de preços, até que o consumidor encontre a melhor relação custo/benefício;, prossegue. A crise obriga as pessoas a buscarem alternativas e também abre as portas a novas empresas que, para competir, oferecem melhor qualidade com bom preço, define o professor.

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