Economia

Plano de saúde pode sofrer reajuste para pessoas com 59 anos ou mais

Substitutivo que será votado na Câmara prevê que operadoras possam dividir o reajuste da última faixa etária em cinco parcelas, desrespeitando o Estatuto do Idoso, que não permite aumentos depois dos 60 anos. Especialistas temem debandada de clientes

Rodolfo Costa
postado em 29/10/2017 08:00
Rogério Marinho, autor do substitutivo: proposta também inibe atuação do Código de Defesa do Consumidor

O mercado de saúde suplementar está prestes a sofrer mudanças. Boas e ruins, avaliam especialistas. Em 8 de novembro, a Câmara dos Deputados deve votar, em uma comissão especial, o relatório substitutivo do Projeto de Lei (PL) 7.419/06, do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN). O texto tem por intuito promover reformas na Lei 9.656/1998, que regulamenta os planos de saúde. Entre os ajustes propostos, há pontos polêmicos, como o que prevê o alongamento do reajuste na última das 10 faixas etárias, para pessoas com 59 anos ou mais.

A ideia apresentada no PL propõe o parcelamento do último reajuste permitido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), para contratos firmados após janeiro de 2004. A ideia é escalonar a última correção em cinco vezes, com a aplicação de reajuste a cada cinco anos, começando aos 59 anos. O aumento em cada uma das parcelas deverá ser de, no máximo, 20% do total nominal que incidiria na última faixa.

Como as operadoras de saúde sabem que, atualmente, pelo Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), não é permitido reajuste por idade para pessoas a partir de 60 anos, as empresas aplicam pesados aumentos na última faixa, que chegam a 130%. A proposta em discussão na Câmara prevê, por exemplo, que, em vez de impor ao consumidor o pagamento de um reajuste de 100% em uma única parcela, sejam pagos 20% a cada cinco anos, por um período de 20 anos, encerrando quando o idoso atingir 79 anos.

[SAIBAMAIS]Na prática, entretanto, a proposta poderá provocar uma evasão de consumidores do mercado de saúde suplementar antes mesmo de chegarem aos 59 anos. É o que sustenta o especialista Rodrigo Araújo, sócio-fundador da Araújo, Conforti e Jonhsson Advogados Associados. Ele avalia que muitas empresas anteciparão o pesado reajuste aplicado na 10; e última faixa etária, para a nona faixa, dos 54 aos 58 anos, ou para a oitava, dos 49 aos 53 anos.

;Se eu fosse dono de uma operadora e pensasse no lucro, eu faria isso. Anteciparia os reajustes mais pesados na oitava ou na nona faixa;, pondera Araújo. No entendimento dele, os consumidores que não rescindirem os contratos terão dificuldades para pagar, e só não cancelarão por medo de ficar sem o plano de saúde. ;E por alguma expectativa e condições de se manterem em atividade no mercado de trabalho;, acrescenta.

A legislação em vigor não protege os consumidores com planos de saúde coletivos. Os reajustes são estipulados pela operadora, de acordo com os custos da saúde, e apenas ratificado pela ANS. A única regra que limita reajustes é a resolução normativa 63, da agência, que estabelece que a variação acumulada entre a sétima e a décima faixas não poderá ser superior ao acumulado entre a primeira e a sétima. Dessa maneira, nada impede que as empresas possam antecipar a última correção para as anteriores. ;O texto só será benéfico para o idoso se prever que o maior percentual de reajuste será aplicado obrigatoriamente na última faixa etária;, avalia o advogado.

Polêmicas


O projeto traz ainda outros dispositivos polêmicos, e até avaliados como inconstitucionais. Entre eles, uma edição no artigo que aplica subsidiariamente o Código de Defesa do Consumidor (CDC) aos contratos. Embora o texto não tenha alterado esse ponto, o substitutivo acrescenta um parágrafo prevendo que o consumidor tenha direito apenas a procedimentos previstos no rol ou no contrato.

Para entidades representativas do consumidor, essa alteração configura uma inconstitucionalidade, por afastar a aplicação do CDC em uma das principais demandas dos beneficiários de planos. A advogada Sônia Amaro, da Proteste ; Associação de Consumidores, reforça, ainda, que o texto é muito brando com as operadoras. A proposta estabelece que o valor das multas não pode ser 10 vezes superior ao custo do procedimento negado. Atualmente, a multa base é de R$ 80 mil.

O regime de tramitação de urgência do projeto é outra crítica feita por Sônia. ;É um absurdo. A Câmara quer dificultar e muito a apresentação de propostas por parte da sociedade. Colocar a matéria para tramitar dessa forma é uma maneira de proteger os interesses das empresas;, reclama. Ou seja, pelo status do texto, o projeto pode ser votado diretamente no plenário da Casa.

Apesar do prazo já definido para colocar o projeto em votação, o deputado federal Rogério Marinho, relator da comissão especial, assegura que ainda haverá possibilidade para apresentação de novas sugestões e contribuições à matéria. Ele destaca, também, que o substitutivo apresentado traz pontos positivos, como a obrigação das operadoras de oferecerem planos individuais e a previsão de portabilidade direta, sem o cumprimento de carência em caso de contratos equivalentes. ;Houve a preocupação em utilizar o bom senso para um lado e racionalidade para o outro. É importante que as operadoras tenham saúde financeira para investir, sem causar prejuízos ao consumidor;, assegura.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) avalia que o parecer de Marinho traz avanços ao setor ao ;aperfeiçoar; dispositivos da Lei 9.656/98, tornando mais ;claros; pontos ;obscuros;, até então, na relação entre consumidores e operadoras. Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) compreende que os assuntos tratados no projeto são de extrema importância para o setor, principalmente por visar o acesso à cobertura dos planos de saúde.

Mudanças propostas

Câmara analisa substitutivo ao Projeto de Lei 7.419/06, que propõe alterações na lei que regulamenta os planos de saúde

; Reajustes
Proposta prevê o aumento de mensalidades dos planos de saúde após a pessoa ter completado 59 anos. O texto propõe a divisão em cinco parcelas do último reajuste por idade, para consumidores com 59 anos ou mais. A correção será aplicada a cada cinco anos, em um período de 20 anos. Os ajustes não podem ser superiores a 20% do total que incidiria na última faixa.

; Rol absoluto
A matéria dificulta que o consumidor pleiteie na Justiça a realização de procedimentos que não estejam previstos na lista da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O consumidor terá direito apenas ao que está no contrato ou no rol.

; Portabilidade
O projeto dispensa o consumidor de cumprir novo período de carência caso migre para outro plano de saúde, desde que esteja adimplente na operadora de origem. A carência poderá ser exigida caso o produto de destino tenha serviços mais amplos do que o originário.

; Plano individual e familiar
O texto obriga as empresas a comercializarem planos individuais e familiares. Hoje, não há essa obrigatoriedade.

; Prevenção
A matéria estabelece que as operadoras realizem programas de promoção à saúde e de prevenção de riscos e de doenças, inclusive de epidemias que estejam em curso no país. Prevê também que os usuários que aderirem aos programas preventivos tenham desconto na mensalidade dos planos. Atualmente, não existe essa obrigação.

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